Olao Rodrigues (*)
Não se sabe ao certo por que o Valongo se tornou,
no passado, bairro de invejável progresso comercial. Ou por estar mais próximo do caminho que levava a Cubatão
e ao Planalto ou por favorecer-se mais do que os outros núcleos do serviço postal entre a Capital da Província e a Vila. Certo é que o Valongo
preponderou.
E provocou rivalidades. Com a área dos Quartéis, por exemplo.
Por que Quartéis? Porque nessa área se localizavam os quartéis militares.
Onde ficava esse núcleo? Na atual Rua Xavier da Silveira e espaços periféricos,
inclusive a atual Praça da República.
Ano em que se iniciaram os Quartéis: 1776.
Durante o milagre de Santo Antônio, valongueiros e
quarteleiros apertaram as mãos
Imagem publicada com o texto
Tornou-se
muito tensa a divergência entre moradores do Valongo e Quartéis. Rivalidades. Os quarteleiros não admitiam a hegemonia econômica e social dos
valongueiros. E daí os constantes conflitos, com ruidosa intervenção da Polícia.
Foram brigas que se tornaram famosas, em que o cacete sempre surgia como argumento decisivo.
Luta contínua que só teve trégua no histórico episódio de Santo Antônio.
Embora resumidamente, vamos contar a cena.
Em 1860, a empresa britânica concessionária do transporte ferroviário entre Santos
e São Paulo adquiriu toda a margem esquerda do Convento de Santo Antônio do Valongo, para construir a estação de
passageiros. Nem a Imprensa nem o Povo gostaram da medida, criticando a determinação que emanava do Governo do Império. Mas as obras de demolição do
Convento começaram.
Quando as picaretas alcançaram o altar onde reinava Santo Antônio, não houve jeito de ser retirada a pequena
imagem. Resistia aos golpes das picaretas e à força humana, já reforçada. Positivado o milagre, os próprios trabalhadores se ajoelharam diante da
imagem inabalável e rezaram, desistindo depois do seu tentame.
Por Aviso Imperial nº 513, foi determinada a permanência da imagem de Santo Antônio em seu glorioso trono, embora
a estação de passageiros em 1867 surgisse e até hoje lá está, como também a tradicional ferrovia, menos o Convento.
Pois foi nessa oportunidade, de protestos de todo o Povo, que valongueiros e quarteleiros, dando as
mãos, fizeram trégua em suas hostilidades!
Quartel que deu origem ao bairro dos quarteleiros, em foto de 1865 de
Militão Augusto de Azevedo (albúmen com 11,0 x 17,3 – Acervo Museu Paulista)
Imagem reproduzida no livro Santos e seus Arrabaldes - Álbum de Militão Augusto de Azevedo,
de Gino Caldatto Barbosa (org.), Magma Editora Cultural, São Paulo/SP, 2004
(*) O falecido escritor Olao Rodrigues foi autor de diversos livros publicados em Santos/SP,
entre eles a Cartilha da História de Santos, de 1980, da qual foi extraída esta história. |