Trecho do capítulo, na edição de 1938 da Biblioteca Pública Alberto Sousa
SEGUNDA PARTE - MEMORIAL E DECLARAÇÃO DAS
GRANDEZAS DA BAHIA
TÍTULO 16 — Dos
crustáceos, moluscos, zoófitos, eqüinodermos etc. e dos peixes de água doce
Capítulo
CXL
Que trata da qualidade das ostras que há na Bahia.
As mais formosas ostras que se viram são as do Brasil; e há infinidade delas, como se vê na Bahia, onde lhes os índios chamam leriuçu, as
quais estão sempre cheias, e têm ordinariamente grande miolos; e em algumas partes os têm tamanhos que se não podem comer senão cortadas em
talhadas, as quais, cruas, assadas e fritas, são muito gostosas; as boas se dão dentro da vasa no salgado, e pelos rios onde se junta a água doce ao
salgado se criam muitas na vasa, e muito grandes, mas quando há água do monte, estão mui doces e sensabores.
E há tantas ostras na Bahia e em outras partes, que se carregam barcos delas, muito grandes, para fazerem cal das cascas, de que se faz muita e
muito boa para as obras, a qual é muito alva; e há engenho que se gastou nas obras dele mais de três mil moios
[medida antiga de capacidade equivalente a 60 alquires ou 828
litros, em Lisboa] de cal destas ostras; as quais são muito mais sadias que as da Espanha.
Nos mangues se criam outras ostras pequenas, a que os índios chamam leri-mirim, e criam-se nas raízes e ramos deles até onde lhes chega a
maré de preamar; as quais raízes e ramos estão cobertos destas ostras, que se não enxerga o pau, e estão umas sobre outras; as quais são pequenas,
mas muito gostosas; e nunca acabam, porque tiradas umas, logo lhes nascem outras; e em todo o tempo são muito boas e muito leves.
Há outras ostras, a que os índios chamam leri-pebas, que se criam em baixos de areia de pouca água, as quais são como as salmoninas que se
criam no Rio de Lisboa, defronte do Barreiro, da feição de vieiras
[molusco acéfalo, também chamado pentéola em Portugal].
Estas leri-pebas são um marisco de muito gosto, e estão na conjunção da lua nova muito cheias, cujo miolo é sobre o teso e muito excelente;
nas quais se acham grãos de aljôfar pequenos, e criam-se logo serras
[elevações] destas leri-pebas umas sobre as outras, muito grandes; e já aconteceu descer com a maré serra delas até defronte da cidade, com que a
gente dela e do seu limite teve que comer mais de dois anos. |