Trecho do capítulo, na edição de 1938 da Biblioteca Pública Alberto Sousa
SEGUNDA PARTE - MEMORIAL E DECLARAÇÃO DAS
GRANDEZAS DA BAHIA
TÍTULO 12 — Dos
mamíferos terrestres e anfíbios
Capítulo
CI
Dos porcos e outros bichos que se criam na água doce.
Nos rios de água doce e nas lagoas também se criam muitos porcos, a que os índios chamam capivaras, que não são tamanhos como os
porcos-do-mato; os quais têm pouco cabelo e a cor cinzenta, e o rabo como os outros; e não têm na boca mais que dois dentes grandes, ambos debaixo,
na dianteira, que são do comprimento e grossura de um dedo; e cada um é fendido pelo meio e fica de duas peças; e têm mais outros dois queixais,
todos no queixo de baixo, que no de cima não têm nada; os quais parem e criam os filhos debaixo da água, onde tomam peixinhos e camarões que comem;
também comem erva ao longo da água, de onde saem em terra, e fazem muito dano nos canaviais de açúcar e roças que estão perto da água, onde matam em
armadilhas; cuja carne é mole, e o toucinho pegajoso; mas
salpresa é
boa de toda a maneira, mas carregada para quem não tem saúde.
Criam-se nos rios de água doce outros bichos, que se parecem com lontras de Portugal, a que o gentio chama jaguarapeba, que têm o cabelo
preto e tão macio como veludo. São do tamanho de um goso [cão
vulgar], têm a cabeça como de gato, e a boca muito rasgada e vermelha por dentro, e nos dentes grandes presas, as pernas curtas. Andam sempre na água,
onde criam e parem muitos filhos e onde se mantêm dos peixes que tomam e dos camarões; não saem nunca fora da água, onde gritam quando vêem gente ou
outro bicho.
Irara [arerã - ariranha] é outro bicho da água doce, tamanho como um grande rafeiro, de cor parda, e outros pretos. Têm a feição de cão, e ladram como cão, e remetem à
gente com muita braveza; as fêmeas parem muitos filhos juntos; e se os tomam novos, criam-se em casa, onde se fazem domésticos. Mantêm-se do peixe e
dos camarões que tomam na água; cuja carne comem os índios.
Nos mesmos rios se criam outros bichos, a que os índios chamam vivia, que são do tamanho dos gosos, felpudos do cabelo, e de cor cinzenta;
têm o focinho comprido e agudo, as orelhas pequeninas e redondas, do tamanho de uma casca de tremoço; têm o rabo muito comprido e grosso pela
arreigada, como carneiro; quando gritam no rio, nomeiam-se pelo seu nome; têm as mãos e unhas de cão, andam sempre na água, onde as fêmeas parem
muitos filhos; mantêm-se do peixe e camarões que tomam, cuja carne comem os índios. |