Trecho do capítulo, na edição de 1938 da Biblioteca Pública Alberto Sousa
SEGUNDA PARTE - MEMORIAL E DECLARAÇÃO DAS
GRANDEZAS DA BAHIA
TÍTULO 4 — Da
agricultura da Bahia
Capítulo
XLIII
Em que se declara a qualidade dos aipins.
Dá-se nesta terra outra casta de mandioca, a que o gentio chama aipins, cujas raízes são da feição da mesma mandioca, a rama e a folha são da
mesma maneira, sem haver nenhuma diferença, e planta-se de mistura com a mesma mandioca, e para se recolherem estas raízes as conhecem os índios
pela cor dos ramos, no que atinam poucos portugueses.
E estas raízes dos aipins são alvíssimas; como estão, cruas, sabem às castanhas cruas da Espanha; assadas são muito doces, e têm o mesmo sabor das
castanhas assadas, e, da vantagem, as quais se comem também cozidas, e são muito saborosas; e de uma maneira e de outra são ventosas como as
castanhas.
Destes aipins se aproveitam nas povoações novas porque como são de cinco meses se começam a comer assados, e como passam de seis meses fazem-se
duros, e não se assam bem; mas servem então para beijus e para farinha fresca, que é mais doce que a da mandioca, as quais raízes duram pouco
debaixo da terra, e como passam de oito meses apodrecem muito.
Destes aipins há sete ou oito castas; mas os que mais se estimam, por serem mais saborosos, são uns que chamam jerimus. Os índios se valem dos
aipins para nas suas festas fazerem deles cozidos seus vinhos, para o que os plantam mais que para os comerem assados, como fazem os portugueses.
E porque tudo é mandioca, concluamos que o mantimento dela é o melhor que se sabe, tirado o do bom trigo, porque pão de trigo-do-mar, de milho, de
centeio, de cevada, não presta a par da mandioca, arroz, inhames e cocos.
Milho de Guiné se dá na Bahia, como ao diante se verá; mas não se tem lá por mantimento, e ainda digo que a mandioca é mais sadia e proveitosa que
o bom trigo, por ser de melhor digestão. E por se averiguar por tal, os governadores Tomé de Sousa, d. Duarte e Mem de Sá não comiam no Brasil pão
de trigo, por se não acharem bem como ele, e assim o fazem outras muitas pessoas. |