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HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS - SANTOS EM 1587 - BIBLIOTECA NM
1587 - Notícia do Brasil - [II - 34]

Clique na imagem para voltar ao índice desta obraEscrita em 1587 pelo colono Gabriel Soares de Souza, essa obra chegou ao eminente historiador Francisco Adolpho de Varnhagen por cópias que confrontou em 1851, para tentar restabelecer o texto original desaparecido, como cita na introdução de seus estudos e comentários. Em 1974, foi editada com o mesmo nome original, Notícia do Brasil, com extensas notas de importantes pesquisadores. Mais recentemente, o site Domínio Público apresentou uma versão da obra, com algumas falhas de digitalização e reconhecimento ótico de caracteres (OCR).

Por isso, Novo Milênio fez um cotejo daquela versão digital com a de 1974 e com o exemplar cedido em maio de 2010 para digitalização, pela Biblioteca Pública Alberto Sousa, de Santos, através da bibliotecária Bettina Maura Nogueira de Sá. Este exemplar corresponde à terceira edição (Companhia Editora Nacional, 1938, volume 117 da série 5ª da Brasiliana - Biblioteca Pedagógica Brasileira), com os comentários de Varnhagen. Foi feita ainda alguma atualização ortográfica:

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Tratado descritivo do Brasil em 1587

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Trecho do capítulo, na edição de 1938 da Biblioteca Pública Alberto Sousa

SEGUNDA PARTE - MEMORIAL E DECLARAÇÃO DAS GRANDEZAS DA BAHIA

TÍTULO 4 — Da agricultura da Bahia

Capítulo XXXIV

Em que se declara as árvores da Espanha que se dão na Bahia, e como se criam nela.

Parece razão que se ponha em capítulo particular os frutos da Espanha e de outras partes, que se dão na Bahia de Todos os Santos. E comecemos nas canas-de-açúcar, cuja planta levaram à capitania dos Ilhéus das ilhas da Madeira e de Cabo Verde, as quais recebeu esta terra de maneira em si, que as dá maiores e melhores que nas ilhas e parte de onde vieram a ela, e que em nenhuma outra parte que se saiba que crie canas-de-açúcar, porque na Ilha da Madeira, Cabo Verde, São Tomé, Trudente, Canárias, Valência e na Índia não se dão as canas se se não regam os canaviais como as hortas e se lhes não estercam as terras, e na Bahia plantam-se pelos altos e pelos baixos, sem se estercar a terra, nem se regar; e como as canas são de seis meses, logo acamam e é forçoso cortá-las para plantar em outra parte, porque aqui se não dão tão compridas como lanças; e na terra baixa não se faz açúcar da primeira novidade que preste para nada, porque acamam as canas e estão tão viçosas que não coalha o sumo delas, se as não misturam com canas velhas, e como são de quinze meses, logo fiam novidade às canas de plantas; e as de soca, como são de ano, logo se cortam.

Na Ilha da Madeira e nas mais partes aonde se faz açúcar cortam as canas de planta de dois anos por diante e a soca de três anos, e ainda assim são canas mui curtas, onde a terra não dá mais que duas novidades. E na Bahia há muitos canaviais que há trinta anos que dão canas; e ordinariamente as terras baixas nunca e as altas dão quatro e cinco novidades e mais.

Das árvores a principal é a parreira, a qual se dá de maneira nesta terra, que nunca lhe cai a folha, se não quando a podam que lha lançam fora; e quantas vezes a podem, tantas dá fruto; e porque duram poucos anos com a fertilidade, se as podam muitas vezes no ano; é a poda ordinária duas vezes para darem duas novidades, o que se faz em qualquer tempo do ano conforme ao tempo que cada um quer as uvas, porque em todo o ano madurecem e são muito doces e saborosas, e não amadurecem todas juntas; e há curiosos que têm nos seus jardins pé de parreira que têm uns braços com uvas maduras, outros com agraços, outros com frutos em flor e outros podados de novo; e assim em todo o ano têm uvas maduras, numa só parreira; mais não há naquela terra mais planta que de uvas ferrais e outras uvas pretas, e não há nessa terra muitas vinhas é por respeito das formigas, que em uma noite dão numa parreira, lhe cortam a folha e fruto e o lançam no chão; pelo que não há na Bahia tanto vinho como na Ilha da Madeira, e como se dá na capitania de São Vicente porque não tem formiga que lhe faça nojo, onde há homens que colhem já a três e quatro pipas de vinho cada ano, ao qual dão uma fervura no fogo por se lhe não azedar o que deve de nascer das plantas.

As figueiras se dão de maneira que no primeiro ano que as plantam vêm como novidade e, daí por diante, dão figos em todo o ano, às quais nunca cai folha; e as que dão logo novidade e figos em todo o ano são figueiras pretas, que dão mui grandes e saborosos figos pretos e as árvores não são muito grandes, nem duram muito tempo, porque como são de cinco, seis anos, logo se enchem de carrapatos que as comem, e lhes fazem cair as folhas e ensoar o fruto, os quais figos pretos não criam bicho como os de Portugal. Também há outras figueiras pretas que dão figos bêbaras mui saborosos, as quais são maiores árvores e duram perfeitas mais anos que as outras, mas não dão a novidade tão depressa como ela.

As romeiras que se plantam de quaisquer raminhos, os quais pegam e logo dão fruto aos dois anos; as árvores não são nunca grandes, mas dão romãs em todo o ano, e não lhes cai nunca a folha de todo; o fruto delas é maravilhoso no gosto e de bom tamanho, mas não dão muitas romãs por pesarem muito e caírem no chão estando em flor, com as quais árvores têm as formigas grande guerra, e não se defendem delas senão com testos de água ao pé que fica no meio; e se se atravessa uma palha por cima, por ela lhe dão logo tal assalto que lhe lançam a folha toda no chão; pelo que se sustentam com trabalho estas árvores e as parreiras, que à figueira não faz a formiga nojo.

As laranjeiras se plantam de pevide, e faz-lhes a terra tal companhia que em três anos se fazem árvores mais altas que um homem, e neste terceiro ano dão fruto, o qual é o mais formoso e grande que há no mundo; e as laranjas doces têm suave sabor, e é o seu doce mui doce, e a camisa branca com que se vestem os gomos é também muito doce. As laranjeiras se fazem muito grandes e formosas, e tomam muita flor de que se faz água muito fina e de mais suave cheiro que a de Portugal; e como as laranjeiras doces são velhas, dão as laranjas com uma ponta de azedo muito galante, às quais árvores as formigas em algumas partes fazem nojo, mas com pouco trabalho se defendem delas. Tomam essas árvores a flor em agosto, em que se começa naquelas partes a primavera.

As limeiras se dão da mesma maneira, onde há poucas que dêem fruto azedo, por se não usar dele na terra. As limas doces são muito grandes, formosas e muito saborosas, as quais fazem muita vantagem às de Portugal, assim no grandor como no sabor. As árvores das limas são tamanhas como as laranjeiras, a quem a formiga faz o mesmo dano, se lhes pode chegar, e plantam-se de pevide também.

As cidreiras se plantam de estaca, mas de pevide se dão melhor, porque dão fruto ao segundo ano; e as cidras são grandíssimas e saborosas, as quais fazem muita vantagem às de Portugal, assim no grandor como no sabor; e faz-se delas muita conserva. Algumas têm o amargo doce, outras azedo, e em todo o ano as cidreiras estão de vez para dar fruto, porque têm cidras maduras, verdes, outras pequenas e muita flor; e quem as formigas não fazem nojo porque tem o pé da folha muito duro.

Dão-se na Bahia limões franceses tamanhos, como cidras de Portugal, e são mui saborosos; e outros limões-de-perdiz e os galegos, uns e outros se plantam de pevide e todos aos dois anos vêm com novidade, os quais muito depressa se fazem árvores mui formosas e tomam muito fruto, o qual dão em todo o ano, como está dito das cidreiras; e alguns destes limoeiros se fazem muito grandes, especialmente os galegos.

Também se dão na Bahia outras árvores de espinho que chamam azamboas, de que não há muitas na terra, por se não aproveitarem nela desse fruto.

As palmeiras que dão os cocos, se dão na Bahia melhor que na Índia, porque, metido um coco debaixo da terra, a palmeira que dele nasce dá coco em cinco e seis anos, e na Índia não dão estas palmas fruto em vinte anos. Foram os primeiros cocos à Bahia de Cabo Verde, de onde se enche a terra, e houvera infinidade deles se não se secaram, como são de oito e dez anos para cima; dizem que lhes nasce um bicho no olho que os faz secar. Os cocos são maiores que os das outras partes, mas não há quem lhes saiba matar este bicho, e aproveitar-se do muito proveito que na Índia se faz dos palmares, pelo que não se faz nesta terra conta destas árvores.

Tamareiras se dão na Bahia muito formosas, que dão tâmaras mui perfeitas; as primeiras nasceram dos caroços que foram do Reino e as demais de semeadas e nascidas daí a oito anos, deram fruto, e dos caroços deste fruto há outras árvores que dão já, mas não faz ninguém conta delas, e pode-se contar por estranheza esta brevidade porque se tem que quem semeia tâmaras ele nem seus filhos lhe comem o fruto senão seus netos.

Estas tamareiras não dão frutos se não houver macho entre elas, e a árvore que é macho não dá fruto e é mui ramalhuda do meio para cima, e as folhas são de cor verde-escuro; as fêmeas têm uma copa em cima e a cor dos ramos é de um verde-claro.