Trecho do capítulo, na edição de 1938 da Biblioteca Pública Alberto Sousa
SEGUNDA PARTE - MEMORIAL E DECLARAÇÃO DAS
GRANDEZAS DA BAHIA
TÍTULO 3 — Da
enseada da Bahia, suas ilhas, recôncavos, ribeiros e engenhos
Capítulo XXX
Em que se declara a terra que há da boca da barra de
Jaguaripe até Juquirijape, e daí até o Rio de Una.
Da ponta da barra de Jaguaripe ao Rio de Juquirijape são quatro léguas ao longo do mar, à feição de enseadas, quase pelo rumo de Norte e Sul, cuja
terra é baixa e fraca, com pouco mato, pelo qual atravessam das campinas quatro ribeiras de pouco cabedal, a qual terra não serve para mais que para
criações de vacas.
Este Rio de Juquirijape tem a barra pequena e baixa, por onde não podem entrar mais que caravelões de costa por ter uma légua na boca que a toma
toda; da barra para dentro até a cachoeira é muito fundo, por onde podem navegar navios de cem tonéis e de mais; e de uma parte a outra pode haver
quatro léguas.
Este rio é tão formoso como o de Guadiana, mas tem muito mais fundo; e tem, indo por ele acima, de uma banda e da outra até duas léguas, a terra
fraca e pela maior parte de campinas, com muitos alagadiços, terra boa para vacas; e tem, indo por ele acima mais avante dois esteiros, nos quais se
podem fazer dois engenhos.
Do esteiro mais do cabo, para a banda da cachoeira uma légua toda de várzea, e terra mui grossa para canaviais; da outra banda é a terra mais
somenos, e junto desta cachoeira se vem meter uma ribeira com grande aferida, onde Gabriel Soares tem começado um engenho, no qual tem feito grandes
benfeitorias, e assentado uma aldeia de escravos com um feitor que os manda. Na barra deste rio tem uma roça com mantimentos, e gente com que se
granjeia. Este rio é muito provido de pescado, marisco e muita caça, e frutas silvestres.
Da barra de Juquirijape ao curral de Sebastião da Ponte serão cinco léguas ao longo do mar, tudo despovoado em feição de enseada, onde se metem
três ribeiras que nascem nas campinas desta terra, que não servem para mais que para criação de vacas.
Toda esta praia e costa no inverno é mui desabrigada até a barra de Jaguaripe, onde o tempo Leste e Leste-Sudeste é travessia, e toma aqui os
caravelões da costa que se metem por esta barra, e eles não acertam com a boca de Juquirijape para recolherem dentro, não têm outro remédio senão
varar em terra, onde não há perigo para as pessoas por ser tudo areia.
Este curral de Sebastião da Ponte está numa ponta saída ao mar com o rosto no morro de Tinharé, da qual vai fugindo a terra para dentro, fazendo
uma enseada até o Rio Una, que será três léguas todas de praia.
Por este rio entra a maré mais de duas léguas, no cabo das quais está situado o engenho de Sebastião da Ponte, que tem duas moendas de água numa
casa que mói ambas com uma ribeira, o qual engenho é mui grande e forte, está mui bem fabricado de casas de vivenda, de purgar e outras oficinas,
com uma formosa igreja de S. Gens, com três capelas de abóbada; e por este Rio Una vivem alguns moradores que nele têm feito grandes fazendas de
canaviais e mantimentos. |