Trecho do capítulo, na edição de 1938 da Biblioteca Pública Alberto Sousa
SEGUNDA PARTE - MEMORIAL E DECLARAÇÃO DAS
GRANDEZAS DA BAHIA
TÍTULO 3 — Da
enseada da Bahia, suas ilhas, recôncavos, ribeiros e engenhos
Capítulo XXVIII
Em que se declara o como corre a terra do Rio de
Paraguaçu ao longo do mar da Bahia até a boca de Jaguaripe e por este rio acima.
Do cabo do Rio Paraguaçu, onde se ele mete na baía grande, vai fazendo a terra umas enseadas de areia, obra de duas léguas, que estão povoadas de
currais de vacas e de pescadores, e no cabo destas duas léguas faz a terra uma ponta de areia muito saída ao mar da baía a qual corta a maré a
passos; e quando é cheia, fica parte desta ponta em ilha e passada da outra banda tem sete ou oito ilhéus de areia cheios de mangues; e tornando a
correr a costa contra Jaguaripe se vai armando em enseadas obra de três léguas que estão povoadas, até em direito da ilha da Pedra, de currais de
vacas e fazendas de gente pobre, que não plantam mais que mantimentos, de que se mantêm.
Esta Ilha da Pedra é de pouco mais de meia légua de comprido e tem muito menos de largura; e mais avante está outra ilha que tem mais de légua de
comprido, que se diz a de Fernão Vaz. Por detrás desta ilha vai correndo a costa da terra firme mui chegada e elas, a qual costa por detrás dessas
ilhas terá três léguas de espaço até chegar ao Rio de Jaguaripe, tudo terra despovoada por ser fraca de campinas, onde se mete no salgado uma
ribeira, que se chama Pujuca, que servirá para um engenho, ainda que junto do porto vem a água baixa, e será necessário fazer o engenho um pedaço
pela terra adentro, por amor da aferida.
E virando da boca de Jaguaripe para cima, daí a duas léguas, é a terra mui fraca, que não serve senão para vacas e roças de mantimentos; e do cabo
destas duas léguas até a cachoeira é a terra sofrível e tem cinco ribeiras, que se vêm meter a este rio, em que se podem fazer cinco engenhos, os
quais não são já feitos por o capitão desta terra não querer dar águas menos de a dois por cento do foro, que no cabo de um ano vem a montar oitenta
a cem arrobas de açúcar, que valem a oitocentos réis cada arroba.
Este Rio de Jaguaripe é tamanho como o Douro, mas mais aprazível na frescura; navega-se até a cachoeira que está cinco léguas da barra e duas
léguas abaixo da cachoeira é água doce, a qual o salgado com a força da maré faz recuar até a cachoeira.
Junto da cachoeira virando sobre a mão direita, para baixo, está um engenho de água de Fernão Cabral de Ataíde, obra mui formosa e ornada de
nobres edifícios de casas de vivenda e de outras oficinas e de uma igreja de São Bento, mui bem acabada, o qual engenho está feito nas terras d'el-rei
que estão livres de todo o foro, que costumam pôr os capitães.
Desse engenho para baixo vivem alguns moradores que têm suas roças e canaviais ao longo do rio, que o aformoseiam muito, no qual se vêm meter três
ribeiras por esta mesma banda capazes de três engenhos que se nelas podem mui bem fazer, duas léguas abaixo de Fernão Cabral; mas a terra desta
banda é rasa e de areia, que não serve para mais que para lenha dos mesmos engenhos, a qual terra fica no cabo em língua estreita defronte da Ilha
de Fernão Vaz, a qual ponta tem uma ilhota no cabo, onde se vem ajuntar o Rio de Irajuí com o de Jaguaripe. |