Secretaria da Humanitária, tendo em primeiro plano o mais antigo funcionário da
entidade na ativa em 1978, Francisco de Brito Freitas
Foto: Revista Comemorativa ao Centenário da Sociedade Humanitária dos Empregados no
Comércio de Santos - 1879 0 12 de outubro - 1979, Santos-SP, 1979
A Sociedade Humanitária nos seus oitenta anos
Costa e Silva Sobrinho
Em tempos não muito distantes, houve em Santos um
empregado no comércio, um caixeirinho de quatorze anos apenas, que, nas horas feriadas do emprego comercial, gostava de improvisar versos
plangentes.
Muitas vezes, aos domingos, punha-se ele descalço, chapéu de palha grosseira quebrado
na testa, lenço ao pescoço, faca de ponta no cinturão de couro, e começava a declamar as suas rimas ao sabor da inspiração.
Demonstrava ao mesmo tempo, com a petulância dos verdes anos, possuir apreciáveis
dotes oratórios. Isso despertou entre os companheiros tamanho entusiasmo, que logo nasceu no seio da classe a idéia de fazerem daquele moço um
bacharel em leis.
Obrigaram-se entre si vários companheiros a fornecer determinada quantia mensal para
as despesas do estudante no curso jurídico, em São Paulo. Seguiu ele, assim, para a capital, e matriculou-se na Academia de Direito.
No fim do terceiro ou quarto mês, a mesada começou a encurtar, por dificuldades de
alguns prestamistas. O poeta, compreendendo o sacrifício dos amigos, dispensou delicadamente aquele generoso concurso pecuniário e, fora das horas
de aulas, encarregou-se da escrita de algumas pequenas casas comerciais.
Os proventos que daí auferia ainda lhe eram, porém, bastante exíguos. Entrou, por
isso, como auxiliar do escritório de advocacia do velho dr. Falcão. E desse escritório, onde se manteve até o fim do curso acadêmico, fazendo as
suas primeiras armas como advogado, saiu afinal o dr. Joaquim Xavier da Silveira - o poeta e fogoso tribuno
santista, com quem o seu torrão natal durante tantos anos se identificou e onde, após o seu desaparecimento, em 30 de agosto de 1874, o fervoroso
culto à sua memória não cessa nem desmaia.
Em homenagem à memória do preclaro santista foi fundado nesta cidade, na primeira
quinzena de março de 1879, um clube com o nome de Clube Literário Xavier da Silveira.
Efetuou esse grêmio muitas palestras literárias e solenidades comemorativas. Na festa
que realizou, por exemplo, no Teatro Rink, em 2 de setembro, aniversário da Lei do Ventre Livre, fez ele entrega de nove
cartas de liberdade.
Entre vários outros associados, pertenciam também ao mencionado clube: Matias Costa,
que foi presidente na diretoria eleita em 1º de outubro de 1887; Artur Bastos, José da Rocha, Francisco de Sales Pupo, Joaquim de Morais, Augusto de
Cerqueira, Antônio Manuel Fernandes e Augusto Carlos Vieira.
A mais perfeita confraternidade de idéias ligava esse pugilo de cultores da memória de
Xavier da Silveira.
Aí, Augusto Vieira, pensando talvez no caixeiro Xavier da Silveira, teve a idéia da
fundação da Sociedade Humanitária dos Empregados no Comércio.
O Diário de Santos, de 14 de outubro de 1879, referindo-se à instalação desta
sociedade, diz o seguinte: "Anteontem, reunidos no salão da Escola do Povo, com concessão do sr. Augusto Vieira,
empregado do comércio desta praça, grande número de seus colegas, foi instalada uma sociedade com o título de Associação Humanitária dos Empregados
no Comércio e com o fim de socorrer aqueles de seus colegas que, por enfermidade, falta de emprego etc., necessitarem de seus socorros".
E terminando: "Para dirigi-la provisoriamente foram
aclamados: presidente, o sr. Augusto Vieira; secretário, o sr. José Bernardes de Oliveira". Na
Escola do Povo, segundo essa notícia, foi, pois, instalada a Sociedade Humanitária.
Ora bem: Antônio Manuel Fernandes, companheiro de Augusto Vieira no Clube Literário, e
fundador e presidente da Escola do Povo, no seu relatório lido em 21 de setembro de [18]80,
esclareceu:
"A Escola do Povo foi fundada na noite de 9 de setembro
de 1878, em nossa residência, no largo da Coroação (hoje Praça Mauá)".
No Diário de Santos, de 1º de outubro de 1879, deparamos esta publicação:
"Tendo-se findado o feriado dos alunos desta aula noturna, começará ela hoje a funcionar regularmente em todos os dias
úteis, das 7 às 9 horas da noite, na casa nº. 11 do largo da Coroação. Secretaria da Escola do Povo, em Santos, 1º de outubro de 1879. O secretário,
Joaquim Fernandes Pacheco".
A Sociedade Carnavalesca Democratas de 1870, em 19 de junho de 1881, realizava também
uma assembléia geral, ao meio-dia, na sala onde funcionava a Escola do Povo, no largo da Coroação nº 11, conforme convite publicado no Diário de
Santos, da mesma data.
Essa denominação de largo da Coroação foi trocada pela de
Praça Mauá em 1887, por indicação do vereador Guilherme José Alves Souto.
Durante muitos anos, aquele logradouro público, aprazível pela solitude e pela sombra
dos bastos arvoredos, e rodeado todo ele de casas velhas, era o lugar predileto dos desocupados e dos rapinantes. Em 1893, um poeta faceto da época
assim o descrevia:
|
|
Da praça Mauá, o jardim
é coito vagabundorum,
onde vão dormir aqueles
que p'ra cama não têm quorum
Não é frége, nem pocilga,
nem estalagem também
é do povo um logradouro
que de jardim nome tem,
mas só nome, porque os vagos
fizeram dele seu ninho;
transformaram-no os gatunos
num infame pelourinho,
onde passar não se pode
sem revólver, sem pistola,
p'ra não ficar, de certo
sem carteira e sem cachola
Bem fez uma autoridade,
revistando à noite a praça
mandando meter o refle
nos tais vagos, por chalaça! |
|
Não devia ser só isso,
duas lambadas e... embora!
deviam ir p'ra o xadrez
p'ra não mais dormir cá fora
Olho com eles, major,
não seja mole, nem nada,
quem não tiver casa e cama
durma com a rapaziada
de bom gosto, lá na chácara
dentro de douradas grades,
qual mimoso rouxinol
a curtir agras saudades!
Os jardins não são depósito
de bandalhos vagabundos
(já bem basta que a intendência
os deixe ficar imundos!)
as flores não se plantaram
nem se fizeram canteiros
para servirem de alcova
a vadios, ratoneiros! |
|
|
Praça Mauá, em 1905
Foto: Haroldo Belegarde, reproduzida do raro Calendário de 1979
editado pela
Prodesan - Progresso e Desenvolvimento de Santos S.A., com o tema
Imagens Antigas e Atuais
Na residência, portanto, do professor Antônio Manuel Fernandes, no largo da Coroação
nº. 11 e na sala onde funcionava a Escola do Povo, foi instalada, em 12 de outubro de 1879, a Sociedade Humanitária dos Empregados no Comércio, que
agora completa oitenta anos pródigos em serviços a Santos e à sua gente.
O professor Antônio Manuel Fernandes foi um santista ilustre, um jornalista e escritor
fecundo, que deixou várias obras amenas e agradáveis. Apesar disso, Fagundes Varela, satirizando maldosamente o seu condiscípulo na Academia de São
Paulo, chamado Antônio Manuel dos Reis, envolveu numa quadrinha o nome de Antônio Manuel Fernandes, também literato acadêmico da época, que
abandonou o curso depois de concluir o terceiro ano.
O versinho, conservado pela tradição, vamos reproduzi-lo, por curiosidade:
"Antonio Manuel dos Reis,
Antônio Manuel Fernandes;
Escreve um grandes asneiras,
Outro escreve asneiras grandes".
Dessas injustiças, por exigência da rima, ninguém infelizmente está livre de padecer.
Em Augusto Vieira, companheiro do professor Antônio Manuel Fernandes no Clube
Literário, teve a Sociedade Humanitária a sua diretoria provisória, que a propagou, quem a corporificou, quem lhe deu vida, enfim. Cabem-lhe, pois,
os méritos incontestáveis de ser o seu fundador.
Seguiu-se a eleição da primeira diretoria, apresentando como presidente Floriano
Manuel dos Santos Castro, o qual ocupou esse cargo por duas vezes: primeiro em 1º de novembro de 1879 a 30 de abril de 1880 e depois de 1º de
novembro de 1881 a 30 de abril de 1882.
O projeto da criação de uma biblioteca, apresentado pelo consócio José Francisco Pinto
Martins, vemo-lo aprovado em 30 de outubro de [18]80, com o sufrágio do presidente, nestas
palavras do seu relatório: "As vantagens resultantes deste novo cometimento, creio, não vos são desconhecidas; por isso
é de esperar que a nova diretoria envidará seus esforços para a sua realização".
Os estatutos provisórios foram, também, nesse período, substituídos por novos, que a
assembléia geral extraordinária de 25 de outubro discutiu e aprovou.
Mesa da Assembléia Geral, por ocasião da posse da diretoria de 1930/1931
Foto publicada com a matéria
O relatório apresentado em sessão ordinária da assembléia geral de 1º de maio de 1882
prova a acrisolada dedicação da diretoria chefiada por Floriano dos Santos Castro, no segundo período de sua presidência.
Quem se der ao labor de respigar nessa exposição, verá que a Sociedade, apenas no seu
terceiro ano de existência, já se compunha de 101 sócios ativos e 1 benfeitor. Que ministrava socorros a diversos sócios, despendendo com isso
287$240. Que concluíra a reforma dos estatutos e tratara da sua aprovação pelo governo da Província. Que reorganizara o arquivo, tirando-lhe o pó
desinteressante e pondo-o em perfeita ordem. Que suprira na secretaria a falta de objetos e móveis indispensáveis, aumentara, enfim, o fundo de
reserva com a quantia de 200$000.
Ausentando-se de Santos o sócio benfeitor, dr. Manuel Gomes de Argôlo Ferrão, primeiro
médico da Humanitária, ofereceu-se para substituí-lo o dr. Manuel Maria Tourinho, oferecimento que todos levaram em gosto, futurando os beneméritos
serviços que ele veio prestar à Sociedade.
O cargo de conselheiro, durante a administração de Alfredo Ramires Esquivel (1-11-80 a
30-4-81), serviu Floriano dos Santos Castro com extremoso desvelo, não só comparecendo assiduamente às reuniões, senão também incrementando o número
de associados e ocupando, até, interinamente, o lugar de Beneficente na ausência de José Pinto Martins, que se transferira para o Rio.
Eleita a diretoria para o semestre de 1º de maio a 31 de outubro de 1882, deixaram de
tomar posse alguns de seus membros, impossibilitados de aceitar os respectivos cargos por motivos plausíveis. Figurava entre eles Floriano Manuel
dos Santos Castro.
Desempenhou ele, entretanto, de 14 de maio a 10 de outubro desse ano, o trabalhoso
cargo de Beneficente. E fez parte ainda da comissão nomeada em 30 de julho de 82 para elaborar projeto de regimento interno, instituído no artigo 19
dos Estatutos, o qual foi discutido e aprovado em assembléia geral de 28 de dezembro desse ano.
Foi este mais um relevante serviço que ele prestou à Sociedade. Comprazemo-nos em
relembrar que, além de absorver-se nos assuntos da Humanitária, Floriano Manuel dos Santos Castro era enfermeiro da Santa Casa da Misericórdia. Em
1871, tinha esta um enfermeiro-mor, que era o sr. Luiz Troost; um primeiro enfermeiro, Joaquim Ribeiro da Silva; um segundo enfermeiro, Floriano
Manuel dos Santos Castro, e uma enfermeira, Claudina Troost.
Vemos no relatório apresentado à Irmandade da Santa Casa, em
reunião de 29 de junho de 1872, pelo provedor José Joaquim Floriano e Silva, que na primeira sessão ordinária de 16 de julho do ano anterior o irmão
procurador do hospital participava haver entrado no exercício do cargo de segundo enfermeiro, reintegrado, Floriano Manuel dos Santos Castro.
Cristão e católico com toda a singeleza do Evangelho, pertencia ele à
Venerável Ordem Terceira do Carmo, de cuja mesa regedora fez parte como terceiro definidor no ano compromissal de 1877 e
1878.
Homem de alma sensível, a sua bondade tinha o poder taumatúrgico de despertar
ânimo nos enfermos, não lhes deixando desmaiar a esperança no restabelecimento.
Tinha alguma leitura. Julgava, por isso, ser Gil Blás de Santilana, como enfermeiro, o
mais criminoso dos homens. O dr. Sangredo, um médico da cidade de Valadolid - narrava Floriano de uma feita -, armou aquele aventureiro com seu vaso
de água tépida e a sua lanceta, ambos mais mortíferos do que o copo de veneno e o punhal da tragédia. Assim, Gil Blás escalda e sangra os doentes
enquanto eles têm sangue, e rindo contra as façanhas da sua medicina fatal, deste teor: "Fomos continuando, pois, com o
nosso método, e em outras semanas fizemos mais viúvas e órfãos do que o cerco de Tróia. Afigurava-se até que a peste havia assolado Valadolid:
tantos eram os enterros que lá se viam".
O primeiro presidente da Humanitária, em 1879, contava pouco mais de vinte e um anos
de idade. Era natural de Vila Bela da Princesa. E seus pais foram Manuel Antônio dos Santos Castro e d. Ana Joaquina das Dores.
Faleceu em 1885, pois da revisão do alistamento eleitoral da comarca de Santos,
concluída na primeira quinzena de dezembro desse ano, entre os cidadãos eliminados por falecimentos, encontramos: Floriano Manuel dos Santos.
Infatigáveis alentadores do progresso da Sociedade Humanitária foram igualmente o seu
primeiro advogado, o seu primeiro médico e os seus primeiros farmacêuticos.
O dr. Luiz Ernesto Xavier, por intermédio de Lauriano José de Oliveira, oferecia, na
sessão de 5 de julho de 1822 [N.E.: correto é 1882], os seus serviços profissionais à
Humanitária. Em 1884, figurava como sócio benemérito, de par com o ilustre médico dr. José Maria Tourinho e os farmacêuticos Teófilo de Arruda
Mendes e Francisco Apocalipse.
E Lauriano José de Oliveira, no seu relatório de presidente, apresentado na sessão de
1º de janeiro de 1885, dizia a respeito desse advogado: "Com sumo prazer tenho a informar-vos que o ilmo. dr. Luiz
Ernesto Xavier, distinto advogado desta Sociedade, sempre se tem achado ao lado da Diretoria, e tem sido muito pronto e dedicado no desempenho de
diversas comissões de que tem sido encarregado".
Nascido em Santos, em 1834, era filho do cirurgião dr. Firmino José Maria Xavier. Em
1863, formou-se em direito pela Faculdade de São Paulo. Nomeado promotor público em Santos, aqui fez o seu quadriênio, sendo logo nomeado juiz de
Direito de Botucatu, cargo que exerceu durante sete anos e no meio das mais ardentes lutas políticas. Quando subiu a situação liberal de 1878, o dr.
Luiz Ernesto foi obrigado a deixar aquela comarca, ficando mais tarde avulso em virtude de determinação do governo imperial.
Voltando a Santos, aqui exerceu ainda durante alguns anos a advocacia. Em 22 de maio
de 1886 foi ele vítima de grave acidente. Ao voltar do Monte Serrate, onde tinha ido assistir missa, teve uma vertigem perto
da "caixa d'água" e rolou pelo morro abaixo, indo cair sem sentidos e ensangüentado nas proximidades do antigo Teatro Rink, que ficaria hoje na
Rua São Francisco, defronte da rua D. Pedro II. Socorreram-no alguns operários de uma pedreira próxima e levaram-no para
a Santa Casa. Em 13 de outubro de 1888, uma grave moléstia, resultante daquela queda, fê-lo adormecer no sono redentor.
Em remate: conta-se que, indo ele certa vez a São Paulo, a fim de assistir às
festividades do dia 11 de agosto, na Academia de Direito, levou em sua companhia um cliente, muito pechincheiro
em matéria de honorários. Quando entraram ambos no salão nobre, cheio de retratos de velhos mestres de Direito, e onde um dos lentes ia falar sobre
aquela grande data, perguntou o cliente ao dr. Luiz Barreto:
- De quem são, doutor, esses retratos a óleo tão bonitos que estão nas paredes?
- São todos eles, respondeu o dr. Luiz Ernesto, de clientes que pagaram bem os seus
advogados...
O dr. Manuel Maria Tourinho, sendo o segundo médico da Humanitária na ordem
cronológica, foi na realidade o primeiro pelos serviços prestados.
Lauriano José de Oliveira, no seu relatório de 1º de janeiro de 1883, consagrou a esse
médico estas expressivas linhas: "O ilmo. sr. dr. Manuel Maria Tourinho é credor de um voto de louvor e de gratidão
desta Sociedade pelo constante desvelo com que tem desempenhado as suas funções científicas para com os nossos sócios que a ele têm recorrido.
Faltam-me neste momento expressões para testemunhar-lhe o meu reconhecimento e muito recomendo à gratidão da sociedade".
O dr. Tourinho foi um dos clínicos mais ilustres que têm passado por Santos. Culto e
experiente, de um tino médico espantoso, os seus diagnósticos e as suas receitas mereceram muitas vezes francos elogios dos mais notáveis colegas.
Francisco de Castro, que não o conhecia pessoalmente, dizia a um doente de Santos que
o fora consultar no Rio: "Se o senhor ouviu a opinião do Tourinho, não tem necessidade de ouvir a minha. É com certeza
a mesma. Ainda não vi um diagnóstico ou uma receita desse colega com que não concordasse".
Os drs. Manuel Maria Tourinho e José Lobo Viana possuíam, em 1878,
na Rua Direita nº 53, uma farmácia que denominaram Farmácia Galeno. Mais tarde, passaram para a
Rua General Câmara nº 83, e aí o dr. Lobo Viana vendeu a sua parte, em 9 de dezembro de 1881, ao farmacêutico, seu afilhado de casamento,
Francisco Apocalipse.
Adquiriu este, igualmente, em 24 de março de 1884, a parte do dr. Tourinho, e mudou a
farmácia para a Rua General Câmara nº 16, esquina do Largo da Coroação (hoje Praça Mauá, como já dissemos), no mesmo prédio onde, em 1889, tinham
também seu consultório médico os drs. Manuel Maria Tourinho, João Eboli e Luiz de Faria.
Francisco Apocalipse casou a 16 de fevereiro de 84, nesta cidade, com d. Valdomira
Augusta de Oliveira, benemérita associada da Humanitária e filha de Lauriano José de Oliveira.
Teófilo de Arruda Mendes e Francisco Apocalipse forneceram, em 1882 e 1883,
gratuitamente, durante seis meses cada um, todos os medicamentos de que precisou a Sociedade Humanitária. Homens instruídos, de costumes antigos, de
coração generoso, foram ambos espelho de laboriosidade e honradez.
José Abelardo Monteiro de Barros
Foto publicada com a matéria
O problema da sede, que jamais deixa de assoberbar as associações nascentes,
apresentou-se também à Sociedade Humanitária. Por isso, depois de fundada, realizou ela as suas sessões, durante algum tempo, no consistório da
Santa Casa. Isso, naturalmente, em virtude dos bons ofícios do primeiro presidente, que, como vimos, era ali enfermeiro.
Mas, no relatório de 1º de dezembro de 1880, falando da secretaria da sociedade, diz o
presidente: "Não tendo a Santa Casa da Misericórdia aceitado a proposta que lhe fiz em nome da Sociedade para
concederem-nos autorização de continuarmos a celebrar as sessões no seu consistório, resolvemos, em sessão da diretoria, alugar uma sala para a
secretaria da Sociedade, ficando o sr. tesoureiro autorizado a fazer aquisição da sala e dos móveis necessários; tendo, pois, instalado a secretaria
em uma das salas da Sociedade Musical Luso-Brasileira".
Laurindo José de Oliveira, no seu relatório de 1º de janeiro de 83, tratando do mesmo
assunto, sob o título - Mudança da sala - diz: "Tendo-se, como vedes, aumentado o pessoal da sociedade e sendo muito
pequena a sala que ocupávamos no largo do Carmo, o sr. tesoureiro, autorizado pela diretoria, alugou as duas da frente da casa do sr. Manoel Dias
dos Santos, sita na Rua 28 de Setembro nº 1, por 12 meses, à razão de 36$000 mensais, mediante um contrato particular".
Em 1884, na segunda presidência de Laurindo José de Oliveira, foi ventilada a idéia da
compra de um terreno para a futura sede da Sociedade. São palavras do seu relatório de 1º de janeiro de 85: "Bem
acertado, me parece, seria se esta Sociedade comprasse um terreno para aproveitar o preço que presentemente é regular, e quando as circunstâncias de
seus cofres permitirem, ir edificando um prédio nas condições da mesma. Neste sentido, em sessão da Assembéia Geral, de 17 de novembro, o prestante
sócio sr. Narciso de Andrade apresentou uma indicação que mereceu vossa aprovação, e da realização dessa compra está incumbida uma comissão".
O presidente Francisco Portuense Machado Reis, no relatório de 1º de janeiro de 1887,
refere-se destarte à nova casa: "Tendo a Câmara Municipal adquirido e resolvido demolir em breve tempo a casa em que
funcionava a sociedade, foi urgente à diretoria procurar outra que reunisse às comodidades necessárias a modicidade do aluguel. Felizmente não teve
a diretoria muito trabalho para conseguir, pois de três casas que pretendeu, pôde sem grande esforço obter aquela em que nos achamos, à Rua General
Câmara nº 77, na qual dispõe (embora em pequenas proporções) de salas para sessões e leitura, biblioteca, secretaria e outras dependências pelo
módico aluguel de 50$000 mensais. Cumpre-se notar que este resultado se deve principalmente à boa vontade do proprietário da casa, sr. Rodolfo
Wanschaffe".
De fato, a Câmara Municipal de Santos, quando precisou do terreno
para formar a atual Praça da República, teve de desapropriar e demolir as casas de um quarteirão comprido e estreito que
ia do largo da Matriz ao largo da Cadeia e era ladeado pelas ruas Septentrional (depois 28 de Setembro) e Meridional (mais tarde Visconde do Rio
Branco).
Levou ela cinco anos nesse trabalho. Em 1886 todas as casas estavam demolidas, menos
uma, o sobrado do Largo da Cadeia (ou Largo do Carmo, após a demolição da cadeia), onde estivera a
loja de armarinhos e roupas feitas de João Gonçalves Corvelo.
João Otávio dos Santos
Foto publicada com a matéria
Belisário Soares Caiubi, eleito vereador em 9 de outubro desse ano, na vaga aberta com
o falecimento de João Antônio Pereira dos Santos, inflamado de entusiasmo entendeu de interpelar o presidente da Câmara, que então era
João Otávio dos Santos, sobre aquela casa que ali ainda estava de pé, atravancando a entrada da nova praça.
Depois de ouvi-lo com toda a atenção e cortesia, respondeu-lhe João Otávio que aquele
sobrado do Largo do Carmo ainda não tinha sido demolido porque, embora já estivesse vazio o andar térreo, entretanto o andar superior ainda estava
ocupado pela biblioteca da Humanitária e não era fácil encontrar-se na cidade um salão bastante amplo para aquelas várias estantes com livros.
Nesta altura, pergunta afoito e apressado o vereador Caiubi: "E por que, então, não se
derruba a parte de baixo?"
Francisco Portuense Machado Reis, o grande impulsionador da biblioteca, no seu
relatório de 1º de janeiro de 1888 dá-nos ainda a notícia de outra mudança. Diz ele: "O bom acolhimento que teve a
fundação da biblioteca, obrigando a diretoria a dar-lhe desenvolvimento de que já fiz menção, tornou necessária a aquisição de casa mais espaçosa. A
diretoria, portanto, alugou aquela em que nos achamos, à Rua de Santo Antônio nº 55, a qual, inclusive por sua
localidade, preenche perfeitamente os fins que desejamos, e donde, certamente, não temos necessidade de nos retirar senão para edifício nosso".
Cabe ao presidente Adolfo Ferdinand von Sydow a iniciativa da primeira sede própria, à
Rua Amador Bueno nº 256, em terreno que a Sociedade já havia adquirido anteriormente.
A pedra fundamental do edifício foi assentada em 1º de junho de 1890. E carregaram-na
o presidente da Intendência Municipal dr. Carvalho de Mendonça, o promotor público dr. Vergueiro Steidel e várias outras pessoas gradas.
Verificou-se a inauguração, ainda sob a presidência Sydow, em 7 de setembro de 1891. Vendido mais tarde esse prédio para nele ser instalada a Cúria
Diocesana, passou a Humanitária a ter a sua sede na Rua 15 de Novembro.
O desenvolvimento da Sociedade exigia, entretanto, prédio mais amplo e melhores
acomodações. Foi então que, em 1923, na presidência de José Abelardo Monteiro de Barros, se resolveu a construção da sede atual. Lançada a pedra
fundamental em fevereiro de 1929, iniciaram-se as obras, que pelo seu vulto tornaram a empresa bastante árdua.
Três anos consecutivos presidiu Monteiro de Barros a Sociedade Humanitária. Os seus
esforços foram ingentes, e pelo que realizou lhe deve ela imenso.
João Guilherme Cruz
Foto publicada com a matéria
João Guilherme Cruz, pelo seu passado de sincero devotamento, quase de paixão à
Humanitária, substituiu Monteiro de Barros na presidência. Este notável presidente, que já havia ocupado o mesmo cargo durante quatro anos, nela
permaneceu desta feita por mais seis anos a fio.
Tomou ele desde logo medidas de caráter financeiro que desoprimiram a Humanitária dos
seus onerosos encargos. E desse modo, a iniciativa arrojada da construção do atual edifício da Praça José Bonifácio nº 59, teve o seu coroamento
admirável nos esforços e no tino administrativo desse magnífico presidente.
Por último, ainda pesava sobre a Humanitária um elevado compromisso para o Montepio
Comercial. O presidente Graciliano de Oliveira Fernandes desvelou-se quanto cabia em suas aptidões para conseguir a liquidação desse ônus.
Mas foi na providencial administração de Sinval de Barros Melo que mais ativas
diligências se empregaram para tal fim. Instituiu ele um Livro de Ouro, que subscreveu três vezes, a primeira em seu nome individual, a segunda pela
firma Sinval Barros Melo e Cia., e a terceira encerrando-o com a sua assinatura para completar a importância necessária ao resgate da dívida.
Para essa tão almejada quitação subsidiaram com as suas contribuições não só sócios da
Humanitária, senão também muitas firmas comerciais e vários particulares alheios mesmo ao quadro social.
Apanágio dos grandes corações, esses serviços merecem ser enaltecidos e pregoados.
Eles constituem um edificante exemplo para os que amam esta terra.
Neste último decênio os destinos da Humanitária foram entregues a três grandes
presidentes. Primeiro a Antônio Domingues Martins, depois a Sinval de Barros Coelho e Melo e atualmente a Oscar Martins Pinheiro, continuadores da
obra ingente dos seus antecessores; graças a eles o passado continuará por certo a viver nessa casa, a palpitar intensamente ali dentro. Através de
tantos nomes tradicionais, muita coisa dele se comunicará e se transmitirá aos vindouros.
As finalidades essenciais dessa Sociedade, que é a mais simpática da cidade, são -
beneficência e instrução. Dão-lhe elas, hoje, pela sua função social, um lugar especialíssimo no coração do povo santista.
Santos, 12 de outubro de 1959.
Synval de Barros Coelho e Melo, ex-presidente
Foto publicada com a matéria
|