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HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS - SHEC
A Humanitária e suas histórias (8)

Um time de futebol que nunca perdeu um jogo... e seu capitão/presidente...
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Uma das principais bibliotecas santistas; salões onde ocorreram bailes famosos; campanhas assistenciais importantes; a presença de personagens ilustres da história santista e nacional: são alguns dos componentes da história da Sociedade Humanitária dos Empregados no Comércio (SHEC), fundada em 1879.

Em uma revista especial comemorativa do 80º aniversário da SHEC, editada em 1959 em Santos, foi incluída esta matéria:

Naquele tempo...

Floriano de Freitas Guimarães

... do bonde elétrico a 200 réis (um tostão da cidade à Vila Nova ou à Vila Mathias);
... dos alimentos fartos, sadios e baratos, com direito à Folhinha (N.E.: calendário) no fim do ano;
... em que a gente se divertia (gratuitamente) nos concertos de jardins públicos, nos cinemas ao ar livre ou nos Teatros de Comédia (Augusto Aníbal e outros), no Miramar e no Gonzaga;
... quando o lixo era recolhido de madrugada e as ruas lavadas antes do corre-corre;
... em que Mr. Browne, diretor da City, viajava em pé na plataforma dos bondes, para não "usurpar lugares de passageiros pagantes";
... em que vereadores e presidentes da Câmara não recebiam remuneração (tão pouco os esportistas, que também eram amadores);
... em que se respeitavam moças, senhoras, velhos e crianças e se consideravam "virtudes a modéstia, a moderação, a disciplina, a lealdade, a dignidade e o decoro";
... em que não havia rádio, nem televisão, nem famílias que freqüentassem buates, cabarés, cassinos, mafuás e gafieiras;
... em que não se atiravam moças do alto de apartamentos (mesmo porque os cujos não existiam);
... quando ainda não se pagava imposto de renda, não existiam tubarões, nem Coapes e muito menos Iapês, Ibecês, Sumócs, Fibans e, conseqüentemente, não se conheciam psicanalistas...

Pois bem... naquele tempo... mal acabavam as aulas, desembestávamos em louca disparada para as nossas casas, largávamos às pressas os livros e cadernos, trocávamos as calças compridas (que só usávamos nas aulas do curso ginasial) pelas calças curtas - aquelas horrorosas, abotoadas logo abaixo do joelho - e aí sim... começava a nossa grande aventura, a nossa magna tarefa, o formidável empreendimento da nossa juventude: fazer funcionar o nosso clube juvenil de futebol...

Já não nos contentávamos com os exercícios nos recreios do colégio, nem com os desafios promovidos à tardinha e aos domingos, nas areias da praia do Boqueirão... Queríamos o nosso clube, o nosso campo, a nossa sede...

A ofensiva foi tão insistente que se tornou irresistível... De tanto amolarmos nossos pais, tios, parentes e amigos, principalmente o saudoso Ricardo Arruda, proprietário do Miramar, conseguimos, finalmente, fundar o "Miramar Futebol Clube", logo instalado no terreno aos fundos daquele estabelecimento de diversões...

Iniciávamos, assim, uma brilhante carreira de glórias esportivas e sociais, por muitos motivos notável, principalmente por se tratar de um clube dirigido exclusivamente por jovens de 14 a 17 anos de idade.

Nunca sofreu o nosso esquadrão uma derrota e apenas um empate tivemos, muito honroso, aliás, contra o E.C. Macedo Soares, campeão juvenil da capital de São Paulo.

Naquele tempo, tornou-se verdadeira mania derrotar o time do "Miramar". Todos os clubes juvenis daqui e de fora o tentaram, em vão. Organizaram-se, então, combinados de jogadores taludos, com a esperança, sempre frustrada, de acabarem com a nossa invencibilidade...

Até o nosso amigo Ribeiro Couto, cujas primeiras poesias a nossa imprensa já publicava, certa vez escalou possante selecionado de azes que disputavam campeonatos nas nossas "Ligas", convencendo meio mundo da nossa próxima derrota (chegou a instituir uma medalha de ouro para o time vencedor). Como os demais sonhadores, ficou decepcionadíssimo com a fragorosa derrota do seu quadro...

O nosso elenco era composto de verdadeiros astros mirins e em tal quantidade que poderíamos formar dois ou mais times de titulares...

Como goleiros tínhamos Theodorico e Odilon de Almeida, Lauro Pinheiro, Moacyr Licht e o autor desta história (que, muito versátil, também era ponta-esquerda); os nossos zagueiros eram Ernestinho C. Gomes, Nelson Robinson, Armandinho Stockler, Nelson Leite, os irmãos Gonzalez, Zeca Ratto, Ernesto (Gato) Gonçalves, Joaquim Côrte Real, Álvaro Dias, Vavá Martins, Manôlo e Ernesto (Capitão) Corrêa; de médios tínhamos um sortimento: Marques Pereira Filho, Arthur Barbosa, Lulú Braga, Sylvio Junqueira, Velsírio Fontes, Teco C. Gomes, Álvaro F. Guimarães, Renato S. Azevedo, Emílio Gruber, Ruy Mourão e Fritz Birkholz; para a linha-da-frente sobravam atacantes: Chico Joyce, Mário Junqueira, Martinsinho e Chico Martins, Caio F. Guimarães, Vitorino Rocha, Reynaldo P. Assis, Silvério Fontes, Reynaldinho (Micróbio) Ribeiro, João E. Mourão, Heraldo Duarte, Roberto (Cara Feia) Silva, Floriano Ratto, Laércio Magalhães, Henrique Montandon, Anésio Amaral e os Miller.

No comando do ataque, porém, estava sempre o nosso Capitão e diretor esportivo - o insubstituível Oscar Martins Pinheiro, o incomparável centro-avante de táticas imprevisíveis e cuja armação era invariavelmente bem sucedida. Já naquele tempo, Oscar Pinheiro se revelava, além de exímio player, excelente administrador, de uma dedicação e de um desprendimento invejáveis. Incapaz de uma picardia, de uma injustiça ou arbitrariedade, era o apaziguador nato das nossas exaltações juvenis. Ponderado, ordeiro e despretensioso, a sua personalidade sempre se impôs, marcantemente, em nossos corações.

Passados os anos, desaparecido o invicto "Miramar" e tantos inesquecíveis companheiros daquele tempo saudoso, tornamo-nos cidadãos, constituímos família (até já andamos embalando netos) e, apesar de não vivermos mais naquele tempo, não se alteraram a nossa amizade, os nossos sentimentos, a nossa compreensão da vida e a velha aspiração de levarmos uma existência respeitável e útil para todos os que nos rodeiam, seja no lar, no trabalho ou na sociedade a que nos honramos de pertencer.

E Oscar Martins Pinheiro, o incontestável Capitão daquele tempo, prosseguindo em sua trajetória retilínea, foi escalando merecidamente os mais altos postos, foi superando as arestas da vida. Engrandeceu-se, destacou-se entre os seus pares e, sem vulgarizar-se, sem generalizar-se, tornou-se Nosso Presidente, o sereno, equilibrado e dinâmico presidente da Humanitária, que se orgulha da sua colaboração preciosa e incansável, há cerca de 12 anos, em sucessivas diretorias. Salve Capitão Pinheiro. Salve Presidente Pinheiro...

O título desta história poderia ser De Capitão a Presidente... mas, obviamente, é preferível não provocar ciumeiras...


Oscar Martins Pinheiro, presidente da Humanitária 
e filho de Benedito Pinheiro, que também exerceu esse cargo na entidade
Foto publicada com a matéria

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