HISTÓRIA CONCRETA - Projetado na década de 50, o Edifício Enseada não só resistiu ao
tempo como ganhou status especial. O prédio situado na Avenida Bartolomeu de Gusmão, 180,
na Ponta da Praia, foi tombado pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Cultural de
Santos (Condepasa), que reconheceu seu valor histórico e cultural
Foto: Carlos Nogueira, publicada com a matéria
CONDEPASA
Edifício Enseada recebe proteção cultural
Imóvel da orla da praia se encaixa no nível 2 de preservação
Da Reportagem
Na década de 50, quando projetou os edifícios
residenciais Enseada e Verde Mar, Artacho Jurado não imaginava a importância cultural e histórica que as edificações teriam para a Cidade. Hoje,
cinco décadas depois, os imóveis, localizados na orla, estão protegidos pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Cultural de Santos (Condepasa).
Na última quarta-feira, o órgão reconheceu o Enseada como um edifício de valor
cultural e decidiu normatizá-lo com o nível de proteção 2, que corresponde à preservação parcial da edificação. O imóvel está situado na Avenida
Bartolomeu de Gusmão, 180, na Ponta da Praia.
O Enseada foi o segundo edifício residencial de Santos a receber esse tipo de
proteção. O primeiro foi o Verde Mar, que fica na Avenida Vicente de Carvalho, 6. Segundo o arquiteto do Condepasa, Edson Sampaio, esse tipo de
proteção significa que, a partir das próximas reformas, a administração do prédio precisará submeter qualquer intervenção à avaliação do conselho.
"A preservação incluiu as fachadas internas e externas, a volumetria, a cobertura
(incluindo as caixas d'água), o pavimento térreo, os jardins interno e externo, hall principal e seus elementos arquitetônicos decorativos e
de revestimentos".
Antes de determinar a inclusão do edifício como nível de proteção 2, o conselho tinha
estudado a possibilidade de tombar o imóvel. "Mas isso implicaria a preservação da parte interna dos apartamentos. E qualquer intervenção dentro das
residências teria que ser submetida à aprovação do Condepasa".
Antes mesmo de receber essa proteção, o edifício já estava sendo restaurado. "Estamos
pintando as paredes e portas com as cores originais e recuperando os bancos. Também já trocamos as pastilhas das pilastras da entrada do edifício",
disse o síndico Rolando Lopes Ferreira.
O sindico afirmou que não sabe se a determinação do Condepasa é boa ou ruim. "Vou
consultar o departamento jurídico do prédio para depois me posicionar sobre o assunto".
Segundo Ferreira, o prédio já possui mecanismos para proteger as características
originais do imóvel, previstos na convenção condominial. "Mas alguns síndicos foram coniventes e deixaram que fossem feitas algumas alterações na
fachada do imóvel".
Injustiçado - "Artacho Jurado não era respeitado pelos colegas de profissão da
época. O reconhecimento profissional só veio recentemente", contou o professor da Faculdade de Arquitetura da Universidade Católica de Santos (UniSantos),
Ruy Eduardo Debs Franco, que defendeu tese de mestrado no Mackenzie sobre a obra de Jurado, nascido em 1907 e morto em 1983.
Apesar da visível competência e sensibilidade de Jurado, Franco disse que o autor dos
projetos do Enseada e do Verde Mar nunca estudou Arquitetura. "Aos 9 anos, ele foi expulso da escola e nunca mais voltou a estudar. Não era
arquiteto de formação. Por conta disso, chegou até a ser perseguido pelo Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura (Crea)".
Segundo o professor, Jurado dava identidade às suas obras. "Coisa que não era feita
por outros arquitetos da época". De acordo com Franco, cerca de 88% dos trabalhos de Jurado, que trabalhou até 1966, estão na Capital. Entre
os mais importantes estão os edifícios Bretagne, Cinderela e Viaduto.
Fachadas internas e externas do prédio ficaram protegidas
Foto: Carlos Nogueira, publicada com a matéria
Moradores têm amor pelo prédio e não o trocam por nada
Quem mora no Edifício Enseada não troca o local por nada. Os imóveis no prédio custam
de R$ 60 mil a R$ 200 mil e a taxa condominial varia de R$ 180,00 a R$ 400,00.
A corretora de imóveis Isabel Cristina Lago, de 38 anos, mora no Enseada desde que
nasceu. Hoje é casada e tem três filhos. "Já mudei três vezes de apartamento aqui no prédio. A gente cria amor pelo local, pelas pessoas e pela
vista maravilhosa da Cidade".
Isabel contou que ingressou na profissão, há 10 anos, por causa do edifício. "Quando
era síndica, em 1993, muita gente me perguntava sobre imóveis para vender no Enseada. Então, resolvi virar corretora".
Já a proprietária de uma imobiliária, Maria das Graças de Oliveira, mora há 18 anos no
edifício, mas já mudou 10 vezes de apartamento. "Tenho paixão por esse prédio. Não saio daqui por nada".
Iniciativa aprovada - Morando há quase 30 anos no edifício, a aposentada Elza
Luiza Murtori, de 63 anos, acha boa a iniciativa do Condepasa de proteger culturalmente o imóvel.
"Será mais um meio para nós cuidarmos do nosso patrimônio. Alguns moradores não
entendem a importância de preservar as características originais da edificação e querem substituir as pastilhas da fachada, as janelas e a cor das
paredes. É uma briga de foice", disse Elza.
Segundo ela, as janelas do prédio são originalmente de madeira, pintadas de branco.
"Mas muitos moradores começaram a substituí-las por janelas de alumínio". |