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HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS - PIONEIROS DO AR
Gago Coutinho e S. Cabral em Santos (2)

Visita ocorreu pouco depois de sua travessia aérea Lisboa-Rio de Janeiro
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Também estiveram em Santos, onde foram calorosamente recepcionados, os aviadores portugueses que fizeram a travessia pioneira de Lisboa ao Rio de Janeiro, em 1922. Essa travessia foi atentamente acompanhada pela imprensa, em todos os seus detalhes e peripécias, e até nos cinemas eram exibidos filmes-documentários sobre cada etapa da viagem. O jornal santista A Tribuna também registrou, na página 2 da  edição de 18 de junho de 1922 (ortografia atualizada nesta transcrição):
 


Imagem: reprodução parcial da matéria original

As grandes manifestações na cidade

A alma brasileira e a alma portuguesa fraternizam-se num mesmo gesto de glorificação aos heróis do dia

Sacadura Cabral e Gago Coutinho, ídolos da multidão
- Notas e informações -

Os primeiros telegramas anunciando a partida do Pátria-Portugal da cidade de Vitória foram afixados nos placards dos jornais às 10 horas da manhã.

Desde então, a cidade começou a mover-se numa grande e ansiosa inquietação.

À frente das redações formavam-se grupos e grupos de populares, devorando, de olhos acesos, as notícias que de momento a momento eram afixadas nos quadros.

Diante do d'A Tribuna era tão compacto o agrupamento de curiosos, que, aos poucos, se foi tornando impossível o tráfego regular e desembaraçado dos bondes e dos automóveis; e à medida que noticiávamos a passagem do hidroavião pelas diferentes localidades do itinerário, a multidão fremia de júbilo irreprimível e vivava em delírio os intrepitosos aeronautas.

Nessa expectativa ansiosa, cheia de bons e de maus pressentimentos, a cidade se conservou, até que às 14 horas, mais ou menos, afixávamos o telegrama expressivamente lacônico e gloriosamente triunfal, anunciando a chegada dos aviadores à baía de Guanabara, entre o delírio das multidões e as festas mais ruidosas de que há notícia no Rio de Janeiro.

Daí por diante, pela tarde e pela noite a dentro, a cidade delirou; e não obstante a chuva insistente, fina e penetrante, que caía, uma chuvinha de irritar e de desmantelar todos os nervos, pode-se dizer que a população de Santos saiu para a rua a expandir a sua grande e irreprimível alegria.

Por toda a parte espoucavam girândolas de foguetes, tiros formidáveis de morteiros estouravam nos altos dos morros, e um júbilo ruidoso e incoercível sacudia todas as almas no mesmo frêmito de aplauso á glória portuguesa.

O frêmito de entusiasmo que sacudiu a cidade, logo que foi divulgada a notícia da chegada ao Rio dos bravos aviadores lusitanos, foi um desses movimentos de júbilo coletivo que só os acontecimentos sobrenaturais sabem provocar.

Desde o mais obscuro recanto até os pontos centrais; dos arredores do coração da urbe, pelos escritórios; dos lares mais humildes às mais luxuosas residências, o mesmo júbilo se alastrou, eletrizando a população, fazendo-a vibrar ao ritmo generoso e tocante de um só sentimento de culto pela vitória dos heróicos filhos de Portugal.

E de súbito, a cidade, que uma chuvinha impertinente, hostil, tornara tristonha, entrou de movimentar-se. Às praças principais afluíam, vindos dos bairros distantes, ondas de povo, ávidas de conhecer, pormenor a pormenor, a notícia da chegada dos gloriosos mensageiros do azul.

A turba se foi aos poucos adensando, de sorte que às 19 horas, não obstante o tempo implacável que reinava, a nossa cidade apresentava um aspecto animadíssimo.

Todos os departamentos de trabalho foram insensivelmente abandonados. Tocados pela centelha do júbilo que unia, numa só febril ansiedade, todos os corações, portugueses e brasileiros, mesmo os estrangeiros que aqui mourejam, como que sentiram a necessidade instintiva de dar-se as mãos, unificados, solidarizados, irmanados em face de um acontecimento que deixou de pertencer a uma raça, para ser já a conquista da própria humanidade.

São indescritíveis as demonstrações a que se entregaram os portugueses nesta cidade. Todos os restaurantes, lojas, oficinas, tendas de trabalho pertencentes aos compatriotas de Sacadura Cabral e Gago Coutinho tiveram suas portas escancaradas aos que festivamente quisessem confraternizar com eles, em ruidosas expansões de incontido contentamento.

A proverbial generosidade da gente portuguesa, que em momentos de alegria coletiva assume proporções espantosas da mais larga prodigalidade, foi posta à prova generalizadamente. Não houve lar modesto ou casa abastada que se não abrisse festiva à confraternizadora intimidade dos amigos e conhecidos, vocalizados todos pelo diapasão do entusiasmo, do frenético delírio que este momento excepcional está produzindo no povo português e brasileiro.

- - -

Como anunciáramos na edição de ontem, a comissão dos festejos em homenagem aos aviadores triunfantes organizaria, à noite, uma soleníssima Marche aux flambeaux, para saudar os poderes locais e a imprensa.

Às 20 horas, começou a afluir a massa humana para formar...

O grande préstito – O cortejo organizou-se no Largo do Rosário. Era incontável o número de pessoas que o formavam.

A cidade em peso, pode-se dizer, saiu a festejar nas ruas a grande glória lusitana. Sem exagero, podemos dizer que no cortejo figuravam mais de cinco mil pessoas.

À frente vinham os membros da comissão organizadora, e os srs. deputado A. S. Azevedo Júnior e dr. Ibrahim Nobre.

A seguir, entre compacta multidão, vinha a banda do Corpo Municipal de Bombeiros, gentilmente cedida pelo sr. vice-prefeito, em exercício.

Logo à retaguarda, formado em coluna de esquadras, com a respectiva banda marcial, viam-se fardados os garbosos reservistas e atiradores do Tiro Naval, em número de duzentos, mais ou menos, sob o comando do respectivo sargento sub-instrutor.

Ladeava essa força da Reserva Naval uma onda de entusiásticos manifestantes.

Via-se, depois, entre a multidão, a banda da Sociedade Musical Colonial Portuguesa, com o respectivo estandarte, conduzido pelos diretores.

Sucedia essa banda de música o batalhão dos Escoteiros de Santos, formado pelos alunos dos grupos escolares "Cesário Bastos", "Barnabé" e "Vila Macuco", e sob a direção dos respectivos diretores desses estabelecimentos de ensino.

Os meninos, visivelmente entusiasmados, formavam um quadrado, tendo ao centro a sua esplêndida banda de música e banda marcial.

Os que formavam as alas, empunhavam lanternas venezianas e queimavam fogos de artifício, o que dava ao préstito um aspecto deslumbrante.

Os Escoteiros, prestando o seu concurso à manifestação, deram uma prova eloqüente de resistência, mostrando, ainda, a par do seu grande entusiasmo, a sua perfeita disciplina.

Completava o majestoso cortejo luso-brasileiro a afinada banda de música da Sociedade União Portuguesa, rodeada por vários grupos.

Nessa disposição, e em marcha aux-flambeaux, os manifestantes demandaram o...

Consulado de Portugal - Na sede do consulado, falou o sr. Alberto de Carvalho, chanceler, tendo palavras eloqüentes e exaltando o patriotismo de seus compatriotas, pelo brilhantismo do raid aéreo.

Ao terminar a sua inflamada oração, o sr. Alberto de Carvalho foi muito aplaudido.

Sucedeu-o o sr. dr. Thomaz d'Alvim, advogado do consulado, que, em palavras repassadas de muito patriotismo, depois de justificar a ausência do sr. Valentim Ribeiro de Mello, vice-cônsul, em serviço no Rio, e de se referir ao feito glorioso de Sacadura Cabral e Gago Coutinho, saudou o sr. deputado A. S. Azevedo Júnior, expoente da política administrativa local, e o sr. dr. Ibrahim Nobre, delegado regional, que ali se achavam, para participar da imensa satisfação que predominava na alma dos portugueses.

Foi servida aos presentes uma taça de champanha. Os manifestantes se dirigiram para a Praça dos Andradas, em visita ao Jornal da Noite, onde houve vários oradores.

Contornando aquela praça, os manifestantes passaram em frente à Delegacia Regional, dando vivas à Polícia e ao Delegado Regional, alcançando a Rua S. Bento, até o...

Paço Municipal - Na sacada do respectivo edifício, que se achava profusamente iluminada a lâmpadas elétricas, mandadas colocar especialmente, viam-se, além das autoridades e altos funcionários municipais, exmas. senhoras e senhoritas da nossa melhor sociedade.

Entre outras, conseguimos anotar as exmas. mmes. Moura Ribeiro, coronel Montenegro, dr. Arthur Costa, dr. Schmidt Sarmento, Álvaro Montenegro, Carlos Affonseca, Victor Affonseca, viúva José Maria Barros Faria, e os srs. dr. B. De Moura Ribeiro, presidente da Câmara; Arnaldo Ferreira de Aguiar, vice-prefeito, em exercício; coronel Joaquim Montenegro, prefeito municipal; João Gonçalves Moreira e Benedicto Pinheiro, vereadores; Carlos Luiz de Affonseca, João Salermo, diretor da Secretaria da Câmara; Amando Stockler, diretor geral da Prefeitura; Jayme Diniz, diretor do Tesouro; Delfino Stockler de Lima, inspetor de instrução; dr. Schmidt Sarmento, dr. Dalberto de Moura Ribeiro, engenheiro fiscal; Francisco Paino, 1º oficial da presidência; tenente Innocencio da Costa Cruz, do Corpo de Bombeiros; dr. Arthur Costa, João Avelino de Moura Ribeiro, dr. Almiro Costa, Raul Affonseca, Álvaro Montenegro, Victor Affonseca, José Gaspar e outros.

À chegada do grande cortejo, as pessoas que se achavam na sacada prorromperam numa vibrante e calorosa salva de palmas.

A comissão promotora da grandiosa manifestação dirigiu-se para o gabinete do sr. presidente da Câmara, sendo aí recebida pelas pessoas acima.

O dr. Thomaz d'Alvim saudou, aí, os chefes dos poderes municipais, legítimos representantes da população santista, que se aliava, de uma forma altamente significativa, ao júbilo dos portugueses, pelo maravilhoso acontecimento que se comemorava.

O orador referiu-se ao padre Bartholomeu de Gusmão, dizendo que esse vulto da história se levantava no presente momento para reviver, na retina de todos que se sentem atraídos pelo formidável raid, levado a bom termo por Sacadura Cabral e Gago Coutinho.

Respondeu o sr. dr. Moura Ribeiro, presidente da Câmara, dizendo que os brasileiros se sentiam também orgulhosos pelo grande feito dos destemidos aviadores lusitanos, e comungavam, sem discrepância, com a justa alegria que dominava, naquele instante, o coração dos portugueses.

Terminando, o sr. presidente levanta a sua taça em honra de Portugal.

A seguir, voltaram as pessoas acima para a sacada, a fim de aplaudir a multidão, que se acotovelava em todo o Largo Marquês de Monte Alegre, dando idéia de um verdadeiro formigueiro humano.

O dr. Thomas d'Alvim falou, novamente, saldando, num brilhante discurso, as autoridades municipais.

Ao terminar, reboou uma prolongada salva de palmas, ao mesmo tempo que a banda Colonial Portuguesa executava o Hino Nacional, e as bandas do Corpo de Bombeiros e União tocavam, ao mesmo tempo, A Portuguesa.

Daí a momentos, o cortejo, que dificilmente se podia locomover, seguiu pelas ruas Comendador Netto e do Comércio, até a Praça Mauá, em visita à imprensa, orando, por essa ocasião, o nosso colega sr. Alberto de Carvalho.

Da Praça Mauá, os manifestantes se dirigiram à...

Redação da A Tribuna - Aí, entre os mais frenéticos aplausos da massa popular, falou, saudando esta folha, o ilustre advogado dr. Thomaz d'Alvim, que produziu uma formosa e conceituosíssima alocução, relembrando Portugal d'outrora, no esplendor e nas fulgurações da sua glória, e salientando, num lindo relevo literário, a obra ingente de Sacadura e de Gago Coutinho.

Pela redação d'A Tribuna, falou, exprimindo os altos sentimentos desta casa em face do grande empreendimento lusitano, o nosso redator-secretário.

Da redação desta folha seguiram os manifestantes até a sede do Centro Republicano Português e da União Portuguesa, cujas fachadas, profusamente iluminadas e ostentando as bandeiras nacional e portuguesa, davam um aspecto festivo.

Outros oradores fizeram-se ouvir, sempre aplaudidos delirantemente pela multidão, que aclamava, unissonamente, os nomes vitoriosos dos dois navegadores dos ares.

O tempo passava e o entusiasmo popular não arrefecia.

Do Centro Republicano o cortejo demandou a Gazeta do Povo, e aí dissolveu-se, cerca das 21 horas.

Durante o resto da noite, as ruas centrais da cidade eram trafegadas por inúmeros grupos de entusiastas, que davam largas, ainda, ao seu justo orgulho.

O que mais ressalta em todo esse movimento de patriotismo e de alegria é a circunstância de não se registrar o mais leve fato desagradável, que viesse empanar o brilho da manifestação, e que quase sempre se registra em tais demonstrações, pela aglomeração popular.

Várias notícias

Jantar aos encarcerados da Cadeia Pública - Os auxiliares das casas ferragistas desta praça, desejando também homenagear, dum modo excepcionalmente piedoso, os heróicos aviadores lusos, promoveram uma subscrição entre a classe para um fim que muito a enobrece.

A homenagem dos ferragistas traduz-se em um copioso jantar de 50 talheres, que será oferecido hoje aos presos da Cadeia Pública desta cidade.

Esse jantar se efetuará às 14 horas, tendo sido encarregado do serviço o conhecido restaurante A Bodega.

Aos detentos serão oferecidos também cigarros e charutos.

Como se vê, entre as muitas maneiras que o entusiasmo da cidade imaginou para festejar o grande acontecimento, nenhuma excede em comovente originalidade a essa que os distintos moços, dignos auxiliares do comércio local, vão pôr em prática.

Na Bolsa - Quando se procedia à última chamada na Bolsa Oficial de Café, às 13,35 horas, foi anunciada a chegada ao Rio de Janeiro dos aviadores portugueses Sacadura Cabral e Gago Coutinho.

O sr. Raul de Souza Dantas, que presidia a sessão, suspendeu os trabalhos por dois minutos, em regozijo pelo feito dos bravos pilotos lusitanos.

Nesta ocasião foram erguidos vivas ao Brasil e Portugal, e aos bravos aviadores.

No Instituto Floriano Cruz e na Escola "Floriano Cruz" - Ao conhecer-se nestas casas de ensino a notícia da chegada dos aviadores portugueses ao Rio, a diretoria determinou que se fizessem preleções em todas as classes e em seguida fossem suspensas as aulas.

À noite, reunidos os professores e numerosos alunos dos cursos noturnos daquelas escolas, o prof. Floriano Cruz pronunciou um discurso patriótico, terminando com estas palavras:

"Senhores alunos:

"O extraordinário fato de hoje não patenteia senão que o povo português continua a ser o que sempre foi: povo enérgico, altivo, audaz, intemerato, lutando e vencendo em todos os embates. E nós, que não somos mais que o mesmo povo, ou quase ele, vivendo noutras terras, pois o Brasil não é senão o prolongamento de Portugal – exultando com a vitória inigualável deste dia, reverenciamos os antepassados, aqueles que, legando-nos exemplos inumeráveis de trabalho e perseverança no trabalho, pelo exemplo nos abriram o caminho do esforço, da tenacidade; do esforço que se não enfraquece, da tenacidade que se não entibia, que se não deixa vencer mas avança, progride, triunfa, e triunfa admiravelmente e inconfrontavelmente. Vencedores no dia de hoje, os portugueses, nós ainda uma vez vencemos com eles; acompanha-os o nosso cérebro, o nosso coração, segue-os o sincero entusiasmo de um povo inteiro, a exaltação máxima das nossas almas. Os portugueses venceram a aspiração suprema desta hora e nós brasileiros ganhamos de Deus o favor da vitória, a satisfação dos votos que lhe formulamos pelo sucesso do excelso cometimento. Associemo-nos, pois, no regozijo e que esta associação se prolongue, se estenda, aumente e produza, cresça cada vez mais, ascenda interminavelmente e se engrandeça e seja esse engrandecimento permanente, indestrutível, vigoroso, sentido e compreendido."

No Restaurante Portugal – Conforme foi por nós ontem noticiado, o proprietário do restaurante Portugal, à Rua do Rosário, no intuito de homenagear o glorioso feito de Gago Coutinho e Sacadura Cabral, levou a efeito, em seu estabelecimento, uma bela festa de cordialidade.

À meia-noite, aos representantes da imprensa e demais pessoas gradas, foi oferecida ali uma lauta ceia.

Essa festa foi abrilhantada pela banda da Colonial Portuguesa e esteve muito animada.

Real Centro Português - Continuando os festejos em homenagem aos destemidos aviadores lusos, esta distinta agremiação oferece hoje a seus associados uma grandiosa soirée artística.

Pelos amadores do centro será representada a peça em 2 atos, gênero Gran Guingnol, repertório do dr. Leopoldo Fróes, Beijos nas trevas, que foi caprichosamente ensaiada pelo sr. Alberto Vieira.

A conhecida casa Relâmpago, da propriedade do sr. Innocencio Portugal, gentilmente se prestou a executar a apoteose que terminará a parte dramática da reunião de hoje.

Os amadores a quem foi distribuída a peça de hoje são os srs. Covas, Silveira, Lascala, Villela, Cardoso, Julieta Rocha e srta. Ruth Victoria.

A orquestra do Centro, sob a direção do sr. Odair Sharpe, tocará escolhido repertório.

Os auxiliares da casa João Jorge, Figueiredo e Cia., enviaram saudações aos aviadores - Os auxiliares da casa João Jorge, Figueiredo e C., desta praça, transmitiram aos aviadores lusos o seguinte telegrama:

"Sacadura e Coutinho – Cônsul português. Rio. Aos glorificadores da eterna raça portuguesa enviamos nossas calorosas saudações pelo término do brilhante raid através Atlântico, trazendo na Cruz de Cristo a confraternização do povo português para com o povo brasileiro, marcando dessa arte nas páginas da história portuguesa mais uma das suas inolvidáveis glórias.

"Auxiliares da firma João Jorge, Figueiredo e C., de Santos: João Monteiro de Oliveira, José Loureiro de Almeida, Albano Côrte Real, Henrique Simões, Nestor Junqueira, Sebastião Bittencourt, Joaquim Pinto Ferreira, Rangel Jorge dos Santos, Lourenço de Mattos, Adelino Serra, Bazilio Lacerda, Cypriano de Mattos, Affonso Jorge de Andrade, Newton Camargo, Ângelo Lopes, João Ferreira Brandão, Antonio Pinto Ferreira, José Demar, Amadeu Marques da Silva, Ernesto Lacerta, Antonio de Mattos, Virgílio da Costa, Manuel Barbosa, Antonio Gatto, Nelson Silva, Honorio Caldeira, Alfredo Souza, Alfredo Rodrigues".

Escola Docas de Santos - A Associação Beneficente dos Empregados da Companhia Docas de Santos, associando-se às justas manifestações aos arrojados azes portugueses Sacadura Cabral e Gago Coutinho, suspendeu as aulas da escola, por ela mantida, rendendo assim um preito de homenagem ao heróico feito.

Logo que foi conhecida, nesta cidade, a notícia da chegada triunfal dos aviadores portugueses Gago Coutinho e Sacadura Cabral ao Rio, o sr. Carrico, proprietário da padaria e confeitaria Estrella, à Rua Amador Bueno, possuído de indescritível entusiasmo patriótico, mandou queimar grande quantidade de bombas, foguetes etc.

Esse cavalheiro pôs gratuitamente à disposição de todos os seus amigos e fregueses as diferentes espécies de bebidas que possuía em seu acreditado estabelecimento, bem como doces, conservas e outras especiarias.

O bar e confeitaria A Jodéa, à Rua Frei Gaspar, durante todo o decorrer do raid afixou à sua porta todos os telegramas que narravam as peripécias da arrojada travessia aérea.

Na pitoresca Ilha Porchat houve significativa homenagem aos aviadores lusos.

Os srs. Boucault e Filho, ao terem conhecimento da chegada de Sacadura Cabral e Gago Coutinho à capital da República, mandaram ornamentar artisticamente a Ilha, armando belíssimo arco à entrada daquele magnífico recanto santista.

À noite, quando era elevado o número de freqüentadores da Ilha, a orquestra, grandemente aumentada, executou os hinos Nacional e Português, que foram ouvidos de pé pela assistência.

Muitos dos presentes empunhavam bandeirolas do Brasil e de Portugal.

Finda a execução dos hinos, os srs. Boucault e Filho ofereceram aos que ali se achavam um copo de cerveja.

Em todos os cinemas, em todos os teatros, nos cafés, nos restaurantes, hotéis, enfim, em qualquer lugar em que houvesse agrupamento, outro assunto não tinha entrada, a não ser aquele que se referia ao feito glorioso dos dois azes portugueses.

E assim, bandeirolas portuguesas, brasileiras e paulistas havia aos milhares.

Os mais entusiasmados, os mais possuídos pelo frissom do delírio, que empolgou a multidão durante todo o dia de ontem, não se contiveram, transbordavam...

E assim, depois das 14 horas de ontem, até as 4 horas de hoje, só se ouviam o estrugir de foguetes, o rumor surdo de fantásticos morteiros, os tiros secos de revólver e de outras armas, o espoucar de bombas...

A alegria popular, malgrado o carrancismo do dia todo e que se prolongou pela noite e madrugada afora, iluminava todos os rostos, brilhava em todos os olhares...

A senhorita Anésia Pinheiro Machado, intrépida aviadora patrícia, fez ontem, à hora em que apareceram as primeiras notícias da chegada dos aviadores, lindas evoluções sobre o centro da cidade, espalhando impressos com uma formosa saudação ao gênio lusitano.

Na reunião de ontem da grande comissão da Colônia Portuguesa, foi, pelo sr. Vasco Ortigão, proposto que se inserisse em ata a seguinte declaração:

"Tem-se espalhado, não nos interessa saber com que intuitos, conceitos menos verdadeiros sobre a atitude de s. ex. o sr. presidente da República para com a Colônia Portuguesa, neste momento de confraternização luso-brasileira. É de nosso dever e lealdade afirmar bem publicamente que esta comissão tem encontrado sempre e invariavelmente da parte das altas autoridades com quem teve necessidade de se por em contato, o mais cativante acolhimento e a mais carinhosa colaboração.

"Se mais não temos obtido, é por que mais não temos pedido, nem era necessário ao nosso programa, e cumpre-nos declarar que o acolhimento que temos recebido foi inspirado aos seus distintos colaboradores pelo sr. dr. Epitácio Pessoa, no sentido de nos serem oferecidas todas as facilidades. Podemos ainda afirmar que o chefe da Nação, longe de ser hostil ou mesmo indiferente às manifestações de regozijo da nossa Colônia, as acompanha com viva simpatia e cordial interesse. Aproveitando esta reunião, peço que fique consignado na respectiva ata o nosso protesto contra insinuação desta natureza".

Ainda nessa mesma página:


Imagem: reprodução da matéria original

NO RIO
Foi um espetáculo inédito, grandioso e indescritível a recepção dos aviadores portugueses

A multidão - O delírio popular - A expectativa ansiosa

RIO, 17 - Às primeiras horas da manhã de hoje, o movimento das ruas era extraordinário, formando-se grandes grupos diante das redações, para lerem as notícias acerca da partida dos aviadores. Houve momentos em que chegou a apoderar-se das massas curiosas um verdadeiro desânimo, devido ao tempo, que se apresentava incerto.

Às 10 horas, menos 15 minutos, chegou a notícia da partida, de Vitória, notícia que foi recebida com estrondosas aclamações da massa popular, que, nesse momento, era já imensa.

Todos os automóveis estacionados na avenida Central e nas ruas próximas buzinaram, de maneira desesperadora, durante dez minutos.

Foi um verdadeiro desvairamento.

Propalada a notícia nos subúrbios, começaram os trens da Central e da Leopoldina a despejar gente, que seguia para a frente dos jornais, onde se entregava a delirantes manifestações, à chegada de cada telegrama anunciando a passagem do avião em determinada localidade.

Ao mesmo tempo, a baía de Guanabara estava coalhada de centenares de lanchas e outras embarcações, cheias de famílias, que seguiam em direção à barra. Ao meio dia, em frente à fortaleza de Santa Cruz, bordejava uma verdadeira multidão de embarcações, inclusive o paquete português Traz-os-Montes, o brasileiro Curvello e várias barcas da Cantareira e inúmeras embarcações, dos clubes náuticos.

Toda a avenida Beira-Mar, até a Praia Vermelha, estava apinhada de gente, que, ansiosa, fixava atentamente o céu.

Pouco depois do meio dia começaram a evoluir os aviões nacionais que compunham as esquadrilhas de recepção. Todos os aparelhos, depois de brilhantes evoluções sobre a baía, saíram para o alto mar, de onde regressaram pouco depois, devido à cerração reinante.

O cais Pharoux estava repleto de povo. As grades e amuradas dificilmente suportavam a enorme massa de curiosos, que formavam verdadeiras avalanches humanas. O entusiasmo era intenso, e a cada passo aumentado pelos passageiros de centenares de automóveis que, agitando bandeiras brasileiras e portuguesas, aclamavam os aviadores dos dois países.

O trânsito, nas ruas vizinhas, era dificílimo, quase impossível.

Desde cedo, a estátua de Álvares Cabral apareceu coberta de flores naturais, ostentando também bandeiras nacionais e portuguesas.

Os telhados das casas, os cumes das colinas, estavam cheios de gente. As torres das igrejas, principalmente das que estão em obras, achavam-se apinhadas de populares; os andaimes das obras da Exposição pareciam enfeitados de flores humanas, tal era o número de curiosos. Todas as árvores da avenida Beira-Mar tinham pendurados como que grandes cachos humanos, que faziam prodígios de equilíbrio para não caírem.

De todos os pontos explodiam constantemente bombas festivas, e nos ares estouravam foguetes.

Todo o Rio parecia preso de verdadeira loucura.

À medida que crescia o movimento nas ruas, morros, telhados, torres de igrejas etc., aumentava a ansiedade entre as massas populares.

Finalmente, depois de longa e ansiosa espera, apareceu à entrada da barra o vulto do elegante Fairey 17, que saía, como por encanto, de uma nuvem, para se apresentar aos olhos ansiosos da Capital Federal.

Ao aparecimento do avião, todas as embarcações apitaram estridentemente; foguetes espoucaram, sinos repicaram, aclamações vibrantes e ensurdecedoras saíram de todas as bocas.

O avião deu volta a regular altura, na praia de Botafogo, e seguiu depois em direção à Ilha das Enxadas, sede da Aviação Naval, onde desceu, depois de belíssima evolução sobre a ilha.

No cais da Ilha das Enxadas, apinhado de famílias dos aviadores brasileiros, viam-se altas autoridades, moços das escolas, representantes da imprensa, tudo o que de mais distinto existe no Rio de Janeiro.

No momento em que o avião tocou com os flutuadores a água, estrondosas e vibrantes aclamações partiram, em sinal de alegria pela grande vitória dos aviadores, os quais agradeciam, sorridentes e comovidos.

Depois de atracada ao cais a lancha ministerial, os aviadores saltaram, sendo recebidos pelos colegas brasileiros e altas autoridades da Armada. A multidão comprimia-se, a fim de vê-los de perto, mas era isto impossível, porque Sacadura Cabral e Gago Coutinho foram monopolizados pelos aviadores brasileiros.

No momento em que Coutinho ficou um pouco livre, senhoras e senhoritas correram pressurosas a abraçá-lo e beijá-lo. Coutinho tinha os olhos rasos de lágrimas. Sacadura foi arrastado no seio da multidão.

Os dois aviadores vinham completamente encharcados. Sacadura vestia macacão e Gago um uniforme branco, sem galões. Depois de receberem cumprimentos dos representantes das autoridades, seguiram acompanhados dos aviadores nacionais, dos seus ajudantes de ordens, representantes do prefeito, dos ministros e autoridades, para bordo do cruzador República, onde mudaram de roupa e descansaram meia hora, finda a qual desembarcaram e seguiram em direção à praça Mauá, que estava literalmente repleta.

Ali foram saudados, em nome do prefeito, pelo dr. Raphael Pinheiro, seguido do dr. Alexandre Albuquerque, em nome da colônia.

Às 17 horas, o imenso cortejo pôs-se em marcha, entrando na Avenida Central debaixo de estrondosas e triunfais aclamações.

O movimento na avenida era absolutamente impossível, tal era a massa de povo que se comprimia, ansiosa por ver de perto os aviadores.

As janelas e sacadas estavam apinhadas de senhoras e senhoritas, que despejaram sobre os aviadores verdadeiras montanhas de ramos e flores.

No primeiro carro, seguia Sacadura, com o embaixador português. Coutinho, com o representante do presidente da República e autoridades, ia no segundo.

Raríssimas vezes a Avenida tem comportado tanta gente, como hoje, e nunca teve aspecto tão impressionante, de tão comovedora grandeza. Todas as fachadas estavam engalanadas e embandeiradas, predominando as bandeiras das duas nações.

Rompendo a custo entre a compacta massa de povo, o cortejo seguiu ao fim da avenida, e foi à estátua de Álvares Cabral, que contornou, em homenagem ao descobridor do Brasil. A estátua estava lindamente enfeitada com flores naturais, bandeiras e galhardetes.

Foi um momento profundamente emocionante quando os aviadores defrontaram a figura grandiosa de Álvares Cabral. A multidão rompeu em novas e vibrantes aclamações, as quais os aviadores recebiam sorridentes, lançando beijos às senhoritas que, dos dois lados da avenida, lhes atiravam pétalas de flores.

Depois de contornar a estátua, o cortejo voltou à avenida, até o Palace Hotel, onde foram hospedados os aviadores.

A multidão estacionou em frente ao hotel até 20 horas, quando começou a chover.

Os aviadores descansam esta noite, mas muitas associações festejam brilhantemente a sua chegada.

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