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CULTURA/ESPORTE NA BAIXADA SANTISTA - LYDIA
Lydia Federici (4 - crônica 409)

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Em mais de três décadas de atuação diária, Lydia Federici publicou milhares de crônicas no jornal santista A Tribuna. A Hemeroteca Pública Municipal de Santos criou um Espaço Lydia Federici, onde estão expostos desde sua máquina de escrever até os troféus desportivos, bem como os organizados álbuns de recortes reunindo todos os seus textos publicados. Esta crônica foi publicada em 12 de maio de 1963 em A Tribuna (ortografia atualizada nesta transcrição):
 
 
GENTE E COISAS DA CIDADE

Filhos em ação

Lydia Federici

Serginho está no quarto. Debruçado sobre a mesinha de cabeceira. Há dez dias pensa numa frase. Numa frase bonita que ele escreverá no cartão colorido que comprou para sua mãe. Consultou colegas. “Bobo! Dá um cartão já escrito. É só assinar”. Mas o garoto não quer coisas já escritas. Ele mesmo quer inventar a sua frasezinha.

O pai, sempre muito ocupado, disse-lhe que escrevesse qualquer coisa. Qualquer coisa que sentisse. Puxa! Sentir ele sentia. Mas tudo atrapalhado. Que é que ele podia dizer? O cartão não era tão grande assim. A cozinheira também não o ajudou. E a professora só lhe disseara o que já havia dito a toda a classe. Assim não valia. Pra sua mãe tinha que ser uma coisa só para ela.

Serginho está no quarto. De porta trancada. Debruçado sobre a mesinha de cabeceira. Zangado com seu cérebro que não sabe dizer o que seu coração sente.

***

Marina, a menina pobre, passeava sua sujeira pela Castro Alves. Num jardim, viu uma flor. Vermelha. Olhou a rua. Olhoua casa fechada. Experimentou o trinco do portão. Latidos furiosos vieram correndo do fundo do quintal. Uma cara preta apareceu na janela da garagem.

Marinha tremeu. Apertando a saia contra as pernas magras. Sem saber como, com uma voz muito fina, atraveu-se a pedir.

E saiu contente. Segurando diante dos olhos, com mil cuidados, a flor que não tivera que roubar.

***

Oscarzinho, petulante, entrou na Tecelagem. Procurou a vendedora mais bonita.

“Alô, mimosura. Que é que você daria para sua mãe?” Com um sorriso muito aberto escondia sua insegurança.

Queria fazenda para um vestido. Teve que sair, não sem pose, com fazenda para uma blusa apenas.

***

O senhor de colarinho engomado entrou na casa de flores do Boqueirão. Viu os cravos. Queria os brancos. A três mil a dúzia? Ergueu, com espanto, as sobrancelhas brancas. Pensou um poudo. Os dedos magros beliscando o queixo. Que fazer? Ela sempre gostara de cravos brancos. Pediu nove. Um era o seu. Os outros oito ele lhos levaria em nome de seus manos. Era o que faziam quando estavam todos juntos. Só que em dúzias. Às dúzias.

***

O bebê, a coçar o seu primeiro dentinho, não sabe que dia é hoje. Mas sorrirá o sorriso que a mãezinha, emocionada, interpretará como o seu beijo mais gostoso.

***

A madre de touca branca, no asilo, descobrirár que de nada valeu falar na Mãe do Céu. O menininho de azul olha-a com ternura. Ela, para ele, é a única mãe que conhece.

***

Ó mães, queridas. Como é bom, no dia de hoje, homenageá-las. Embora sem saber como fazê-lo.


Imagem: reprodução do álbum de recortes de Lydia Federici, no acervo da Hemeroteca Municipal

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