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CULTURA/ESPORTE NA BAIXADA SANTISTA - LYDIA
Lydia Federici (4 - crônica 389)

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Em mais de três décadas de atuação diária, Lydia Federici publicou milhares de crônicas no jornal santista A Tribuna. A Hemeroteca Pública Municipal de Santos criou um Espaço Lydia Federici, onde estão expostos desde sua máquina de escrever até os troféus desportivos, bem como os organizados álbuns de recortes reunindo todos os seus textos publicados. Esta crônica foi publicada em 16 de abril de 1963 em A Tribuna (ortografia atualizada nesta transcrição):
 
 
GENTE E COISAS DA CIDADE

Caminhantes imprudentes

Lydia Federici

Um tribunal português, ao examinar o relatório de um caso de atropelamento, não teve dúvidas em julgar. E aplicar a sentença condenatória. O caso fora o seguinte: o sr. Ferreira, avançando a pé, por uma avenida que, na hora, dava livre trânsito aos veículos, provocara um desastre. Atropelara um motociclista. Que sobre ele viera. A culpa, positivamente, fora do desobediente pedestre. Desobediente ou distraído? Não importava. O juiz aplicou-lhe uma condenação. Para ensiná-lo a respeitar o direito dos motoristas.

Ai. Se aqui começássemos a castigar os transeuntes imprudentes, distraídos ou afoitos, nossas ruas se despovoariam. Porque, francamente, andar mal como andamos nós, em nenhum outro lugar da terra se vê. O santista ainda não se convenceu de que a cidade se motorizou. Onde, antes, corriam 3 mil veículos, disparam hoje dezoito mil. Isso em dia comum. Que, nos feriados e fins de semana, o número vai a 24. Ou 25 mil.

Outro mal nosso é não nos convencermos de que, pelo menos nas ruas, a decantada pacatez do santista já não existe. Corre-se, agora, por aqui. Principalmente quem gira sobre rodas de borracha. E o terceiro fator de nosso péssimo transitar é o desconhecimento das regras de trânsito.

Trânsito, para os pedestres, é essa coisa a que ciclistas, lambretistas, triciclistas, choferees e ‘chauffeuses’, motoristas e motorneiros estão sujeitos. Obrigados a obedecer. Sinaleiros e faixas, guardas e gritos, pisca-piscas, postes de sinalização, apitos e multas foram inventados para chatear os gozadores que guiam. Nunca para disciplinar os mártires que andam a pé. Vai daí o antagonismo que separa as duas classes. Perfeitamente distintas. Uma detestando e excomungando a outra.

O ideal seria que as duas bem determinadas categorias chegassem a compreender seus direitos. E suas obrigações. De um modo geral, passeios e calçadas são exclusividade do caminhante. Como rua ou avenida é leito em que os veículos têm preferência. Onde têm prioridade.

Quando um carro, para entrar numa garagem, tem que subir no passeio, é dever do motorista esperar que o casalzinho sussurrante lhe livre a passagem. Para que assustar, com uma buzinada ou investida terrestre, quem está no céu? Como também é obrigação de quem anda a pé respeitar e facilitar a corrida de quem guia.

Nesse caso, nunca se atravessaria, por exemplo, a avenida da praia? Claro que sim. É só procurar uma esquina. As faixas de segurança. Há sempre guardas ali. Mas quem diz? Pedestre e motorista são inimigos. Fazem questão de viver em guerra. Ambos se atropelam. E se atrapalham. Por teimosia. E birra.

No dia seguinte, infelizmente, os jornais noticiam a desgraça.


Imagem: reprodução do álbum de recortes de Lydia Federici, no acervo da Hemeroteca Municipal

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