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CULTURA/ESPORTE NA BAIXADA SANTISTA - LYDIA
Lydia Federici (4 - crônica 388)

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Em mais de três décadas de atuação diária, Lydia Federici publicou milhares de crônicas no jornal santista A Tribuna. A Hemeroteca Pública Municipal de Santos criou um Espaço Lydia Federici, onde estão expostos desde sua máquina de escrever até os troféus desportivos, bem como os organizados álbuns de recortes reunindo todos os seus textos publicados. Esta crônica foi publicada em 14 de abril de 1963 em A Tribuna (ortografia atualizada nesta transcrição):
 
 
GENTE E COISAS DA CIDADE

Pior que feitiço

Lydia Federici

Se a praia está bonita? Como é que alguém pode responder? Imagine sol, amigo. Céu azul. Uma brisa fresca, fresca. Que não chega a despentear cabelos. Tão delicada que apenas nos acaricia o rosto. E, dentro desse ouro e desse azul, todas as cores do mundo. Toda a alegria do mundo. Encobrindo tristezas. Enterrando preocupações.

Se a praia está bonita? Está. Está de fazer a gente esquecer compromisso. De fazer postergar obrigação. Diante de seu chamado, tudo o mais desaparece. Quem já a viu, não resiste. Vai até a sua areia morna. Quem não a conhece, sente, nas palavras dos outros, no colorido dos cartões postais, o feitiço que dela emana. E então, mar e praia santistas ganham novos apaixonados.

A propósito. Só para provar que não há exagero nessa afirmação. Foi em São Paulo que me contaram a história. Nesta última terça-feira.

Técnicos suíços desembarcaram. Vindos de lagos azuis. Coroados por montanhas brancas. Largaram o fim do inverno europeu e caíram em cheio no resto de verão tropical. Mais do que lógico que bufassem, esbaforidos, diante da quentura do ar. Que semicerrassem os olhos. Habituados ao revérbero das neves brancas, sim. Mas não a toda a luminosidade dourada deste sol.

Chegaram preocupados. Como preocupados haviam viajado. Ter a responsabilidade de transportar aparelhos de precisão estraga a vida de qualquer criatura. Desembarcar cronômetros, máquinas fotográficas, fios, disparadores, é serviço que esgota. “Atenção. Atenção. Não virem a caixa. Esta parte para cima, por favor. Não! Com jeito. Sem bater. Deus abençoado”.

Mas a viagem e o desembaraço da bagagem e das encomendas ainda não era o pior. Instalar toda aquela aparelhagem na pista, na piscina do Pacaembu, com os Jogos Pan-Americanos à vista, é que era duro. Poderia a grande fábrica suíça falhar? Evidente que não. E era por isso, mais que pelo calor, que eles suavam. Correndo de um lado para outro. Como danados.

Quando todas as caixas e caixotes fossem levados, com cuidado, para seu destino, os técnicos endireitariam as costas. E suspiraram. Agora era só fazer a instalação. Verificar se tudo funcionava bem. De quantos dias dispunham para esse trabalho? Dez dias? Oh! Tinham que trabalhar ligeiro.

“Começamos?”, perguntou um. Os outros olharam as caixas. Passaram os olhos pelos brasileiros que os fitavam. Convidando-os a arregaçar as mangas. Que diabo! Os Jogos estavam na porta. Havia os feriados da Semana Santa pra atrapalhar. Claro que tinham de começar logo. Os suíços olharam o céu paulistano. Azul. Bonito. E se lá estava assim tão convidativo, como não estaria o daqui?
Não tiveram dúvidas. Largaram tudo. Vieram ver a praia de Santos. Sem dar confiança a ninguém.

Não é pior que feitiço o chamariz deste semicírculo de areia dourada?


Imagem: reprodução do álbum de recortes de Lydia Federici, no acervo da Hemeroteca Municipal

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