GENTE E COISAS DA CIDADE
Pais de estudantes
Lydia Federici
Como fazer um filho estudar?
A resposta, amigo, é uma história. Contendo, a meu ver, a melhor sugsetão. Aproveitemos o exemplo de uma senhora. Mãe de um dos rapazes premiados no concurso “Jovens cientistas para o Brasil”.
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Dona Elvira é dona de casa. Completa. Passa do porão ao forro sem pestanejar. Soalho, para ela, não tem segredos. Lavagem, passagem, arrumação de roupa, não constituem drama. Conhece armazéns e mercearias de preços razoáveis. Não discute com feirante. Sabe o que lhe vende mais em conta. E, na cozinha, não perde tempo. A olhar para um rango morto. Coração em angústia. Reunindo coragem para queimá-lo com água fervente. E depená-lo.
Conto todos esses detalhes apenas para mostrar-lhe, amigo, que, virando-se dessa forma, não lhe resta muito tempo para desperdiçar em bobagens. Ao contrário. Dona Elvira estica os minutos de seu dia. Para poder cumprir todas suas tarefas domésticas. Em ordem. Sem esquecer-se que é esposa. E mãe de dois rapagões. Que até hoje, felizmente, nunca lhe deram aborrecimentos. Ou preocupações.
Ambos gostam de estudar. Mas conto-lhes o por quê. O mais novo, por exemplo, gosta de ciências. Quando o quarto, no ffundo do quintal, larga fumaça pelas telhas, Dona Elvira vai lá ver o que está acontecendo.
“Que experiência foi essa, meu filho?” Não entende de tubos de ensaio. Nem de combinações químicas. Mas ouve a explicação aborrecida do filho.
“Ora. Vai ver que você errou na dosagem. Experimente de novo”. E, tossindo, ajuda o rapaz a segurar provetas.
Se há uma explosão no fundo do quintal, ela não se põe a gritar. Vai ver a razão de tanto barulho. A mistura não dera certo? Ou o foguete é que era muito frágil? “Ora. Pra que essa cara emburrada. Os americanos também não vivem errando?”
É assim que ela acompanha e encoraja as experiências do seu garoto. Se a batata, no forno, passou do ponto, paciência. Foi por conta do lançamento de Ponta-Praieral. E daí?
Há pouco tempo, o rapaz que gosta de Biologia reuniu uns colegas. Tinham conseguido um paciente. Estudariam, ao vivo, um pouco de anatomia.
“Mãe! Não quer viver ver esta experiência?”
Dona Elvira, previdente, baixou as chamas do fogão. No quarto dos fundos, sobre a mesa, uma rã de olhos espantados saudou-a com um coaxo. A senhora, mão no coração, pulou para trás. Mas dominou-se. E acompanhou todas as fases do anestesiamento. Viu a incisão. A retirada dos órgãos. Interessou-se, de longe, pelos comentários que os rapazes, maravilhados, faziam. Só perguntava se o bichinho não sofria. Anestesiado? Sem coração? Ora, mamãe.
Ele estava morto havia séculos.
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É assim, amigo, que se ajuda um filho a estudar. A gostar do estudo. Acompanhando-o de perto. Compreendeu?
Imagem: reprodução do álbum de recortes de Lydia Federici, no acervo da Hemeroteca Municipal
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