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CULTURA/ESPORTE NA BAIXADA SANTISTA - LYDIA
Lydia Federici (4 - crônica 354)
Em mais de três décadas de atuação diária, Lydia Federici publicou milhares de crônicas no jornal santista A Tribuna. A Hemeroteca Pública Municipal de Santos criou um Espaço Lydia Federici, onde estão
expostos desde sua máquina de escrever até os troféus desportivos, bem como os organizados álbuns de recortes reunindo todos os seus textos publicados. Esta crônica foi publicada em 5 de março de 1963 em A Tribuna (ortografia atualizada nesta
transcrição):
GENTE E COISAS DA CIDADE Terminou a temporada
Lydia Federici
Lucrando ou penando, não há santista que, nas temporadas, não sinta sua vida sofrer uma viravolta. E é sempre um grande
suspiro de alívio que acompanha o adeus aos visitantes. Suspiro de alívio? Muito mais que isso. É um estiramento da alma. A mesma gostosa sensação do minuto que precede o descanso que se vai ter. Após um dia de luta. de trabalho. De correria ou de
preocupação. Exatamente a mesma alegria do instante em que se largam os chinelos. Ao lado da cama. O corpo ainda úmido pelo banho tomado. A promessa de uma reparadora horizontabilidade. Depois de estafantes 16 horas verticais.
O mal de nossa vida não é ser Santos uma cidade turística. Isso até que é bom. O nosso azar é não nos habituarmos a essa situação. No dia em que aceitarmos o dobramento intempestivo da população, como fato corriqueiro,penaremos menos. Porque
temporada é assim mesmo. Pensando bem, com toda honestidade,há época mais bonita que a temporada de verão? Com seus três longos meses de movimento livre, feliz? Vestidos de leve? Com cores alegres? Um ar de férias nos rostos queimados de todo
mundo? E o mês de julho, apesar de encasacado, também não tem uma vida mais risonha?
A temporada acabou. Você, por acaso, passou ontem à noite pelo Gonzaga? Cruzou pelo Boqueirão? Foi-lhe fácil sentar-se a uma mesa de bar? Que bom, não? Mas, diga-me. Naquele silêncio, no meio do sossego, não lhe pareceu insosso o sorvete? Choca a
cerveja?
A temporada acabou. O centro voltou ao normal. Quem vai à cidade, vai pra trabalhar. Só vê trabalho. Já não encontra todo um povaréu flanando pelas ruas. Passeando pernas à mostra. Caras vermelhas. Desocupadas. Com ar despreocupado. Sem se
impressionar com ponteiros de relógios. Esses benditos ponteiros que escravizam a vida de quem trabalha. É claro que, agora, é muito mais rendoso o trabalho. Não há tantas distrações bonitas ou apenas interessantes a prender olhos que teriam a
obrigação de só ver números. De fazer negócios importantes. Mas que graça tem, agora, a cidade trabalhadora?
A temporada acabou. A vida da dona de casa, fazedora de compras, tornou-se mais cômoda. Pode-se escolher u bom pedaço de alcatra. Selecionar, sem atropelo, um repolhudo e não tão queimado pé de alface. As comadres não mais precisam correr atrás dos
legumes que se evaporam. Tem tempo até para um bom papo. Relaxante de tenções. Confidente de problemas. Trocador de consolos. Mas, pensando bem, não estão tristes os açougues sossegados? Desertas as ruas silenciosas? Semimortas as feiras tão
desanimadas?
Sim. A temporada terminou. Há mais sossego nas praias. Na cidade. Até no cais se trabalha sem receio de atropelar donos de narizes espetados, com encantamento, nas chaminés coloridas dos navios.
Santos voltou ao seu aspecto normal. Calmo. Pacato. Esse hiato, na nossa vida, é necessário. Toma-se fôlego. Descansa-se. Embora a trabalhar e a estudar. Mas, muito em segredo, confessemos com honestidade. Perdeu o seu ar de festa a cidade. Tudo,
agora, é coisa séria. Que pena!
Imagem: reprodução do álbum de recortes de Lydia Federici, no acervo da Hemeroteca Municipal
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