GENTE E COISAS DA CIDADE Baile da orla
Lydia Federici
No Gonzaga, há dias, em pleno passeio, brotou uma coisa esquisita. Uma armação de alumínio. A correr do chão até uma
janela do saguão do Sírio-Libanês. No começo, ninguém sabia pra que iria servir tanto cano. Cruzado e recruzado. Parecia plataforma de lançamento de foguetes. Finalmente, uma larga faixa, de letras coloridas, desvendou o segredo. A armação passou a
ter nome. Nome que lhe explicava a finalidade. Era rampa de ingresso. Passarela ao mesmo tempo. Mas pra quê?
Carnaval, no Brasil, não é assunto que se discuta. É, apenas, folia que se brinca. Ou não. Mas que é coisa importante, é. Santos,s endo brasileira, é carnavalesca durante o tríduo de Momo. Séria e trabalhadora durante todo o ano, carregada de lutas
e de problemas, salva seu equilíbrio esbaldando-se, com despreocupação, na alegria do carnaval. O interessante é que essa alegria, a princípio despretensiosa, tanto influenciou o desejo de alegria de gentes de fora que o carnaval santista passou a
ser promoção turística. Isso é importante: Se não fosse, porr que Recife se empenha em divulgar seu alucinante carnaval de frevo? Por que o Rio convida turistas estrangeiros? Enfiando-os, a muque, e a peso de ouro, no baile do Municipal?
Acontece que carnaval é brincado nas ruas. E pulado nos salões. Em matéria de carnaval a céu aberto, Santos estava bem servida. Tinha as avenidas da praia para o corso. E, principalmente, a tradição do desfile de dona Dorotéa. Ímã cuja força
ninguém desconhece. Embora não a explique. E o carnaval de salão? Ora. Havia os bailes dos clubes sociais e esportivos. Grandes. Pequenos. Aqueles das associações de sedes suntuosas. Ou humilde. Servindo às alegrias servidas por bolsas gordas. Ou
magras. Faltava, porém, um baile oficial. Um que pudesse ser o máximo. Veio, então, o Baile Oficial da Orla.
Ora. Baile é baile. Sendo oficial, muito mais baile é. Função a que, todos os que podem, comparecem. Para ver algo que valha a pena. Para brincar o fino. Regalar-se, a gosto, com o que de melhor haverá no carnaval.
Não é coisas pública, então? Pública é. Basta providenciar o ingresso. "Smoking" ou fantasia. O povo, então, fica de fora? Em geral, sim. Mas Santos, nesse particular, pensou nos que, sem possibilidades, ficariam sem tomar parte na iniciativa. E
deu, a todos, uma participação na riqueza de seu Baile. A participação visual na beleza das fantasias ricas que enfeitarão, ao vivo, os salões do Sírio-Libanês.
Para isso colocou, sobre o passeio do Gonzaga, a rampa de ingresso. Ali estendeu a passarela para os concorrentes ao concurso de fantasias. Isso todos poderão ver. O desfile será público. Será para o povo. Exatamente a mesma chance que ele terá ao
se portar, no Boqueirão, para ver a dona Dorotéa, terá ali para o desfile das fantasias de luxo.
Vai ser pequeno o Gonzaga na noite de amanhã. Quantas mil pessoas, de olhos arregalados, conseguirão espremer-se na primeira quadra da Ana Costa?

Imagem: reprodução do álbum de recortes de Lydia Federici, no acervo da Hemeroteca Municipal
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