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CULTURA/ESPORTE NA BAIXADA SANTISTA - LYDIA
Lydia Federici (4 - crônica 322)
Em mais de três décadas de atuação diária, Lydia Federici publicou milhares de crônicas no jornal santista A Tribuna. A Hemeroteca Pública Municipal de Santos criou um Espaço Lydia Federici, onde estão
expostos desde sua máquina de escrever até os troféus desportivos, bem como os organizados álbuns de recortes reunindo todos os seus textos publicados. Esta crônica foi publicada em 25 de janeiro de 1963 em A Tribuna (ortografia atualizada nesta
transcrição):
GENTE E COISAS DA CIDADE Quaresmeiras em flor
Lydia Federici
O ano passado foi o ano dos "flamboyants". Nem há dúvida que foi. Por todo canto da cidade, houve incêndios florais.
Alguns, amarelos. Vermelhos, quase todos. Que a gente de Santos dá preferência à alegria da cor rubra. Não havia jeito de não reparar. Até os precavidos e os desanimados, gente que nunca olha para o alto, foram obrigados a reconhecer, a muque, a
existência das flores. Que elas, vivido o seu dia de glória, atapetavam o chão sombreado.
Mas isso, ai, foi no ano passado. Exatamente por esta época, neste 63, que mal principiou a correr, é inútil perscrutar o ar. Contra o azul ou o cinza do céu, só se balança o verde tenro das copas mimosas. Flor? Não nasceu. Nem nascerá. Que o tempo
da floração já passou. Só um ou outro grupo de flor, mirrado, muito mirrado, escondeu a vergonha de sua pobreza entre a sombra dos galhos folhudos.
As acácias, nesta primavera e começo de verão, também foram mesquinhas. As cor de ouro ainda derramaram algumas pencas. Mas fracas. Até o amarelo era aguado. As outras, as que cobrem de rosa o tronco escuro e nu das árvores, mal e mal demonstraram
um pouco de boa vontade.
Que houve com essas árvores? Pertencerão elas a alguma classe vegetal que, tomando o exemplo dos homens, também resolveu fazer a sua greve? É bem possível. A natureza tem seus direitos, como não? Por que não haveria de tê-los? A greve dos
"flamboyants" e das acácias não foi de reivindicações. Foi greve de protesto. Protesto contra o rigor do inverno. Protesto contra a prolongada vigência do frio. Protesto, principalmente, contra a quantidade de dias cinzentos. Curtos. Com pouca luz.
Sem nenhum sol.
De qualquer forma, as flores que não enfeitaram o céu de Santos decepcionaram os amantes da natureza. Foi mais uma das tantas desilusões que, ultimamente, deram de infernizar a vida dos pobres santistas. Que fazer? É suportar mais essa tristeza. A
triste tristeza da falta de alegria da mãe-natura. Penem mais essa dor, olhos e almas poéticas!
Em todo caso, umas árvorezinhas desengraçadas, de folhas feias e escuras, estão salvando a falta de cor dos céus de Santos. Pena que haja tão poucas. E só em jardins particulares. Elas não aderiram à greve de suas companheiras. Estão tão exageradas
na prodigalidade da floração que todas as tonalidades do roxo procuram cobrir a deficiência do vermelho e do amarelo. Já nem são mais plantas. São colchas coloridas. Do rosa sulferino ao roxo profundo. Passando por toda a suavidade da gama lilás.
Sim. Observem o exagero das quaresmeiras. Dos jacatirões. Dos manacás. Nem sei como aguentam a carga de tanta cor. Deus que abençoe a boa vontade dessas arvorezinhas esquecidas. Tão pouco valorizadas no modernismo dos jardins atuais.
Imagem: reprodução do álbum de recortes de Lydia Federici, no acervo da Hemeroteca Municipal
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