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CULTURA/ESPORTE NA BAIXADA SANTISTA - LYDIA
Lydia Federici (4 - crônica 320)
Em mais de três décadas de atuação diária, Lydia Federici publicou milhares de crônicas no jornal santista A Tribuna. A Hemeroteca Pública Municipal de Santos criou um Espaço Lydia Federici, onde estão
expostos desde sua máquina de escrever até os troféus desportivos, bem como os organizados álbuns de recortes reunindo todos os seus textos publicados. Esta crônica foi publicada em 23 de janeiro de 1963 em A Tribuna (ortografia atualizada nesta
transcrição):
GENTE E COISAS DA CIDADE Padre Drummond
Lydia Federici
Lá no José Menino, perto do túnel que os trens da Sorocabana enchem de fumaça, há uma gruta. Bem no sopé do morro. Não
é uma gruta grande, grande. É mais um pequenino recôncavo. Fresco. Convidativo. Contra o escuro do morro é uma mancha luminosa. Um claro recanto de fé. Nossa Senhora de Lourdes é que a ilumina. De uma luz muito doce. Calma. Encorajadora. Até os
indiferentes são tocados pela beleza de sua simplicidade.
Quem a fez? Foi o povo. Quem guiou o povo? O entusiasmo de um homem magro. Velhinho já. Cansado mas carregado de fé. Fé que não lhe pesa nos ombros.
Lá na Ponta da Praia, no início do jardim que abraça de verde toda a areia clara da orla, há, em bronze, a figura mirrada do padre Anchieta. Está de frente para o mar. De onde, há quatro séculos, ele veio. Junto aos pés do sacerdote, um índio,
ajoelhado, encosta na terra o arco e a flecha de combate. Um pouco além, uma onça, deitada com preguiça felina sobre uma pedra, também se entrega ao fascínio da voz do evangelizador.
Quem fez aquele grupo lembrador dos começos de nossa história? Foi o povo. Quem levou o povo a unir-se? Foi um homem que acreditou na bondade. Que dentro dela sempre viveu. Fazendo o bem. Sendo um bom. Pregando. Agindo de acordo.
Lá no cais, apanhando chuva como seus trabalhadores, com eles sofrendo o calor do verão, tendo sempre diante dos olhos as paredes lisas e sujas dos grandes armazéns, há, humilde e silenciosa, a imagem de outra Nossa |Senhora. A de Fátima. Tão cara
aos corações de centenas de portugueses. Portugueses de largos peitos peludos que, com a força de seus músculos, ajudaram a construir a grandeza desta terra. É uma imagem pequenina e doce. Sempre sorridente. Que sorri para brancos e pretos. Para os
que a olham. Com fé. Como para os que passam sem cumprimentá-la. Indiferentes até à ternura de seu sorriso de Mãe. Mãe igual para todos os filhos. Reconhecidos. Ou ingratos.
Quem ali construiu o monumento? O povo. O povo do cais. Levado a essa obra por um homem que nunca teve receio de falar a outros homens. Mesmo aos descrentes. Aos sem fé. Não foram, porém, suas palavras que conseguiram essa consagração. Que falar,
qualquer um que tenha língua, fala. Foram os exemplos, foi a coragem, foi a bondade, foi a fé de um homem, suas ações que levaram os homens do cais a crer, e a confiar em Deus.
Sim. Foi um só e mesmo homem quem levou o povo de Santos a concretizar sua fé. O padre Drummond. Nessas e em outras iniciativas.
Ora. Hoje, afastado de Santos, padre Drummond aniversaria. Nos vinte anos em que serviu esta cidade e sua gente, muitas obras realizou o bom jesuíta. As acima citadas, na verdade, pouco dizem de seu trabalho de apostolado em prol do bem. O melhor
de sua vida não está na pedra. Não está no bronze. Nem se estampa na beleza das figuras imóveis. O bem que padre Drummond fez está vivo. Pulsando nos corações de seus amigos. Eles todos, hoje, pensarão com muito carinho no velho sacerdote de Deus.
Imagem: reprodução do álbum de recortes de Lydia Federici, no acervo da Hemeroteca Municipal
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