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CULTURA/ESPORTE NA BAIXADA SANTISTA - LYDIA
Lydia Federici (4 - crônica 306)

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Clique na imagem para voltar ao índice desta seçãoEm mais de três décadas de atuação diária, Lydia Federici publicou milhares de crônicas no jornal santista A Tribuna. A Hemeroteca Pública Municipal de Santos criou um Espaço Lydia Federici, onde estão expostos desde sua máquina de escrever até os troféus desportivos, bem como os organizados álbuns de recortes reunindo todos os seus textos publicados. Esta crônica foi publicada em 5 de janeiro de 1963 em A Tribuna (ortografia atualizada nesta transcrição):
 
GENTE E COISAS DA CIDADE

O importante é ir

Lydia Federici

Há uma espécie de desencanto quando se pensa no dia da próxima votação. Ninguém está indo com a cara do plebiscito. Porque foi coisa mal lançada. Coisa empurrada a muque. Que ninguém teve o trabalho de adoçar. Cujo resultado, como dizem os que entendem de política, em nada ou muito pouco alterará o que anda por aí.

Fale em plebiscito. Repare no que todos dizem. Ou na careta que substitui, com vantagem, o que nem todos querem dizer.

Acontece, porém, que vamos ter que fazer uma cruz. Ai! É justamente com essa cruz, tão rápida e tão simples, que todos embirram. Brasileiro está farto de cruz. Chega-lhe a que carrega. Falar em cruz é lembrar-lhe o sofrimento por que passa. Daí a ojeriza por esses dois riscos cruzados.

Se, desde o começo, psicologicamente, tivessem dito para desenhar um "x", talvez a coisa fosse vista com um pouco mais de simpatia. Se bem que "X" lembre problema. A incógnita de um problema. E, de problemas, aí novamente, nossa gente está super carregada. De qualquer forma, o importante é ir. Ir votar. Assinalar o quadro do "sim" ou do "não".

O caso é que o dia do plebiscito cai num domingo. Poderia cair num feriado. O que viria a dar no mesmo. Seria sempre num dia de folga. Ora. Dia de folga é dia de folga. Pela manhã, havendo sol, o programa é praia. principalmente com esta ânsia em que uma longa temporada de chuva nos deixou. Se chover, o problema é caseiro. Há torneiras a pingar. Enfeites de Natal a guardar. Automóveis de pilha com que ainda não arranjamos tempo para brincar.

Pela tarde, há a soneca costumeira. Um pouco de televisão. Chocha, aliás. Sem futebol. Mas sempre há "videotapes". E fitas antigas. Será que o gol foi mesmo em impedimento?

Como interromper esse programa? Vestir-se, esperar condução. Tomar o bonde. Votar. Esperar condução. Tomar ônibus. Uma hora e meia gasta só para, fazendo dois riscos num segundo, nem ter a sensação de que se está votando? Escolher um nome, votar num amigo, tentar eleger um bom político é coisa que emociona. Que dá prazer. Mas assinalar um "sim". Ou um "não". Que promessas nos garantem essas palavras?

Bem. E que promessas nos garantem um José, um João ou um Manoel?

A crônica, até este pedaço, é, embora não o pareça, um arranjo de opiniões. Catadas aqui e ali. Entre moços e senhores respeitáveis. Entre brotos bonitos, senhoras distintas e velhinhas simpáticas. Entraram também os eternos resmungões. Para dar-lhe um pouco mais de saber. O resumo, desencantado, foi esse. Esse desinteresse trará, então, muitas abstenções? Ah" Aí é que está. As vinte e três pessoas camufladamente consultadas irão votar. Sem entusiasmo. Algumas por obrigação. Outras de "malas ganas". Mas irão. E afinal, o importante é ir. Não importa com que cara. Que risco sorridente ou mal-humorado tem o mesmo valor. Feliz ou infelizmente.


Imagem: reprodução do álbum de recortes de Lydia Federici, no acervo da Hemeroteca Municipal

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