GENTE E COISAS DA CIDADE Feliz Natal
Lydia Federici
Errei. Esta crônica devia ter sido feita há alguns dias. Numa hora de sossego. Muito quieta. Muito calma. Hora que
podia aparecer de dia. Com um sol gostoso a entrar pela janela. Dizendo que lá fora havia luz. Calor amigo. Promessas de paz. Ou num pedaço qualquer de uma noite tranquila. De céu sem lua mas salpicado de estrelas. De estrelas brilhantes. Que
piscam. E repiscam. Com ar maroto.
Nessa hora de sossego, pouco importando se ensolarada ou repleta de luzes, o marulho doce das ondas devia juntar-se à batida das teclas da máquina. Para que, do fundo do coração às pontas dos dedos,
todas as palavras pudessem ter, pelo menos como empréstimo, um pouco da música do mar. Levando também, de roldão, o calor gostoso do sol. A meiguice da noite.
Aí sim. Aí, neste canto, talvez pudesse aparecer uma crônica carregada, da primeira à última linha, de votos capazes de dizer algo de muito amigo. Bom. E caloroso.
Acontece, porém, que essa hora de sossego, se houve, não foi aproveitada. Quando muito, em momentos espremidos, fui lembrando coisas gentis que tinham que ser ditas na crônica de Natal. Deus! Neste atropelo final tudo aparece embaralhado. De mais a
mais, votos são desejados com antecedência. Não no dia. Ontem, véspera de Natal, não houve jornal. A segunda-feira atrapalhou-me os planos. Perdi o dia. Não encontrei a hora de sossego. Hoje já é Natal. Adeus crônica.
É uma pena. Uma pena porque devia haver, aqui, uma crônica de Natal. Bonita na sua forma de dizer ela não seria. Mas revelaria votos carinhosos. E levaria, a um grande Papai Noel que presenteia as cidades, os pedidos de corações santistas.
Pediria, por exemplo, que, não como presente apenas do dia festivo, mas pelo ano afora, este mar continuasse a cantar sua canção. Sua canção de vaivém. Que, sem esmorecer, nos ensina a lutar. Dia após dia. E que, depois, à noite, nos embala o sono.
Ninando-nos como a crianças.
Pediria que a praia continuasse, em sua curva graciosa, a ser sempre larga e plana. Para abrigar a alegria de nossos sonhos. Como a de nossos amigos de fora. Pediria que os jardins continuassem a dar-nos a esperança de seu verde viçoso. O colorido
alegre de suas flores.
Pediria que, cada vez mais, as luzes que iluminam as noites santistas continuassem a espalhar-se para os lados. Para o alto. Inclusive, como num presépio, serpeado pelos morros. Que os morros, entre o verde, tivessem janelas bem largas. Das quais,
os pobres que sobem pelos terrenos mais baratos, pudessem, como riqueza, ter a beleza da cidade que cresce. E receber, a cada instante, a mensagem azulada do mar. Plena de força. De paz. De tranquilidade.
Sim. Dê isso tudo a esta cidade, Papai Noel, bom velho, amigo de Deus. E diga a esse Deus que Lhe agradecemos os olhos que nos deu. Os ouvidos capazes de ouvir a canção do mar. O olfato que, desviando-se do cheiro do asfalto, ainda sabe aspirar o
perfume da natureza. E, principalmente, por nos ter dado lábios que sabem sorrir. E dizer aos amigos conhecidos e desconhecidos:
Feliz, feliz Natal.
Imagem: reprodução do álbum de recortes de Lydia Federici, no acervo da Hemeroteca Municipal
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