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CULTURA/ESPORTE NA BAIXADA SANTISTA - LYDIA
Lydia Federici (4 - crônica 298)

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Clique na imagem para voltar ao índice desta seçãoEm mais de três décadas de atuação diária, Lydia Federici publicou milhares de crônicas no jornal santista A Tribuna. A Hemeroteca Pública Municipal de Santos criou um Espaço Lydia Federici, onde estão expostos desde sua máquina de escrever até os troféus desportivos, bem como os organizados álbuns de recortes reunindo todos os seus textos publicados. Esta crônica foi publicada em 23 de dezembro de 1962 em A Tribuna (ortografia atualizada nesta transcrição):
 
GENTE E COISAS DA CIDADE

Bairro Feliz

Lydia Federici

A Sociedade Amigos do Bairro reuniu-se. Na verdade, nem havia necessidade de uma reunião especial. Que os Amigos estão sempre juntos. Encontram-se todas as noites. Na última quadra da rua iluminada a neon. Fazem ponto na livraria. Onde folheiam livros. No bar. Onde acabam a noite tomando café.

Para dar um cunho oficial às resoluções, foi preparada a reunião. Convocados todos os membros da diretoria. Resolveram, então, oficialmente, o que já estava mais do que decidido, estudado e planejado.

E assim sai a notícia. A Sociedade faria o Natal dos pobres do bairro. Distribuindo alimentos às famílias que se inscrevessem. Dando brinquedos e balas às crianças. Ao mesmo tempo em que abria as inscrições para os necessitados, convidava o comércio e os moradores do bairro a colaborarem na campanha.

Ora. Culpem os santistas de tudo que quiserem. Mas de falta de caridade não. A gente do bairro não podia ser exceção. Donativos constituíram uma chuva meio inverno, meio verão. Persistente, durável, como chuvisqueiro de frio. Pródiga e farta como aguaceiro de calor. Durante dias, eram coisas e mais coisas a chegar. Não desmentiram a regra os moradores do bairro. Nem moradores, nem comerciantes, Deus que os abençoe.

Se o depósito improvisado foi ficando abarrotado, o mesmo não aconteceu com a lista de inscritos. Se o primeiro estufava, a segunda estava uma miséria. Nem vinte inscrições foram feitas. E dessas, quase todas eram de gente de outras zonas. O que contrariava, frontalmente, as resoluções tomadas.

Os Amigos coçavam a cabeça. Será que no bairro não havia gente que precisasse de auxílio? Mormente nesta época de aperturas? Num Natal tão absurdamente caro quanto o deste ano?

A alegria de constatar essa autossuficiência era, entretanto, anuviada por um problema muito sério. A pilha de donativos continuava a crescer. Dia e noite. E, verificadas as inscrições, deduzidas as irregularidades, feitas as sindicâncias, apenas duas famílias residentes no bairro necessitavam realmente de algo que lhes melhorasse o Natal. E daí? Que fazer com a doçura do açúcar, o ouro do macarrão, a brancura do leite em pó? Com as roupas? Os sapatos? Os brinquedos todos?

Os Amigos, atrapalhados, consultaram-se. Surgiu a ideia salvadora. Se o bairro não tinha pobres, contava, porém, dentro de seus limites, com três casas de caridade. Foi assim que a Casa de Estar, o Educandário Santista, a Escola Maria Imaculada, receberam, para suas crianças, mais alguns presentes de Natal.

***

Nas vésperas de Natal, a gente sonha. Deseja coisas. Faz pedidos.

Que, num fim de ano muito próximo, todos os bairros de Santos sejam como o Boqueirão. Bairro feliz. Bairro que não teve pobres a quem auxiliar. Do fundo do coração, que assim seja, meu Deus.


Imagem: reprodução do álbum de recortes de Lydia Federici, no acervo da Hemeroteca Municipal

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