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CULTURA/ESPORTE NA BAIXADA SANTISTA - LYDIA
Lydia Federici (4 - crônica 280)
Em mais de três décadas de atuação diária, Lydia Federici publicou milhares de crônicas no jornal santista A Tribuna. A Hemeroteca
Pública Municipal de Santos criou um Espaço Lydia Federici, onde estão expostos desde sua máquina de escrever até os troféus desportivos, bem como os organizados álbuns de recortes reunindo todos os seus textos publicados. Esta crônica foi publicada em
1º de dezembro de 1962 em A Tribuna (ortografia atualizada nesta transcrição):
GENTE E COISAS DA CIDADE Campanhas de Natal
Lydia Federici
Dezembro chegou. Chegou depois de 11 meses de um ano de lutas. De incertezas. De dúvidas. Tão carregado de preocupações
de toda ordem que, quem tem o mau hábito de pensar, belisca o braço. Com força. Para ver se está acordado. Perfeitamente inteiro. E fora de uma clínica de repouso. Porque, com toda a franqueza, aguentar o que aguentamos, sem ter enlouquecido, é
graça divina. É prova de fortaleza humana. ou, então, desculpem-me, sinal de casca dura. Impermeável. Verdadeiro couro de paquiderme.
Mas Dezembro chegou. Estamos no primeiro dia do mês de Natal. De um Natal que nos torna melhores. Que, inexplicavelmente, nos põe alegria no coração. Leveza na alma. E vontade de dar.
Falando em vontade de dar, falei mal. Nesta terra de caridade, não há vontade de dar. O que existe é coisa muito melhor. É a alegria de dar. Vai daí essa inquietude de mãos que trabalham. Essa correria de gente que procura donativos. Que passa
rifas. Que organiza, para os pobres, nos asilos, nos hospitais, na cadeia, nos sindicatos, nas empresas, na redondeza de suas casas, a festa de Natal.
Santos inteira, já antes da chegada de dezembro, é uma imensa campanha. Quem tem dois tostões, dois tostões de sobra, gasta-os no Natal. No seu Natal. No Natal dos menos afortunados. Porque Natal é festa de amor. De um amor bom. E este tipo de amor
não é egoísta. Só se satisfaz dando.
Inventam-se mil modos para conseguir coisas para a festa de Natal. Todas dão certo. Umas com maior sucesso. Outras, logicamente, com resultado menor. O caso é que, seja qual for a campanha, nenhuma dá em zero. Gente caridosa, gente mão aberta, está
aqui. Neste pedaço de chão brasileiro. Que se orgulha, sem bazófia, de ensinar à Pátria, a Caridade e a Liberdade.
Mas, nessas campanhas, sempre acontecem coisas. Coisas, assim, meio fora do programa.
As "Ancilas" do Embaré, por exemplo, fazem anualmente a campanha da lataria. Num domingo, durante as missas, o vigário, do púlpito, lembrou aos fieis que a União já estava recebendo latas para a campanha do Natal. Podiam ser entregues, diretamente,
na sede. Logo ali, ao lado da igreja.
Pois muito bem. Na manhã da segunda-feira, cedo ainda, uma senhora levou à sede, muito bem embrulhadas, um pacote de latas. Eram quatro, explicou ela. Mais tarde, arranjaria mais. A zeladora pegou o embrulho. Não pesava nada. As latas estavam
vazias! Olhou para a senhora que se afastava. Será que ela estaria a "mangar" de coisa tão séria? Seria possível? Mas não disse nada. Mesmo que o quisesse fazer, não o conseguiria. Estava atarantada com tanto cinismo. Imaginem só. Que é que pobre
faz com uma lata vazia:
No domingo seguinte, o vigário tornou a falar da campanha da lataria. Foi bem explícito dessa vez. Contou o engano havido. Solicitava, a quem pudesse cooperar, o envio de latas fechadas. Cheias de alimento.
Por isso ou por aquilo, aquele Natal foi uma chuva de latas. Cheias!
Imagem: reprodução do álbum de recortes de Lydia Federici, no acervo da Hemeroteca Municipal
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