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CULTURA/ESPORTE NA BAIXADA SANTISTA - LYDIA
Lydia Federici (4 - crônica 251)

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Clique na imagem para voltar ao índice desta seçãoEm mais de três décadas de atuação diária, Lydia Federici publicou milhares de crônicas no jornal santista A Tribuna. A Hemeroteca Pública Municipal de Santos criou um Espaço Lydia Federici, onde estão expostos desde sua máquina de escrever até os troféus desportivos, bem como os organizados álbuns de recortes reunindo todos os seus textos publicados. Esta crônica foi publicada em 26 de outubro de 1962 em A Tribuna (ortografia atualizada nesta transcrição):
 
GENTE E COISAS DA CIDADE

Novo amor?

Lydia Federici

Se havia marido de que esposa alguma se poderia queixar era aquele. Equilibrado. Trabalhador. Caseiro. Em matéria de vícios, tinha um. Fumava. E, a julgá-lo com excessivo rigor, tinha outro também. Bebia. Mas com moderação. E só aos domingos. Se vício fosse, era um vício hebdomadário. Quanto Ao resto, perfeito. Inclusive como pai.

Mas, há coisa de um ano, uma vez por semana, à noite, ele começou a sair. Dizia que ia ao clube. Arejar um pouco. Conversar com uns amigos. Nunca a convidou para as escapadas. Também não a proibiu de acompanhá-lo. Sabendo que, de fato, ele ia ao clube, ela não ligou. Se ele era um bom marido, ela, por sua vez, fazia questão de mostrar-se esposa compreensiva. E a vida de casa continuou em paz.

Continuou em paz até o momento em que, por isto ou por aquilo, ele tinha que ir ao clube. Quase todas as noites.

"Saiu hoje também? Abra os olhos, minha filha. Homem na idade dele sempre inventa modas. Aperte as rédeas. Aperte as rédeas. Loucura dá em qualquer um".

Ela tinha confiança no marido. Mas acabou ficando impressionada. Numa noite, quando o viu enfiar o paletó, disse-lhe que também estava com vontade de arejar um pouco. Acompanhá-lo-ia. Ele pestanejou. Começou a abotoar e a desabotoar o mesmo botão.

"Escute. Hoje não pode ser. Não vai haver nada que dê pra ver. Hoje é reunião da diretoria". Mas ele era da diretoria? Não. Não era. Mas é que todos teriam que dar sua opinião. Coisa importante. Até logo. Até logo.

E, aí, ela ficou na quase certeza de que havia coisa na vida do marido. Que atitude tomar? Pensou. Repensou. Lembrou-se do que dizia a avó. "Homem. Prende-se-o pelo estômago". Passou a caprichar na cozinha. Passou a cuidar-se mais.

E ele, nada. Engolia os pratos. Olhava-a, distraído. Sem perceber o penteado caprichado. continuava a trabalhar. A interessar-se pela educação e instrução dos filhos. Mas de uma forma diferente. Automaticamente. Sua alma voava por outros céus. Sim. Não havia dúvida possível. Embora não quisesse aceitar a ideia, a verdade estava ali. Devia haver amor novo na vida do marido. E aí? Que fazer? Largá-lo? Segurá-lo? Mas de que forma? O calvário começou.

Começou, continuou e iria longe se um dia, costurando um bolso de paletó, ela não descobrisse o que descobriu. Dessa descoberta surgiram as explicações. E tudo se esclareceu.

Claro que ela acertara. Ele tinha um novo amor, sim. Mas essa paixão não usava saias. Era uma bola. uma simples bola de madeira. Dessas usadas no jogo de bochas. Que é a nova paixão dos homens que passaram dos vinte e um.

Conto a história pelo seguinte. Como há dezenas de saldanhistas empenhados na construção de um ginásio para bochas, haverá, consequentemente, dezenas de esposas desconfiadas. Tirem a limpo as suas dúvidas. Se ele tiver, no bolso, um talão de rifas, podem ficar sossegadas. O amor é inocente.


Imagem: reprodução do álbum de recortes de Lydia Federici, no acervo da Hemeroteca Municipal

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