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CULTURA/ESPORTE NA BAIXADA SANTISTA - LYDIA
Lydia Federici (4 - crônica 248)

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Clique na imagem para voltar ao índice desta seçãoEm mais de três décadas de atuação diária, Lydia Federici publicou milhares de crônicas no jornal santista A Tribuna. A Hemeroteca Pública Municipal de Santos criou um Espaço Lydia Federici, onde estão expostos desde sua máquina de escrever até os troféus desportivos, bem como os organizados álbuns de recortes reunindo todos os seus textos publicados. Esta crônica foi publicada em 23 de outubro de 1962 em A Tribuna (ortografia atualizada nesta transcrição):
 
GENTE E COISAS DA CIDADE

Domingo de sol

Lydia Federici

Domingo é domingo. Dia de descanso. Dia de folga. Dia de programa diferente. É o dia que, na segunda e talvez na terça, é lembrado com saudade. E, de quarta a sábado, desejado com sofreguidão. Isso, indefectivelmente, durante as cinquenta e duas semanas do ano.

Ultimamente, então, espera-se o domingo com uma ansiedade quase que absurda. Porque o tempo nos ensinou que o sol, agora, só desce, até esta terra ensopada, num dia entre sete. Justamente aos domingos.

Daí a alegria esperançosa com que o santista, neste ultimo domingo, como nos dois anteriores, abre os olhos pela manhã. E busca o retângulo da janela. Há ouro nas frestas da veneziana? E, por causa dessa luz dourada, até os preguiçosos chutam as cobertas. E, ainda estremunhados, enfiam os olhos no jardim ou nas ruas ou nos telhados ensolarados.

"Está fazendo sol!", grita-se, com alegria de Natal.

"Está fazendo sol!", murmura-se, baixinho, numa oração agradecida.

E então é aproveitá-lo. Correr até ele. Mergulhar na sua luz. Em seu calor. As paredes ainda úmidas dos arranha-céus colorem-se de roupa. Varais de quintal vergam ao peso de lençóis e dúzias de camisas. Que dona de casa, antes de pensar em ir, toda airosa, até a missa, lembra-se da roupa por enxugar. Por arejar. Por desembolorar. Será pecado fazer esse trabalho aos domingos? Se for, até as mais conscienciosas pecaram. Deus que as perdoe. Mas como não aproveitar o sol?

Crianças, de sandalinhas úmidas e baldes de lata enferrujados, não se atrasam em sua caminhada para a praia. Ao contrário. Puxam os pais. Os avós são lerdos. Há quanto tempo estão fechadas num quarto? Numa sala? Num corredor comum, estreito e molhado. Onde, se saem para brincar, apanham resfriado e fiam com dor de garganta?

"Vamo, vozinho. Anda mais depressa. Dá a mão que a Leninha ajuda".

E, na praia, de ponta a ponta, é aquele enxame de abelhas humanas. Grandes e pequenas. A brincar com o sol e com tudo quanto o sol ilumina. A namorar o sol e tudo quanto o sol, namorador, namora. Há movimento. Há quietude. Fala-se e grita-se numa exteriorização de alegria. Fica-se em silêncio. A sentir a beleza redescoberta pelo ouro da luz.

As fisionomias carrancudas desapareceram. Todos sorriem. Olhos franzinos sumiram. Todos eles estão bem abertos. A esparramar brilho. O brilho que o sol lhes empresta. Desapareceram mágoas e queixas. Esqueceram-se problemas. Tudo está tão gostoso. Tão bonito. Até aquela vontade boba de mudar de terra, de ir procurar, em outras bandas, um canto ensolarado de chão, adquire um ar de coisa do passado. De coisa mal pensada. De ingratidão. E esse milagre brota apenas de um pouco de sol a iluminar o mar. Que chova. Que chova a semana toda. Mas que haja sempre, a fazer-nos reviver, um pouco de sol aos domingos.

Um domingo de sol chega-nos bem. E paga toda a chuva semanal.


Imagem: reprodução do álbum de recortes de Lydia Federici, no acervo da Hemeroteca Municipal

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