GENTE E COISAS DA CIDADE Em surdina
Lydia Federici
A história é bonita. Simples mas bonita. Profundamente humana. E dá o que pensar. Porque inicia algo de novo. Custou-me
consegui-la. "Elas" não querem cartaz. Trabalham em grupo. Por um ideal. Foi arrancada aos pedaços, a história. Sacarrolhada. Mas, no fundo, mais ou menos armada, é isto. Refere-se a um fato há pouco ocorrido em nossa cidade.
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"Fomos nós, sim. Eles precisavam de saber que estávamos com eles. Compreendendo o que haviam feito de bom. Agradecendo-lhes a dedicação. Não haviam cumprido mais que seu dever? É claro que sim. Mas
quem, hoje, cumpre sua obrigação sem, pelo menos, ficar amaldiçoando a sorte? Com alegria e bom humor? Por isso é que mereciam as nossas palmas. E foi o que nos propusemos fazer. Noticiaram, erradamente, que lhes daríamos dinheiro. Sim. Dinheiro é
coisa de que todos necessitam. Mas, certas coisas não podem ser pagas ou agradecidas em dinheiro. Perderiam sua significação. E então achamos que, a dar qualquer coisa sem utilidade, seria mais interessante saber o que eles preferiam.
"Foi duro descobrir. Mas sempre se abriram. Tão encabulados quanto nós, no fundo, também estávamos. Uns queriam um rádio-vitrola. Outros ficariam felizes com um bebedouro. E os terceiros gostariam de
ter a sua quadra de basquete iluminada. Se conseguimos isso tudo? Deu um nada de trabalho. Foi só correr o comércio. Pedir às associações de classe. Ninguém se negou. Se o nosso grupo é grande? Não. Era formado por dezoito senhoras. A que se
juntaram, depois, mai doze. Trinta, portanto. Número pequeno. Mas cheio de entusiasmo. E, nas horas livres, muito ativo. Eficiente".
"Numa bela manhã, as oito que estavam livres e que podiam comparecer foram fazer a entrega das lembranças. Tínhamos conseguido, de quebra, duas Bandeiras. Bonitas. Todas bordadas. Parecia-nos bem. Mas, na hora, percebemos que nunca havíamos feito
nada de semelhante. Não sabíamos como seríamos recebidas. Se a coragem nos abandonou? Não. Compreendidas ou não, iríamos até o fim. Você vê. Despertamos para uma causa. Não podemos abandoná-la.
"E, assim, com o coração meio apertado, fomos em frente. Num minuto, assim que pisamos no pátio, sentimo-nos em casa. Entre amigos. Eles estavam perfilados. Orgulhosos e duros nas suas fardas. Mas. A
simpatia, o calor que havia nos seus rostos tostados, derreteram nosso temor. Sentimo-nos unidos. Irmanados. Afinal, o ideal é o mesmo, não? Quando o comandante começou a falar, quando sentimos o calor bom que havia ali, quando vimos tremular a
Bandeira, que é tão deles quanto nossa, a que devemos tanto quanto eles, em amor e reverência, nosso coração começou a doer. Nem nos lembramos de enxugar as lágrimas que nos escorriam pelo rosto".
Neste ponto da história, lágrimas voltaram a assomar aos olhos da jovem senhora que, atarefada, distribuía revistas e folhetos na exposição do "Muro". Pertence ela à União Cívica Feminina. Guardem o nome. União Cívica Feminina.
Foi a união que, em nome do povo de Santos, numa cerimônia simples, teve a iniciativa de entregar ao Corpo de Bombeiros, à Guarda Civil e ao 6º B. C., a lembrança agradecida de nossa gente à gente que, com civismo, nos serviu.
Vocês sabiam? Passem a história adiante, por favor.
Imagem: reprodução do álbum de recortes de Lydia Federici, no acervo da Hemeroteca Municipal
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