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CULTURA/ESPORTE NA BAIXADA SANTISTA - LYDIA
Lydia Federici (4 - crônica 219)

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Clique na imagem para voltar ao índice desta seçãoEm mais de três décadas de atuação diária, Lydia Federici publicou milhares de crônicas no jornal santista A Tribuna. A Hemeroteca Pública Municipal de Santos criou um Espaço Lydia Federici, onde estão expostos desde sua máquina de escrever até os troféus desportivos, bem como os organizados álbuns de recortes reunindo todos os seus textos publicados. Esta crônica foi publicada em 18 de setembro de 1962 em A Tribuna (ortografia atualizada nesta transcrição):
 
GENTE E COISAS DA CIDADE

Chegou a nossa vez

Lydia Federici

O pessoal do S.M.T.C. entrara em greve. A cidade estava sem condução. Para quem apelar? Ora. Nem havia dúvida. Para aqueles que topam qualquer parada. Para os bombeiros da cidade. Para os homens simples que, nas horas livres, lá no quartel, à espera de um chamado, se comprazem em fazer rebrilhar os já polidos e brilhantes niquelados dos carros vermelhos. E que, solicitados, tanto se metem no meio do fogo como mergulham na água. Tanto afundam num bueiro como varejam um morro, abrindo picada. Para salvar quem se perdeu.

Bombeiro não é só o homem que lida com bombas d'água. Bombeiro é salva-vida. É o amigo desconhecido que nunca diz não. É o topa tudo das horas amargas. É o soldado da paz. A esperança. O resolvedor de casos complicados. É o escoteiro grande. Cujo lema é servir. Servir sempre.

Quando a cidade, portanto, ia parar, quem foi chamado para resolver o problema? O bombeiro. Largou o seu carro vermelho e aboletou-se no ônibus verde. Nos bondes grandes da cidade. Guiar um caminhão conhecido é uma coisa. Dirigir um ônibus chacoalhante, outra. Muito diferente. Principalmente durante horas seguidas. Parando em todos os pontos de um itinerário que, muitas vezes, ele desconhecia. Pegando e largando gente. Numa tensão nervosa enorme. Porque a responsabilidade era grande. Não poderia haver um segundo de relaxamento. De descuido.

Terminada sua tarefa, o bombeiro-motorneiro, o bombeiro-chofer, o bombeiro-cobrador, olhando as mãos vermelhas, coçando a perna adormecida, endireitando as costas doloridas, largava um suspiro de alívio. Ainda bem que o povo cooperava. Não demonstrava impaciência se o bonde parava um pouco além do ponto. Nem reclamava se o ônibus ia muito devagar. Ou pegava por uma rua errada. Ao contrário. Todo mundo ria. Ajudava. Compreendia. Boa gente, essa. É muito bom também saber que os homens da Força Pública e da Guarda Civil também estavam trabalhando com eles. Servindo como eles. Preocupados. Tensos nas manobras. Mas bem humorados. Ajudando com prazer. Com gentileza.

E quando o lixo ficou nas portas das casas, foram ainda os bombeiros os guardas que, atrapalhados, desajeitados, mas a rir, resolveram o problema.

"Puxa, seo Mané. Se a patroa, até o fim do ano, me botá camarão na mesa, não sei o que vai acontecê. Tô de camarão até aqui".

Sim! Se Santos saiu dessa, da forma porque saiu, é que Deus, por uns dias, largou a sua cidadania baiana. E virou santista. Virou santista e emprestou suas mãos a esses homens abnegados que se viraram no seu trabalho voluntário. Que exemplo nos deram os humildes bombeiros e praças da Força Pública e da Guarda Civil. Que exemplo de trabalho, de abnegação e de amor!

Ora! Amor com amor se paga. Devemos algo a esses homens. Muito justo o movimento que se iniciou para homenageá-los. Eles merecem a gratidão do santista. O carinho maior que todos, agradecidos, saberemos lhes tributar. Chegou a nossa vez de provar que sabemos cumprir nossa obrigação.


Imagem: reprodução do álbum de recortes de Lydia Federici, no acervo da Hemeroteca Municipal

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