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CULTURA/ESPORTE NA BAIXADA SANTISTA - LYDIA
Lydia Federici (4 - crônica 211)
Em mais de três décadas de atuação diária, Lydia Federici publicou milhares de crônicas no jornal santista A Tribuna. A Hemeroteca
Pública Municipal de Santos criou um Espaço Lydia Federici, onde estão expostos desde sua máquina de escrever até os troféus desportivos, bem como os organizados álbuns de recortes reunindo todos os seus textos publicados. Esta crônica foi publicada em
7 de setembro de 1962 em A Tribuna (ortografia atualizada nesta transcrição):
GENTE E COISAS DA CIDADE Sete de Setembro
Lydia Federici
Sete de Setembro é dia de festa. De festa cívica. Dia em que todo o Brasil comemora, com orgulho, a data de sua
independência.
Mais do que nunca se falará em patriotismo. Apelar-se-á para o patriotismo de cada brasileiro.
Sei, e você também, meu amigo, sabe, o que vai acontecer.
Em todo o território nacional, hoje, haverá paradas e desfiles. Militares, escolares, de clubes, operários. Todos sentirão orgulho em homenagear a pátria. Até em pequeninos núcleos, perdidos nas florestas, dispersos nas caatingas, plantados nos
pampas sulinos, haverá hasteamento de Bandeira. Quero crer que até nos piores fins de mundo, onde nunca, sequer, existiu um retângulo auriverde, um brasileiro cismarento há de, coçando a cabeça, olhar com um carinho especial para o pedacinho de
chão que ele conhece. E, a seu modo puro, ama de verdade. Embora uma amor triste.
Haverá inaugurações. Um milheiro de inaugurações. De coisas feitas. Terminadas pró-forma. A bofetão. Ou de coisas que ainda se pretendem fazer. E haverá dois milhões e meio de discursos. Talvez um pouco mais até. Porque brasileiro não entende festa
sem falatório.
Haverá, portanto, uma avalancha de discursos. Que dirão esses quilômetros de laudas ou de improvisos decorados? Coisas bonitas, sem dúvida alguma. Brasileiro é poeta. É cantador. Bom na falação. Junta quatro palavras cometendo três erros. Mas isso
não importa. Sempre dá para entender a ideia. E as ideias, poéticas todas, são bonitas. Lembram o vento da liberdade. O cicio das folhas das palmeiras altivas. O ouro que se afirma, pujante, inesgotável, no losango do pavilhão pátrio. A
predestinação cristã de um país em cujo céu um Cruzeiro do Sul serve de bússola. De exemplo. De estímulo. Sim! Haverá um mundo de imagens poéticas nos discursos que, hoje, perfumados de um passado glorioso, embalsamarão os ares de qualquer rincão
de terra brasileira.
E depois, quando o coração de cada um, comovido, derretido, desmilinguido de emoção, inchado de orgulho, estiver mole como papa, as vozes discurseiras, tonitruantes ou misteriosas, lançarão o seu apelo. Falarão da hora difícil que atravessamos.
Despertarão ecos de nacionalidade adormecida. Mandar-nos-ão vigiar. Estar prontos para a morte.
E por Deus! Durante meia hora, com o coração a bater forte, a gente abre a camisa e oferece o peito. Que venha o tiro! Que venha a carga de baioneta! Que venha a morte em holocausto à Pátria. Nossa Pátria merece o sacrifício! De uma e mil mortes.
Se mil vezes, por ela, pudéssemos morrer!
Acontece, porém, que pátria é mãe. E mãe alguma deseja a morte de um filho seu. Ao contrário. Deseja-lhe a vida. Uma vida forte. Longa. Feliz. Uma vida honesta e decente de progresso que possa, num amor de mil atos diários, engrandecê-la. Honrá-la.
Elevá-la. Dignificá-la. A morte seria a prova definitiva. Mas não a suprema. A suprema é a vida pelo bem desta terra. A luta comum e diária para servi-la.
Imagem: reprodução do álbum de recortes de Lydia Federici, no acervo da Hemeroteca Municipal
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