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CULTURA/ESPORTE NA BAIXADA SANTISTA - LYDIA
Lydia Federici (4 - crônica 159)
Em mais de três décadas de atuação diária, Lydia Federici publicou milhares de crônicas no jornal santista A Tribuna. A Hemeroteca
Pública Municipal de Santos criou um Espaço Lydia Federici, onde estão expostos desde sua máquina de escrever até os troféus desportivos, bem como os organizados álbuns de recortes reunindo todos os seus textos publicados. Esta crônica foi publicada em
7 de julho de 1962 em A Tribuna (ortografia atualizada nesta transcrição):
GENTE E COISAS DA CIDADE Bacalhau à moda do Porto
Lydia Federici
É fácil, à noite, chegar até a areia do Gonzaga. Mais fácil ainda procurar qualquer uma das barracas. E facílimo jantar
bem por pouco dinheiro. E depois de alegres e satisfeitos, é gostoso saber que o dinheiro, que lá se deixou, irá ajudar um nenê no Berçário da Santa Casa. Um aleijadinho da Casa da Criança. Uma cega. Um pescador. Um pobre do Embaré.
Isso é coisa que todo mundo faz. Coisa que todos conhecem. Mas o que muita gente ignora é como se prepara, em qualquer daquelas barracas, um lombo de porco, um peixe à capixaba, uma preta feijoada.
Quem cozinha? Como se arrumam os jantares?
A história é simples de contar.
Chega alguém, vê uma pessoa com jeito de alma boa. Fala de coisas à-toas. E depois pergunta:
"Você não quer ajudar a fazer um jantar? Olhe. Ainda não fizemos nada à moda de Portugal. Poderia ser uma bacalhoada, não? Vejamos. Para a noite do dia 9. Está bem?
E a pessoa que, além de ter todo o jeito, é, realmente, uma alma boa, diz que sim. Sozinha é que não pode aguentar o tranco. Então se lembra das amigas. Que também são, logicamente, almas boas. Estabelecem o cardápio. Noite portuguesa? Pois, pois.
Tem que começar com caldo verde. Um bom bacalhau à melhor moda do Porto. Arroz. Uma salada... uma salada de alface. Alfacinha de Lisboa. E uma sobremesa. Que mais tarde se verá.
Pega-se do lápis. Jantar para duzentas pessoas? Ora. Faça lá as contas. Quantos quilos de bacalhau? Virgem! Tanto assim? Será que conseguimos com os amigos alguns quilos de graça? Claro. Amigos cooperam. Não é obra de caridade? E vão as batatas.
Mais as cebolas. As cebolas em rodelas grossas, douradas. E os pimentões. E o cheiro verde. Ah! E o pão. Cortado em fatias. Frito no azeite. No, ái Jesus, cheiroso azeite português.
Arregaçam-se as mangas. "Deixem o caldo verde por conta de minha mãe". "E o arroz e a alfacinha comigo". "Procuremos o bacalhau". "E se arranjássemos uma guitarra? Um violão? E um fadista?" Já começaram a vender o jantar? Será que vai aparecer
gente? Quem vai enfeitar as mesas? Temos que enfeitá-las. Mesa sem enfeite não agrada.
À medida que o dia 9 vai chegando, o bacalhau à moda do Porto vai deixando as almas boas com os pés quebrados. De tanto andar. À procura de coisas. Vendendo o jantar. Só trezentos cruzeiros? Por isso tudo? E ainda sobremesa. Que outra alma boa
ofereceu. E não tem vinho? Tem. Mas, desculpe, o vinho é à parte.
Convida-se o cônsul. Convida-se o presidente do Centro Português. Tudo está encaminhado. Providenciado. Estabelecido. Só falta, na segunda-feira, quase morrer ao lado do forno. É assim que se trabalha. Para ajudar os necessitados.
Esquecia-me, quase. Isso tudo, na segunda-feira, na Barraca n. 13, da União Social Camiliana.
Imagem: reprodução do álbum de recortes de Lydia Federici, no acervo da Hemeroteca Municipal
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