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CULTURA/ESPORTE NA BAIXADA SANTISTA - LYDIA
Lydia Federici (4 - crônica 155)

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Clique na imagem para voltar ao índice desta seçãoEm mais de três décadas de atuação diária, Lydia Federici publicou milhares de crônicas no jornal santista A Tribuna. A Hemeroteca Pública Municipal de Santos criou um Espaço Lydia Federici, onde estão expostos desde sua máquina de escrever até os troféus desportivos, bem como os organizados álbuns de recortes reunindo todos os seus textos publicados. Esta crônica foi publicada em 3 de julho de 1962 em A Tribuna (ortografia atualizada nesta transcrição):
 
GENTE E COISAS DA CIDADE

Bom banho!

Lydia Federici

Chegaram de taxi à estação da avenida Ipiranga. Um ônibus pegava os seus primeiros passageiros para Santos. Enquanto ela, a mãe redondinha, vasculhava a bolsa grande, à procura da bolsa pequena onde guardava o dinheiro, o menino agarrou duas maletas e chegou, aos trancos, até o chofer de quepe verde. Era o da Ponta da Praia? Das três e meia?

"É este, mãe. Depressa. Ele já vai sair". Esganiçou-se, nervoso, e foi furando fila, as malas pequenas mas pesadas batendo-lhe nos joelhos e nas pernas dos outros passageiros. Um cotovelo distraído empurra o boné tapa-orelha sobre os olhos do garoto. Ele não liga. Está muito atrapalhado com o peso que carrega. Com o chofer que lhe pede a passagem. Com duas pernas tortas que, no primeiro degrau, imóveis, impedem a subida. Por sob a pala do boné, o menino, grudado nas malas, ergue a cabeça, procurando a mãe: "Depressa, mãezinha. Ele vai sair".

Aboletam-se, por fim, num banco. As maletas entre as pernas. Dois suspiros de alívio e dois sorrisos vitoriosos saúdam a proeza. Como tinham corrido. O menino endireita o boné. Uma mãe gorducha, de dedos curtos e unhas maltratadas, alisa-lhe, com ternura, os cabelos espetados. O garoto encosta a cabeça, por dois segundos, no ombro redondo da mãe. Sorriem-se, felizes. Nervosos, ainda. meio esbaforidos.

"Por que o 'óminibus' não sai? Assim não vai dar tempo de tomar banho".

"Não é 'óminibus' que se diz. É ônibus". A mãe corrige com paciência. Segura, com firmeza, o braço do menino que, agitado, balanceia o corpo. "não se 'abofe' assim, Zé Carlos. Ele sai na hora certa. Escute, meu filho. Você tomou o lanche na escola? Aposto que esqueceu". Vasculha a bolsa grande e tira uma maçã. Enorme. Lustrosa. O menino põe a mão sobre a boca. "Como é que vou comer: Se eu comer não posso tomar banho. Mas este omin... este 'óninibus' não vai s'imbora?"

O ônibus sai. Mãe e filho dividem a mação. Ela dando dentadas pequenas. O menino olha a estrada. Em tudo vê mar. Ou coisa parecida com mar. Remexe-se no banco. Bate as mãos para apressar a viagem. Por que o chofer não corre mais? Quanto tempo ainda falta? Vão chegar de dia? Está fazendo calor, não está? Será que a 'nonn' fez o 'short' novo que prometeu em dezembro? "Mas ó, mãe". Puxa para baixo o cinto das calças. "Eu banquei o sabido. Estou com o velho aqui por baixo".

E ri. E riem os dois, ela com os dedos gordos, puxando-lhe, carinhosamente, a orelha vermelha. Foi aí que a senhora percebeu que o menino estava quente. Muito quente. Quis apalpar-lhe a testa. O garoto percebe a intenção da mãe subitamente nervosa. Era só o que faltava. Perder o seu banho de mar por causa de uma febre muito micha! Isso é que nunca. E até aqui embaixo, ele, apavorado, a rir, foi tirando o corpo, desviando a cabeça.

É assim, nessa paixão pelo mar, com essa fome de mar, que descem os nossos visitantes. Bom banho, amigos!


Imagem: reprodução do álbum de recortes de Lydia Federici, no acervo da Hemeroteca Municipal

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