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CULTURA/ESPORTE NA BAIXADA SANTISTA - LYDIA
Lydia Federici (4 - crônica 149)

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Clique na imagem para voltar ao índice desta seçãoEm mais de três décadas de atuação diária, Lydia Federici publicou milhares de crônicas no jornal santista A Tribuna. A Hemeroteca Pública Municipal de Santos criou um Espaço Lydia Federici, onde estão expostos desde sua máquina de escrever até os troféus desportivos, bem como os organizados álbuns de recortes reunindo todos os seus textos publicados. Esta crônica foi publicada em 24 de junho de 1962 em A Tribuna (ortografia atualizada nesta transcrição):
 
GENTE E COISAS DA CIDADE

Fiau, urubus

Lydia Federici

Que é que vai adiantar a gente espernear? Progresso é isso. Fomos descobertos. Agora é aguentar. Rezar para que a inteligência artística do homem se manifeste.

O destino de Santos vai ser esse. Cobrir-se de obras humanas. Que pensam vocês que vai acontecer com os morros que circundam a ilha em que moramos? É só inventarem que é chique morar em morro e pronto. Mesmo porque, onde é que tanta gente vai poder morar? O chão está acabando. É subir. É subir.

Mas que é que vão fazer na Urubuqueçaba?

Ué. O que fizeram na Ilha das Palmas. O que fazem na Porchat. E daí? Quem protesta contra as belezas do Clube de Pesca? Só os invejosos. E quem não gosta de dar sua volta pela estrada da Ilha Porchat? Só os que nunca se atreveram a ir lá.

É possível, segundo afirma Cláudio Doneux, pensando no Parque Balneário que um dia acabará desaparecendo, que a ilha venha a abrigar um hotel. Vão levantar uma caixa de fósforos, um paredão cheio de olhos quadrados, na verdura agreste da ilha?

Parece que não vai ser assim. Haverá um concurso entre os arquitetos do Brasil. Oscar Niemeyer e Lúcio Costa serão convidados a vir a Santos. Para perceber o encantamento daquele penacho verde que se levanta no mar, junto à praia bonita do José Menino. Bonita e já mutilada, digamos de passagem. Só então, embriagados pela poesia daquele recanto, é que pegarão no lápis. Esconderão ou confundirão a obra humana sob o verde viçoso onde se abrigam os urubus. Paredes parecerão rochas. E inteligentemente, com pinceladas artísticas, formarão uma teia colorida capaz de dar maior destaque à silhueta uniformemente verde da ilha. Urubuqueçaba será, então, um recanto de conforto e de encantamento. Sem perda de suas características atuais.

Não sei como isso será conseguido. Que o homem é inteligente, sabemos de sobra. Que são práticos, também. Que, entre eles, sobram artistas, é ponto pacífico. Que se reúnam, no projeto de urbanização da ilha, todas essas qualidades humanas, é o que esperamos. Com certo receio. Mas muita esperança.

"Antes de mexer na ilha, conheceremos as realizações balneárias de Miami. Teremos, assim, material de sobra para fazer algo digno do progresso de Santos. A Urubuqueçaba urbanizada será um dos pontos de atração turística. Em lugar de encantar-nos, apensas os olhos distantes, servir-nos-á de forma completa".

Mas, e pra chegar até a ilha? O problema principal será esse. Uma ponte? Um paredão que corte a praia? Como o da Ilha Porchat? Sim. Mas algo diferente. Uma solução de arte. Será que a engenhosidades e o bom gosto humanos conseguirão aliar aos cálculos matemáticos a inspiração poética/ Se a ponte tiver a forma e a beleza de asas de gaivota, aceitaremos o milagre. Uma coisa é certa. Algo, num dia, virá. Para desalojar os urubus. E servir ao homem. Fiau, urubus. A sua Urubuqueçaba vai virar lenda.


Imagem: reprodução do álbum de recortes de Lydia Federici, no acervo da Hemeroteca Municipal

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