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CULTURA/ESPORTE NA BAIXADA SANTISTA - LYDIA
Lydia Federici (4 - crônica 131)

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Clique na imagem para voltar ao índice desta seçãoEm mais de três décadas de atuação diária, Lydia Federici publicou milhares de crônicas no jornal santista A Tribuna. A Hemeroteca Pública Municipal de Santos criou um Espaço Lydia Federici, onde estão expostos desde sua máquina de escrever até os troféus desportivos, bem como os organizados álbuns de recortes reunindo todos os seus textos publicados. Esta crônica foi publicada em 2 de junho de 1962 em A Tribuna (ortografia atualizada nesta transcrição):
 
GENTE E COISAS DA CIDADE

Junho

Lydia Federici

Maio veio e foi embora. Sem parecer maio. Sem ter quase nada de maio, o grande ingrato. Não importa. Outros maios virão.

Agora é a vez de junho mostrar suas festas. Não quero lembrar à natureza a sua obrigação natural de apresentar-nos um junho decentemente trajado. Coberto de frio. Amanhecendo branco. Com uma neblina que o sol custa a evaporar. Adormecendo num cobertor azul, salpicado de estrelas. Junho que venha do jeito que, pela natureza, quiser vir. Parecendo junho. Ou não.

Bonito, em junho, é o que o homem, dentro dele, de seus trinta dias, colocou: a festa de Santo Antonio casamenteiro, as fogueiras de São João, a homenagem dos homens do mar ao seu santo padroeiro, o sempre invocado São Pedro dos pescadores. Isso, neste mês, é que tem que acontecer. Que o santista fará acontecer.

Não haverá balões enlanternados a subir. A correr para o mar. A segurança matou essa tradição. Não importa. Haverá a lembrança gostosa de valas puladas, terrenos invadidos, balões tascados. Ou gloriosamente salvos da sanha da meninada.

Ficou para trás, também, a possibilidade da fogueira na rua. Ou no terreno vizinho. Com a vizinhança reunida. Os meninos providenciando lenha, as meninas enfeitando chapéus de palha. Mães fazendo bolos de fubá. Pais escolhendo batata doce e cozinhando pinhão. Em que rua, hoje, se poderia fazer isso? Quem ainda tem terreno baldio que empreste para o arraial?

Também não haverá festa na casa de seu Jorge. Com o porão grande enfeitado de bandeirolas. Folhas de palmeira a cobrir as paredes. Alegria friorenta chegando para encontrar a alegria quente, cheirando a canela, dos caipiras lá reunidos. Onde a quadrilha que todos dançavam? A valsa que todos valsavam? A modinha que todos cantavam? Em que apartamento, hoje, se poderia fazer isso?

Mas, apesar das modificações, junho, hoje, em Santos, ainda é o mês gostoso das noites brasileiras de São João. Ainda se toma quentão. Nas barracas do Gonzaga. Dança-se ainda a quadrilha. Nos salões dos clubes. Ainda se faz uma fogueira. De mentira. Dentro de casa. Com papel vermelho, numa pira, a esconder uma lâmpada de 100 velas. Sim. Mas o quentão não é feito pelo Orlando. A quadrilha não é para todos. A fogueirinha não dança a sua dança do fogo. Nem assa a batata de mel. Nem esquenta as mãos. Não importa. Junho ainda consegue ser bonito. Fogos terá. Os pescadores farão a sua festa.

E para ser o maior de todos os junhos já comemorados, bombas, apesar de todas as proibições, terão que subir aos ares. Principalmente aquelas, muitas, que todos desejam ver explodir no dia 17. Para comemorar que santo? Pois, qualquer um que nos dê a vitória no futebol. Aí, sim, mesmo sem balão nem fogueira, que grande junho iremos ter.

Saudosista ou não, quem não vai concordar?


Imagem: reprodução do álbum de recortes de Lydia Federici, no acervo da Hemeroteca Municipal

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