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CULTURA/ESPORTE NA BAIXADA SANTISTA - LYDIA
Lydia Federici (4 - crônica 126)

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Clique na imagem para voltar ao índice desta seçãoEm mais de três décadas de atuação diária, Lydia Federici publicou milhares de crônicas no jornal santista A Tribuna. A Hemeroteca Pública Municipal de Santos criou um Espaço Lydia Federici, onde estão expostos desde sua máquina de escrever até os troféus desportivos, bem como os organizados álbuns de recortes reunindo todos os seus textos publicados. Esta crônica foi publicada em 26 de maio de 1962 em A Tribuna (ortografia atualizada nesta transcrição):
 
GENTE E COISAS DA CIDADE

Planta diferente

Lydia Federici

Num desses prédios de apartamentos da praia, mora, num décimo andar, sozinha com seu marido, uma senhora. O apartamento é grande. Enorme, mesmo. Mas, como esse casal gosta de amplidão e tem posses para obtê-la, não há nada a dizer. Nesta terra de liberdade, cada qual vive como pode e quer.

O apartamento é um mimo. Desde a entrada, particularíssima no andar, até o tanque duplo de uma área de serviço que é quase um quintal suspenso. Em tudo há graça. Mais que isso. Verdadeira arte. E o que é mais: uma arte absolutamente cômoda. Confortável. Que não assusta, não intimida, não agride. Arte perfeita e pacificamente bela. Tão bela que chega a transmitir sua beleza às pessoas que ali entram. Preciso dizer mais?

No 'living' ensolarado, enchendo de natureza a sala enorme, vasos e jardineiras, com plantas viçosas, completam e isolam conjuntos coloridos. Há um canto para a leitura. Outro para música. Outro mais para sonhar, olhando o mar. Ou o céu. Em todos eles, naquela altura, há o verde da natureza. Não são plantas comuns. Encontradas em qualquer lado. São variedades pouco conhecidas. E, se há uma espada-de-São-Jorge, não é aquela que, boa patriota, lembra o verde e o amarelo da nossa bandeira. Não senhor. É uma verde, de um verde profundo veiado de branco muito branco. Tão luxuriante, tão comprida e lustrosa a haste dura, que se chega a pensar que aquilo não é natural. Mas, "ó", que lá pode existir dessas imitações de plástico. O orgulhoso capricho daquela dona de casa nunca se permitiria esse recurso cômodo, prático e tão atual.

Pois bem. Num dos grandes vasos, talvez o mais bonito, estrategicamente colocado, quase debruçado sobre o peitoril da grande janela, entre o luxo da nobreza vegetal, há uma planta pequena que os homens olham sem ver. Entretidos a discutir café e Santos Futebol Clube. No entanto, as amigas da dona do apartamento, se largam os olhos até lá, logo a descobrem. Com espanto. Algumas, por timidez ou delicadeza, veem e fazem que nada viram. Mas há sempre as mais íntimas. E essas não se aguentam por muito tempo. Ainda duvidando dos próprios olhos ou dos próprios conhecimentos, arriscam:

"Lazinha querida. Isto aqui não é...?" e não se atrevem a dizer.

Dona Lazinha sorri. Um sorriso puro. Natural. Um sorriso que só gente segura de si, com personalidade, sem o menor complexo de coisa alguma, consegue sorrir. "Claro que é". Confirma com simplicidade.

"Mas por que você deixa isso aí? Nunca vi. Não combina. De jeito algum".

"Por que não? Repare bem como as folhas são mimosas". A outra concorda. Mas não compreende. "Você, explica Lazinha, já viu o preço da salsa? Pois essa não me custa nada. Está sempre fresquinha. É só tirar".


Imagem: reprodução do álbum de recortes de Lydia Federici, no acervo da Hemeroteca Municipal

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