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CULTURA/ESPORTE NA BAIXADA SANTISTA - LYDIA
Lydia Federici (4 - crônica 125)

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Clique na imagem para voltar ao índice desta seçãoEm mais de três décadas de atuação diária, Lydia Federici publicou milhares de crônicas no jornal santista A Tribuna. A Hemeroteca Pública Municipal de Santos criou um Espaço Lydia Federici, onde estão expostos desde sua máquina de escrever até os troféus desportivos, bem como os organizados álbuns de recortes reunindo todos os seus textos publicados. Esta crônica foi publicada em 25 de maio de 1962 em A Tribuna (ortografia atualizada nesta transcrição):
 
GENTE E COISAS DA CIDADE

Está errado

Lydia Federici

De um modo geral, uma observação desagrada. Ao recebê-la, o primeiro impulso é sempre de revolta. Depois, com o raciocínio a funcionar, reconhece-se o próprio erro. Ou defeito. E só pessoas realmente grandes é que conseguem continuar a querer bem àquele amigo que teve a coragem de falar.

Minha amiga. Desejo que você seja uma dessas pessoas de alma verdadeiramente grande. Não me queira mal pelo que vou dizer-lhe.

O caso é o seguinte. Sei que você comprou um bilhete de uma rifa. Se não foi você, foi seu marido que o fez. Coisa que vem a dar absolutamente no mesmo. Porque, de qualquer forma, aquele retângulo de papel, de forma direta ou indireta, acabou indo parar em suas mãos. Que o guardaram, ricamente, na caixa de joias, Que o juntaram, no porta-notas, a outros papeis importantes. Importantes do ponto de vista monetário ou sentimental. Ou dinda que, muito atarefadas, esqueceram-no, na cozinha, sob a lata de biscoitos.

Pois bem. Essa rifa core hoje. dia 25 de um maio que teima em não fantasiar-se de maio. Não importa. Com chuva ou com sol, a rifa é pra hoje. Sorteará o número felizardo a loteria mineira. Que, apesar de mineira, em nada se diferencia de qualquer outra loteria. Nacional. Ou estrangeira. Seu primeiro prêmio pertencerá a uma única série de algarismos. Que darão um único prêmio.

Procure lembrar-se, pois, com a devida antecedência, do lugar em que guardou, escamoteou ou perdeu o seu bilhete da Faculdade de Direito. O da rifa promovida pelo Centro "Alexandre de Gusmão". E aguarde, papelucho na mão, a virada chocalhante das bolinhas mineiras.

Sei que 999 corações esperançosos mandarão os mineiros passear pelos corredores do inferno. É sempre assim. Gente que perde desabafa a desilusão agredindo, embora da boca prá fora, aquele ou aquela infeliz que a decepcionou. É reação normal. Bem humana. Compreensível e perdoável, portanto.

Mas, alguém, com os olhos bem abertos, gritará: "Ganhei". E haverá todo um mundo de alegria nessa expansão vocal. Plenamente justificável, não? Ganhar alguma coisa sempre traz um certo alvoroço. E quem se alvoroça, de acordo com o progresso das ciências modernas, tem que manifestar-se, tem que exteriorizar seus sentimentos, tem que extroverter-se. Questão de equilíbrio mental. Aquela história da pressão que mexe a tampa da panela.

Pois é, minha amiga. Foi você a felizarda? Verificou bem o seu bilhete? Não há dúvida possível? Então, tenha calma. Sente-se depois de tomar três bons goles de água açucarada. E ouça. Seu bilhete está errado. Está, sim. Não é possível? Os estudantes de Direito são gente séria? Eu sei. Sei que são. Mas torne a olhar esse papel que treme em suas mãos. Leia o que está ali impresso. Da primeira à última linha. Percebeu? Notou o erro? Pois é certo escrever: "Concorre" somente mil números?


Imagem: reprodução do álbum de recortes de Lydia Federici, no acervo da Hemeroteca Municipal

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