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CULTURA/ESPORTE NA BAIXADA SANTISTA - LYDIA
Lydia Federici (4 - crônica 121)

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Clique na imagem para voltar ao índice desta seçãoEm mais de três décadas de atuação diária, Lydia Federici publicou milhares de crônicas no jornal santista A Tribuna. A Hemeroteca Pública Municipal de Santos criou um Espaço Lydia Federici, onde estão expostos desde sua máquina de escrever até os troféus desportivos, bem como os organizados álbuns de recortes reunindo todos os seus textos publicados. Esta crônica foi publicada em 20 de maio de 1962 em A Tribuna (ortografia atualizada nesta transcrição):
 
GENTE E COISAS DA CIDADE

Família

Lydia Federici

O menino subiu a escadaria externa da Santa Casa. Entrou no saguão fazendo-se menor do que já era para os seus mirrados 10 anos. Com passos silenciosos ia passar para um corredor quando o guarda o descobriu.

"Ei, garoto. Pra onde você vai?"

O menino encolheu-se. Parou, sem jeito. Com medo nos olhos escuros. A voz, depois de um momento, saiu-lhe insegura: "Vou ver meu pai".

O guarda não era duro. Mas ordens são ordens. Esboçou um meio sorriso para adoçar, um pouco, o não que ia dizer. "Estas não são horas de visita. Volte à tarde".

Como o menino, irresoluto, não se mexesse, o homem fardado, com as sobrancelhas franzidas, aproximou-se do garoto. Este olhou ao redor, com ar de pânico. Tanta gente entrando e saindo e ele ali, brecado. Se conseguisse meter-se pelo meio daquelas moças de uniforme. Foi o que fez. Sumiu. E o guarda, vendo-o voltar para o meio do grande hall, retornou ao seu posto. Para atender a uma senhora que queria informações, uma enfermeira com um recado, um 'boy' cheio de pacotes. Com essa movimentação toda, o homem esqueceu o menino.

Mas o menino não esqueceu o que tinha a fazer. Misturou-se ao bulício silencioso. Avançou e recuou. Parou e seguiu. Escondeu-se atrás de uma porta. Quase à entrada da enfermaria foi que uma irmã, de improviso, lhe surgiu pela frente. Precisava falar com o pai. Sabia, sim, que não era hora de visita. à tarde já era muito tarde. Não dava mais. Tinha que ser agora. Não ia atrapalhar ninguém, não, senhora. Só coisa de um minuto.

Ela virou o rosto. Naqueles dez segundos, o menino sumira. A irmã sacudiu a cabeça, um leve ar de contrariedade no rosto pálido. Ergueu os ombros, com um suspiro. Entrou na enfermaria geral. Tanta coisa para atender.

Junto a uma das camas, o menino conversava com um internado. Encolheu-se quando viu a freira de olhar severo. "Está melhor, papai?" Havia pressa e ansiedade na sua voz. Colou o corpo à cama estreita. "Comprei uma coias para mamãe. Hoje é o 'Dia das Mães', sabe, papai? Precisava saber se está bem. Quer ver se serve?" Suas mãos nervosas procuravam desembrulhar, com cuidado, um pacote pequeno. Uma canequinha colorida apareceu. Os olhos do menino pularam do presente para a figura da freira, ali perto, e, ansiosos, com uma interrogação, para o rosto do pai.

"O senhor acha que serve?"

"Está muito bonito o seu presente, meu filho. Mamãe vai gostar, sim".

Pela primeira vez o menino sorriu. Sem receio. Sem dúvida. "Ciau, papai. Fique logo bom. Agora posso ir embora".

***

Isso, meu amigo, é, se não me engano, uma família. Perdoe-me se não posso definir de outra forma o que seja sentimento de família.


Imagem: reprodução do álbum de recortes de Lydia Federici, no acervo da Hemeroteca Municipal

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