http://www.novomilenio.inf.br/cultura/cult003d118.htm
Última modificação em (mês/dia/ano/horário): 10/24/15 17:16:10 |
|
CULTURA/ESPORTE NA BAIXADA SANTISTA - LYDIA
Lydia Federici (4 - crônica 118)
Em mais de três décadas de atuação diária, Lydia Federici publicou milhares de crônicas no jornal santista A Tribuna. A Hemeroteca
Pública Municipal de Santos criou um Espaço Lydia Federici, onde estão expostos desde sua máquina de escrever até os troféus desportivos, bem como os organizados álbuns de recortes reunindo todos os seus textos publicados. Esta crônica foi publicada em
17 de maio de 1962 em A Tribuna (ortografia atualizada nesta transcrição):
GENTE E COISAS DA CIDADE Aos de praça
Lydia Federici
Senhores choferes.
Quem lhes escreve é uma colega. Tirei minha carta no começo desta semana. Foi suada a prova. Mas consegui fazer tudo bem direito. E assim, lá vou eu, motorizada, para o meio das ruas. Escrevo-lhes para dizer-lhes duas coisas. Uma delas é uma
informação que desejo. E que só os senhores, profissionais do volante, com sua longa prática, é que me poderão dar.
Meu instrutor, muito antigo de ideias, chateou-me a valer com uma série de coisas que são ou não são para fazer. Aprendi todas e fiz o meu exame de motorista sem deixar de fazer o que era para fazer, e não fazendo o que ele me ensinou a não fazer.
Entendem? Essa bobageira toda de sinais, de contramão, de buzina, de estacionamento. Acho que isso é muito bom para principiante. Para quem tem prática, só atrapalha. Pelo menos é o que consigo deduzir, observando o modo pelo qual os senhores
guiam.
Por exemplo: sinal vermelho num cruzamento deserto. O José, meu instrutor, diz - ou dizia, graças a Deus, que as aulas acabaram - que o olho vermelho está ali para ser obedecido. Mas nós sabemos que isso representa perda de tempo, não é? Como é que
os senhores entram? Quando o guarda não está ali para apitar e multar?
Outra coisa: um chofer prático não se preocupa em dar sinal com o braço, quando vai dobrar uma esquina ou parar. Ou se preocupa? Pelo que tenho observado, a maioria vai fazendo isso tudo sem dar satisfações. Os carros de trás, se forem bons, que
adivinhem. Pra isso têm prática. Que desviem ou brequem, não é?
Há ainda outra coisa que eu admiro nos senhores: a buzina não é proibida depois das 10 da noite? Que figa os senhores usam para se livrar das pragas que a vizinhança manda pra cima dos buzinadores impacientes?
Andar ou estacionar contramão, como os senhores andam ou param, para economizar mais duzentos metros ou uma curva chata de fazer, não pode dar uma trombada de prejuízo cem vezes maior. Como é que os senhores conseguem fugir a esse desastre? Pela
prática? E essa prática custa muito a adquirir? É isso que eu queria saber: quanto tempo vou levar até aprender a guiar com a segurança bem segura com que os senhores guiam?
A outra coisa que eu queria dizer-lhes é um pedido. Será que, pelo menos por uns tempos, enquanto eu não tiver muita prática, os senhores não poderiam passar um pouco mais longe do meu carro? Sei que os senhores sabem tirar "finas". Mas eu não.
Sempre me assusto. E, assustada, posso dar uma guinada. E isso vai ser o diabo. Já que comecei a pedir: não buzinem nem gritem quando eu estiver na sua frente, engatando a "primeira". Isso me deixa nervosa. Ficando nervosa não engato coisa nenhuma.
Tá?
Isso é o que eu tinha para dizer. Ah! Meu carro é um "Volks" amarelinho. Cuidado com ele, sim? Um abraço da colega
LILICA
Imagem: reprodução do álbum de recortes de Lydia Federici, no acervo da Hemeroteca Municipal
|
19/5/1962 - À "colega" Lydia Federici (Lilica) - De um de praça
Senhora Cronista
Não raras vezes, nós os "de praça", por qualquer motivo que suscite interesse próprio ou vaidade literária, servimos de alvo fácil aos pobres de argumentos e a pedantes "colegas", de incapacidade confessa, no que se refere à minha profissão.
No artigo "Aos de praça", publicado quinta-feira última neste matutino, faz a "distinta" "colega" várias perguntas irônicas, com o intuito de depreciar a conduta dos "de praça" na direção de seus veículos. Tal atitude de curiosidade, e ironia,
embora se justifique numa mulher, a meu ver não se justifica numa cronista de seu quilate.
Se realmente a "colega" quiser as respostas e principalmente aprender a não ficar nervosa, aprender a não dar guinadas e consequentemente aprender a dirigir, convido-a a entrar para o grupo dos "de praça", trabalhar em média 15 horas diárias,
inclusive aos sábados, domingos, feriados e dias santos, com ou sem chuva e possivelmente - tenho dúvidas - estará ou melhor ficará mais ou menos imunizada às crises de nervosismo que pelo visto lhe são peculiares.
No atendimento, aproveito o ensejo de solicitar à "colega" para não entrar no quadro associativo do Sindicato da categoria dos "barbeiros".
Isto é o que eu tinha a responder. Ah! Ia esquecendo, não uso o braço para fora para não ficar sem ele como outros "de praça" já ficaram. Pode muito bem vir, atrás do veículo que dirijo, um certo "Volks" amarelinho.
Um abraço do "colega"
TROVOADA
P. S. - Nunca usei figas para afugentar pragas da população. Não obstante, reconheço a necessidade de usá-las para anular as pragas de alguns ou algumas cronistas. Tá?
(Firma Reconhecida)
Imagem: reprodução do álbum de recortes de Lydia Federici, no acervo da Hemeroteca Municipal
|
|
|
|