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CULTURA/ESPORTE NA BAIXADA SANTISTA - LYDIA
Lydia Federici (4 - crônica 104)
Em mais de três décadas de atuação diária, Lydia Federici publicou milhares de crônicas no jornal santista A Tribuna. A Hemeroteca
Pública Municipal de Santos criou um Espaço Lydia Federici, onde estão expostos desde sua máquina de escrever até os troféus desportivos, bem como os organizados álbuns de recortes reunindo todos os seus textos publicados. Esta crônica foi publicada em
29 de abril de 1962 em A Tribuna (ortografia atualizada nesta transcrição):
GENTE E COISAS DA CIDADE Aperturas de estudante
Lydia Federici
Antes era fácil. E sumamente cômodo. Só havia, para o estudante comum, dois curtos períodos de esforço durante o ano.
Um, antes das férias de julho. Coisa pouca, quase uma brincadeira. Outro, tipo do "agora ou nunca mais", em dezembro, um dezembro de torturas e agonia. Fora disso, não havia problemas de desgaste cinzento-celular. Era ir levando, na maciota, a
escola, o estudo e os professores. Só o exame final é que era definitivo. De morte. De dar esgazeamentos e olheiras em qualquer um ou uma.
Quem se lembra, até o ano passado, de ter visto a moçada bonita de nosso curso secundário investigando, com olhos aplicados, interessados, as folhas de um livro ou do "espiral", durante o mês de abril ou de setembro? Bobagem. Pura perda de tempo. O
exame final, decisivo, não era em dezembro?
Mas veio a reforma. A tal, cheia de improvisações, novidades e critérios totalmente modificados. A direção dos colégios está penando com o nvo programa que ainda não foi programado. Mas, dentro dos critérios elásticos, uns ainda em estudos, uma
coisa foi definitivamente acertada: as notas das provas mensais passaram a ter boa influência na aprovação final. Nada menos que o peso 7. É brincadeira? E o único exame de fim de ano, valeria o peso 3.
A moçada, muito viva pra essas coisas, fez as contas, calculou bem e achou, depois de muitas consultas e indagações, que a história estava completamente invertida. Pouco adiantaria arrancar as pestanas em cima da hora, para o então quase definitivo
exame de dezembro. Imprescindível, agora, era estudar e procurar obter boas notas durante os meses do ano letivo. Isso é que pesaria na balança. Ora já se viu maior abacaxi? Não é que os diabos inventaram um jeito de fazer a cambada do sossego
estudar? Durante, é incrível, durante todo o ano?
Acho que foi por isso que, há 3 dias, passando, às sete e quinze, pela Conselheiro Nébias, vi o que muita gene deve ter visto. Levando um susto desses de deixar a gente com o coração a falhar batidas.
Todos sabem que a Nébias é, com a Ana Costa, a avenida "cidade-praia" mais movimentada da cidade. Bondes, ali, quando não embolam, passam a pequenas distâncias uns dos outros. Vão, obedientes, pelos trilhos centrais. Mas ônibus, lambretas,
automóveis e caminhões ziguezagueiam por ali, num corso em marcha ultra-acelerada e arqui-indisciplinada. Salve-se quem puder!
Pois, como ia dizendo, na outra manhã, pela avenida frenética, seguia uma inocente bicicleta. Pedalava-a uma meninota de uniforme. Saia azul-marinho, pregueada, e blusa com gola e punhos azuis. Na garupa, sentada de banda, outra garota. Pernas
balançando, agarrava-se à ciclista, prensados os livros contra o corpo das duas. Na mão livre, a garota da garupa segurava um caderno, cujos rabiscos lia, em voz alta, fazendo perguntas à colega. Recordavam pontos, esquecidas de tudo.
Ai! Moçada bonita. O estudo é importante. Mas a vida ainda é mais. Cuidado!
Imagem: reprodução do álbum de recortes de Lydia Federici, no acervo da Hemeroteca Municipal
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