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CULTURA/ESPORTE NA BAIXADA SANTISTA - LYDIA
Lydia Federici (4 - crônica 101)

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Clique na imagem para voltar ao índice desta seçãoEm mais de três décadas de atuação diária, Lydia Federici publicou milhares de crônicas no jornal santista A Tribuna. A Hemeroteca Pública Municipal de Santos criou um Espaço Lydia Federici, onde estão expostos desde sua máquina de escrever até os troféus desportivos, bem como os organizados álbuns de recortes reunindo todos os seus textos publicados. Esta crônica foi publicada em 26 de abril de 1962 em A Tribuna (ortografia atualizada nesta transcrição):
 
GENTE E COISAS DA CIDADE

Calçadas e passeios

Lydia Federici

Pode ser que haja erro de interpretação. Calçada não é, verdadeiramente, a mesma coisa que passeio. Será que o engano parte daí?

Calçada, segundo o dicionário prático ilustrado, esse monstro enciclopédico luso-brasileiro, é um caminho ou rua empedrada. O termo certo para a nossa ideia de calçada é passeio. Essa parte lateral, um pouco mais elevada das ruas, destinada, especialmente, ao trânsito de pedestres. E pedestre, que é? Aquele que anda a pé. Tudo bem entendido? Sem confusão possível?

Ora muito bem. Todo o mundo sabe que Santos é uma cidade cheia de ruas. Ruas de todo o tipo. Quase sempre estreitas, na parte antiga da cidade. Mais largas, as mais modernas. Sempre que haja chão disponível, é evidente. Em todas elas, becos sombrios e mofentos, ou largas avenidas, existem, lateralmente, passeios de cinco metros de largura.

Qualquer santista, em qualquer canto da cidade, saindo de casa, não cai, em cheio, no meio da rua. Não senhor, Que pra todos nós, pacatos ou afobados pedestres, existe, estreito ou largo, o passeio salvador. Ilhazinha de sossego e de segurança. Caminho particular. Inventado para nós, pedestres.

Pois sim. Fie-se nisso, meu amigo.

Passeio, em Santos, com seus ladrilhos gastos, é sabão, danação pior, é um ladrilho com cara de inocente que, quando pisado, esguicha água suja. Que enlameia barra de calça, pernas e saias femininas. Passeio, em Santos, também é depósito de material, estacionamento de carros, tapume de construção. Quem quiser seguir avante, que invada a rua. Ouvindo justas mas mui graciosas pragas de chofer. Ou sendo graciosamente empurrado por um para-lama qualquer.

Mas isso tudo, afinal de contas, são males estáticos. O pedestre não muito distraído desvia das poças e dos tapumes. Não atropela automóveis. São esses todos, pequenos males preveníveis e evitáveis. Mas, do que não conseguimos escapar, por mais olhos e ouvidos que tenhamos, é da praga ambulante das bicicletas. Essa coisa que, nos passeios dos pedestres, vêm ao nosso encontro, na velocidade, atacando-nos, subitamente, por todos os lados.

Quem, hoje, se atreve a sair do portão sem antes enfiar dois olhos bem grandes para os dois lados do passeio? Quem, nas esquinas, não se encolhe contra o muro? Quem não pula com o assobio do açougueiro ou do caixeiro a pedir, insistir, exigir passagem naquela faixa destinada exclusivamente aos pedestres?

Passeio de pedestre, em Santos, virou pista de bicicleta. E acabou-se.

Pergunto: se a rua é dos automóveis e o passeio pertence aos ciclistas, quem pode, hoje, pedestremente, sair de casa? Por onde andar?


Imagem: reprodução do álbum de recortes de Lydia Federici, no acervo da Hemeroteca Municipal

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