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CULTURA/ESPORTE NA BAIXADA SANTISTA - LYDIA
Lydia Federici (4 - crônica 99)

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Clique na imagem para voltar ao índice desta seçãoEm mais de três décadas de atuação diária, Lydia Federici publicou milhares de crônicas no jornal santista A Tribuna. A Hemeroteca Pública Municipal de Santos criou um Espaço Lydia Federici, onde estão expostos desde sua máquina de escrever até os troféus desportivos, bem como os organizados álbuns de recortes reunindo todos os seus textos publicados. Esta crônica foi publicada em 24 de abril de 1962 em A Tribuna (ortografia atualizada nesta transcrição):
 
GENTE E COISAS DA CIDADE

Velho professor

Lydia Federici

Nasceu em São Sebastião. Lá no litoral Norte do Estado. Caiçara de verdade, aprendeu a dormir com a canção de ninar, muito mansa, do mar. Daí, talvez, a mansidão de sua alma. Cresceu, estudou e, moço, principiou a trabalhar como escrivão da Coletoria de Pontal da Cruz. Mas seu ideal era outro. Gostava de ensinar. Virou professor. Professor de caiçarinhas. Dr. Manoel Hipólito do Rêgo aprendeu a ler com o professor de São Sebastião.

Com 22 anos - o rapaz, como todo rapaz de hoje ou de sessenta anos atrás - sentiu vontade de sair para um lugar de maiores possibilidades. E veio parar em Santos. Por que Santos. Porque Santos também é terra de caiçaras. Também é chão que o mar acaricia e nina.

Chegou a Santos em 1900. Quando, por aqui, em quase todo lado, se sentia cheiro de mangue e de capim. Sentiu-se em casa o rapaz. Conseguiu um lugar na Companhia Docas, no expediente da Superintendência. Mas a sua paixão continuava a ser o ensino. Gostava de ensinar, embora não tivesse diploma de professor. Mas isso, naquela época, não tinha importância. O que valia era saber. E conhecimentos, naquela cabeça, havia de sobra. Era só conversar cinco minutos com o rapaz pálido e pronto!... A descoberta estava feita. Havia ali um professor. Um grande e bom mestre.

E o rapaz foi nomeado professor. Teria sido um crime desperdiçar a generosidade daquela alma, o saber daquela cabeça, todo o amor daquele coração. O primeiro professor municipal de Santos foi o rapaz do litoral Norte. Nomeado regente da Escola Noturna da 4ª Zona, no bairro da Vila Matias, foram de pequenos operários santistas as primeiras cabeças que descobriram, através dos ensinamentos do professor calmo e paciente, as belezas do saber.

Durante 19 anos, semana após semana, o professor sentiu-se feliz no meio de seus alunos. E milhares de alunos sentiram-se felizes ao ouvir a voz calma do homem que, ensinando-os a ler, sabia transmitir-lhes, com seu entusiasmo, o amor às coisas dignas, justas e belas.

O destino quis truncar essa carreira de mestre. Obrigado, por doença, a aposentar-se, o professor continuou sua obra por outro caminho: fez-se jornalista. Continuou a esparramar seus conhecimentos, afastado só fisicamente de seus alunos, quem nascera para ensinar.

Hoje, o primeiro professor municipal de Santos faz 84 anos. Está cansado? Claro que sim. Mas como, quando moço, ensinou a 9 filhos, quando, um pouco mais velho, continuou sendo professor de muitos netos, ainda agora, com 84 anos, bisavô feliz, não deixou de ser professor. O professor Antonio de Oliveira Passos Sobrinho, ou simplesmente o professor Passos.

É o professor Passos, nascido em São Sebastião, professor, velho professor de muitos milhares de santistas, que Santos, hoje, agradecida, abraça com carinho. É a forma perfeita de retribuir, com amor, todo o amor que o professor deu e dá a esta terra e à sua gente.


Imagem: reprodução do álbum de recortes de Lydia Federici, no acervo da Hemeroteca Municipal

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