A notícia saiu. Meio escondida. Mas lida por muita gente. Que não quis se impressionar. Isso no começo. Porque, meditando um pouco, a nota parecia ser coisa cientificamente provada. Ou estudada, pelo menos.
"A formação de uma bolsa de pressão ocasionará o enrugamento no platô oceânico que poderá provocar, em data incerta, um maremoto sobre a costa do Rio de Janeiro, com ondas de 36 metros de altura".
Costa do Rio de Janeiro? E Santos não está logo ali, um pouco mais ao sul? Sim. E por essa razão suportaria ondas de 14 metros. Que consolo, hein?
Ninguém quis se impressionar. Bobagem de quem não tem nada que fazer, essa predição de maremoto. Mas não eram técnicos e cientistas os que tinham estudado o assunto? E o primitivo levantar de ombros
transformou-se, com o passar das horas, em preocupação.
À noite, a velhinha insone pergunta à filha, numa voz abafada:
"Ada? Você está dormindo?" Não. Não estava. Pensava no senhor que tinha ido, nervoso, à farmácia, para comprar sedativos para toda a família.
"Minha filha, desculpe se acordei você. Mas... que altura você acha que tem esta casa?"
"Uns 10 metros. Ou 12".
"Quer dizer que se vier uma onda de 14, nós vamos todos embora?"
"Ora, 'mamma'. Não vai ser hoje. Nem amanhã. Veja se esquece isso. Durma sossegada".
Sim. Dormir. Como, se o mar, com maré alta, roncava grosso dentro das paredes do quarto? Nem adiantava cobrir a cabeça com o travesseiro. Diacho que vamos morrer afogados, num dia qualquer, ou numa noite
escura, que é muito pior, é que é um inferno. Para que nos penduram essa maldição diante dos olhos? Já não chegam as preocupações habituais? Ainda mais essa? Não!
O caso é que a notícia saiu. Agora, só deixando o tempo passar a sua mágica esponja apagadora, sobre a mente das pessoas, é que voltaremos a entrar no nosso sossego habitual. E muito relativo. Porquanto,
sossego, hoje em dia, neste mundo de humanidade cada vez mais insatisfeita, coisa inexistente. Mas enfim, que só as preocupações normais nos façam dar saltos na cama, no habitual dormir intranquilo de hoje. Que o maremoto nos deixe em paz.
Chegam-nos bem as dificuldades em que nos debatemos. Pra que inventarem de nos matar no mar: Logo neste nosso mar tão amigo? Bobagem. Ele se negaria a isso.