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CULTURA/ESPORTE NA BAIXADA SANTISTA - LYDIA
Lydia Federici (4 - crônica 82)

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Clique na imagem para voltar ao índice desta seçãoEm mais de três décadas de atuação diária, Lydia Federici publicou milhares de crônicas no jornal santista A Tribuna. A Hemeroteca Pública Municipal de Santos criou um Espaço Lydia Federici, onde estão expostos desde sua máquina de escrever até os troféus desportivos, bem como os organizados álbuns de recortes reunindo todos os seus textos publicados. Esta crônica foi publicada em 3 de abril de 1962 em A Tribuna (ortografia atualizada nesta transcrição):
 
GENTE E COISAS DA CIDADE

A Vizinha

Lydia Federici

"Nico".

A voz chegara num sopro, a medo. Só bons ouvidos a teriam percebido. E o rapaz tinha ouvidos finos. Encolheu-se na poltrona, num movimento instintivo de defesa.

"Nico. É você que está aí?"

Era ele, sim. E ela o sabia muito bem. O muro do jardim era baixo. A trepadeira, desnuda, não encobria a parte lateral do terraço, sem luz, mas suficientemente clareado pelo luar. Ah! Lua abençoada. Respondeu sem entusiasmo, passando a mão no rosto de barba cerrada. E crescida, apesar de só ter 12 horas.

"Norma não está?" Insistia naquela mania de falar sussurrando.

"Não. Saiu". Como mentir? Toda a vizinhança sabia quando Norma não estava. O silêncio da casa selava, sempre, de forma definitiva, a sua ausência.

"Osvaldo teve que ficar no escritório. Você quer dar uma chegada?"

O convite, na noite calma, aborreceu-o. Mais que das outras ocasiões. No começo, fora interessante. Qual o homem que não gosta de uma novidade? E aquilo até que era divertido. Mas depois a história perdera a graça. A novidade passara. Nico queria sossego. Principalmente naquela noite. Gostava de sentir a quietude da noite. Quieto ele também. Sem amolação. Porque aquilo, decididamente, já era uma amolação.

Mas foi. Ela estava à espera, não estava? Dona Cota já havia aberto o portão grande. Estava, agora, lá dentro, fechando a casa. A cantarolar. Nico parou um instante no jardim. O perfume da dama da noite era angustiante. Sufocava-o. Oprimia-o. E entediava-o porque vinha misturado com "Êxtase", do qual a vizinha não fazia economia.

Muito devagar, a contragosto, foi pisando nas pedras irregulares. Sem tocar na grama escura que enchia os intervalos. Mania de criança. Que precisava perder.

O perfume da dama da noite ficou para trás. "Êxtase" era uma tonteira. Nico sentiu enjoo e uma raiva surda contra dona Cota, exigente na sua voz mansa, sempre sussurrada. A resolução veio de repente: "Vou acabar com isto. Vai ser difícil de explicar". Titubeava. Mas voltou a pensar no sossego que poderia readquirir e criou coragem. Ia ser naquela noite. Já!

Um minuto depois, estacionado o carro junto ao meio fio, Nico explicou à pobre vizinha que ela precisava aprender a dar marcha-a-ré.


Imagem: reprodução do álbum de recortes de Lydia Federici, no acervo da Hemeroteca Municipal

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