Buraco que nasceu pequeno e modesto. Mas que, pouco a pouco, foi crescendo. Alargando o diâmetro. Aprofundando-se. Enquanto foi ligeira depressão, ninguém se incomodou. Passageiros descuidados de automóveis e
bicicletas recebiam uma sacudida. Praguejavam. E só. Quando, porém, feixes de molas obrigaram motoristas a enfiar a mão no bolso, reclamações violentas exigiram providências. Imediatas.
"Isto é uma cidade ou um trecho da Belém-Brasília?"
As providências chegaram numa bela manhã de sol. Em forma de homens, ferramentas e material. O zum-zum dos operários e o arrastar das enxadas descarregadas do caminhão acordaram a rua. Janelas se abrira.
Exclamações saudaram a turma numerosa de consertadores. Bom dia. Bom dia. Adeus, buraco.
Os operários, agrupados, ouviam as determinações do feitor, aparteado por dois sub-feitores que olhavam o buraco e sacudiam a cabeça. Por fim, dois homens, de alavanca pontuda na mão, principiaram a picar o
asfalto. Os outros 11 operários encostaram-se ao muro sombreado e puseram-se a examinar, com cuidado, o trabalho ritmado dos dois companheiros.
Quando o asfalto se abriu em pedaços, os homens das alavancas foram substituídos por outros dois que empunhavam picaretas. Quando estes terminaram de picaretar, indo para a sombra, a enxugar o suor que lhes
escorria pela fronte queimada, dois outros avançaram e recolheram, para um carrinho, os blocos de asfalto. O dono do carrinho cuspiu nas mãos e levou o entulho para um lado da rua. Vieram os cavocadores. De enxada e pá. Enquanto dois ou três
trabalhavam, os outros esperavam, pacientemente, sua vez de entrar em ação. Que isso tudo é muito bem organizado. Cada qual tem sua função específica. E nenhum se mete no trabalho do outro.
Às 10 horas e quinze, o feitor suspendeu o trabalho.
"Hei. Onde é que vão?"
"Hora da boia". Já? Mas o almoço não é às 11? Das 11 às 13?
"É. Mas nós moramos longe. Lá na Caneleira. Se a gente não larga agora, não temos as duas horas de almoço".
Às 13 e 45 voltaram a trabalhar.
Três dias depois, o buraco estava tapado. Como sobrara muito pó de pedra, espalharam o pó branco pela rua. Carros estacionados, jardins, vidraças, viraram paisagem europeia de inverno. Os moradores,
sufocados, acabaram varrendo, juntando e dando sumiço àquilo tudo.
Buraco na rua? O povo não exige providências. Espeta um cabo de vassoura, com um trapo pendurado, e pronto. Tudo mundo sabe que ali há perigo. Porque, ruim com buraco, pior, muito pior, com buraco tapado.