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CULTURA/ESPORTE NA BAIXADA SANTISTA - LYDIA
Lydia Federici (4 - crônica 78)

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Clique na imagem para voltar ao índice desta seçãoEm mais de três décadas de atuação diária, Lydia Federici publicou milhares de crônicas no jornal santista A Tribuna. A Hemeroteca Pública Municipal de Santos criou um Espaço Lydia Federici, onde estão expostos desde sua máquina de escrever até os troféus desportivos, bem como os organizados álbuns de recortes reunindo todos os seus textos publicados. Esta crônica foi publicada em 29 de março de 1962 em A Tribuna (ortografia atualizada nesta transcrição):
 
GENTE E COISAS DA CIDADE

Pescador de paredão

Lydia Federici

O bonde nem chega a parar diante do Internacional e o rapaz já pula da plataforma, pelo lado da entrevia. Onde vai com tanta pressa? Para o seu pedaço favorito de paredão, na Ponta da Praia. No semicírculo avançado, de cujos lados descem as duas rampas de desembarque.

Não se preocupa em olhar o mar. Vinha observando-o durante todo o trajeto do bonde pela praia. Estava bom. E, caso não estivesse, seria a mesma coisa.

Do bolso da calça de brim tira um saquinho de plástico. Que abre e deixa sobre o paredão de cimento que o sol ainda escalda. Ajusta o caniço, sacode-o, ouve com prazer o silvo agudo. Experimenta a carretilha, examina a laçada do anzol minúsculo. Do saquinho de plástico tira uns camarões, surrupiados da cozinha, quando a mãe estava de costas, com certeza. Com a unha estraçalha um sete-barbas, espeta um pedaço diminuto no anzol, camuflando, com cuidado, a ponta enganadora.

Só então examina aquele pedaço de mar calmo. Escolhe, não se sabe por que capricho, o lugar onde vai atirar a isca e, num movimento preciso, faz o anzol percorrer o ar, arrastando a linha fina de nylon, até o mergulho silencioso no canto de água previamente determinado.

E lá fica ele, de pé, encostado ao paredão, durante horas e horas. De vez em quando, muda o peso do corpo de um para outro pé. Muitas vezes recolhe a linha. Para recolocar mais uma lasca de camarão. Que os peixes roubam sem abocanhar o anzol. Não se impacienta. Sabe que um acabará ficando preso. Há sempre algum peixe meio bobo no mar.

Chega a pescar? Claro que sim. Se está de caniço é que está pescando.

Mas pega peixe? Às vezes, sim. Às vezes sete centímetros de prata arquejante balança no ar e chega, carretilhada com emoção, até as mãos felizes do pescador. Um peixe que ele comerá ao jantar, Pondo os olhos em branco. O melhor peixe do mundo. Nunca provou outro mais saboroso.

E assim fazem todos os pescadores de paredão da Ponta da Praia. Grandes e pequenos. Dos sete aos setenta e sete anos. Com um pedaço de bambu e anzol de alfinete ou caniço flexível e cantante de carretilha. E anzol japonês.

Da manhã até o anoitecer, em todos os sete dias da semana, o paredão da Ponta da Praia é escorado pelos corpos pacientes de centenas de pescadores. Que só têm olhos para ver o pedaço de água em que atiraram seus anzóis. Que só têm vida nas mãos sensíveis que esperam o puxão de um inexperiente e desavisado peixinho. Observe-os à vontade. Mas não queira puxar conversa. Será inútil. Naquela hora, são pescadores. Olhos, mãos e paciência. Só depois, abandonado o paredão, é que movimentarão as línguas. Para contar histórias de sete peixes, com sete vezes sete centímetros de comprimento e sete quilos de peso.


Imagem: reprodução do álbum de recortes de Lydia Federici, no acervo da Hemeroteca Municipal

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