GENTE E COISAS DA CIDADE A grande descoberta
Lydia Federici
Eram cinco homens. Todos cinco de terno azul marinho, desses que têm o paletó cruzado. Jaquetão que chamam, não é? Usavam-nos severamente
abotoados sobre uma camisa clara, de colarinho devidamente engravatado. As meias escuras sumiam dentro dos sapatos pretos de amarrar.
Se fossem a uma festa estariam devidamente trajados. A um casamento, também. Mas na praia ensolarada, repleta de falta de roupa, aqueles cinco ternos estavam completamente deslocados. E logo cinco? Todos iguais?
Tinham descido de um ônibus grande, atravessando, em transe, o jardim, pulado para a areia fofa que lhes dificultava o avanço apressado. Caminharam, em linha reta, até o mar. Sem falar, sem olhar para ninguém. Esquisitos de uma vez.
Junto ao mar, estacaram. Todos na mesma linha, ombro contra ombro. Uma onda, morrendo, chegou-lhes aos pés. Não se mexeram. Observaram a água refluir. Hipnotizado, um avançou para a água que fugia para o grande mar. Os outros quatro seguiram-no e,
todos juntos, sempre unidos, iguais, ombro tocando ombro, ficaram olhando outra onda pequenina que avançava. Que avançou até eles, molhando-lhes a sola dos sapatos. Então eles riram e se entreolharam maravilhados. O do meio abaixou-se, mergulhou a
mão no centímetro de água. Ainda abaixado levantou o braço, levou a mão molhada ao rosto, passou-a pelos lábios. Os companheiros olhavam-no numa expectativa que os fazia curvar o corpo, arregalar os olhos, entreabrir os lábios.
"É mesmo". E sacudiu, solenemente, por três vezes, a cabeça.
E então todos se abaixaram e, na onda que avançava com preguiça, espalmaram as mãos e repetiram o mesmo ritual do companheiro.
Um grupo curioso de banhistas, principalmente de crianças, olhava os cinco homens de terno, gravata e sapatos molhados. Que oração era aquela? Que faziam eles? Dóris, curiosa, com as costas queimadas rebrilhando de óleo, aproximou-se da fila. Bem
no momento de ouvir, incrédula, decepcionada, divertida, a frase que ficou soando a apregoar a grande descoberta:
"E não é que é salgada mesmo?"
Imagem: reprodução do álbum de recortes de Lydia Federici, no acervo da Hemeroteca Municipal
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