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CULTURA/ESPORTE NA BAIXADA SANTISTA - LYDIA
Lydia Federici (4 - crônica 38)

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Clique na imagem para voltar ao índice desta seçãoEm mais de três décadas de atuação diária, Lydia Federici publicou milhares de crônicas no jornal santista A Tribuna. A Hemeroteca Pública Municipal de Santos criou um Espaço Lydia Federici, onde estão expostos desde sua máquina de escrever até os troféus desportivos, bem como os organizados álbuns de recortes reunindo todos os seus textos publicados. Esta crônica foi publicada em 8 de fevereiro de 1962 em A Tribuna (ortografia atualizada nesta transcrição):
 
GENTE E COISAS DA CIDADE

Chapéu de sol

Lydia Federici

Seu nome científico? Uma variedade de agárico. Agárico qualquer coisa. Ou qualquer coisa agaricus. Mas todos o conhecem por chapéu de sol.

São árvores bonitas? Depende do gosto e da planta. Crescem logo e à toa, sem cuidado nenhum, dando uma sombra generosa. Por esse motivo é que, nesta cidade quase sempre ensolarada, orlaram toda a avenida da praia com as plantas de folhas largas, de um verde escuro e denso. Têm um inconveniente, porém. Como espalham a galharia em todas as direções, os operários da Prefeitura, uma vez por ano, dão-lhe, entre resmungos, uma poda em regra. Ramo que encosta nos fios elétricos, cai sob o serrote. Daí o aleijão que os chapéus de sol da avenida praiana apresentam. São Feios.

Na areia, onde mais tarde foram plantados, poderiam expandir-se livremente. Ficariam bonitos, então. Evitariam que milhares de banhistas se utilizassem da sombra das outras árvores e simples arbustos que, aqui e ali, enfeitam o jardim. Mas quem diz? Os tarzãs bobões vivem a arrancar-lhes os galhos. E depois compram guarda-sóis de fábrica.

Que outras utilidades têm essas árvores que os turistas vivem a namorar? Só fornecem sombra? Qual o que. Por esta época, carregadas de frutos, oferecem munição gratuita ao exercício de pontaria da molecada. Para os que gostam de coisas azedas, têm as frutas amendoadas, entre a casca e o caroço, três milímetros de polpa fibrosa. Que, a uma simples dentada, amarra a boca por uma hora. Os troncos rugosos são o passatempo favorito de todo rapaz que espera a namorada atrasada: são deliciosos de descascar. As folhas ajudam os automobilistas a manter limpos os para-brisas dos carros. Mas tem que ser folha verde, que a seca, caída no chão, não presta. Daí a outra razão de, quase sempre, a gente ver um marmanjão dependurado num galho.

Mas, nesta terra ilhada, quem quiser ver, de fato, no duro, um verdadeiro exemplar de agárico, tem que ir procurá-lo na Ponta da Praia. Qualquer que seja a sua idade, meu amigo, aquela árvores ainda é um pouco mais velha. Está bem diante do Vasco, no meio da avenida. É todo um poema de força e de vigor. É uma glória. Um templo fresco e repousante. Em que, de manhã, milhares de pequeninas vozes saúdam a alvorada. No qual o coro de pardais chilreantes, à tarde, quando o sol avermelha tudo, se ouve o toque de recolher.

Só quem viu e ouviu o chapéu de sol da Ponta da Praia é que pode, emocionado, compreender o que seja realmente essa árvore amiga. E tão maltratada.


Imagem: reprodução do álbum de recortes de Lydia Federici, no acervo da Hemeroteca Municipal

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