GENTE E COISAS DA CIDADE A volta de Jânio
Lydia Federici
Comecei uma crônica intitulada "Vingança". Fui, aos arrancos, até a metade dos movimentos de uma turista santista em São Paulo. E empaquei
de vez. Não houve jeito de continuar a história. Havia outra coisa a ocupar-me a cabeça. A volta de Jânio. Telefonei a algumas amigas que eu sabia terem votado no ex-presidente do Brasil. Que pensariam elas agora? Continuavam com Jânio? Que esperam
dele?
Aqui vão as respostas.
Uma professora, que votara em Jânio por parecer-lhe o menos ruim dos candidatos, ainda guarda a decepção causada pela renúncia. Não só está decepcionada como indignada também. Mais ainda. Realmente furiosa. "Olhe. Pra mim, Jânio acabou. Que vá ou
que venha, não me interessa. Não quero perder tempo discutindo um homem que fracassou e que, politicamente, morreu".
Uma senhora portuguesa, com 50 anos de Brasil, eleitora que precisa e vai renovar seu título, falou assim: "Todos os de casa, meu marido, as filhas, os genros, continuam a acreditar nesse homem. Quando ele renunciou, foi obrigado a fazê-lo. Queira
Deus que, ao voltar, ele possa justificar esse ato, para todos, até agora, incompreensível. E que possa indicar ao povo o caminho certo de melhorar o governo deste país. Que venha em paz, trazendo paz".
Uma outra amiga, que ainda tem na porta de entrada a caricatura de Jânio-vassoura sobre o círculo azul, quando lhe perguntei o que achava do dia 10 de março, não titubeou. Compreendeu logo e sua voz soou alegre e vitoriosa. "Ele vai voltar. Gora
vamos saber o que de fato aconteceu. O que o obrigou a largar o governo. Continuo a depositar nele a mesma irrestrita confiança de sempre. Eu e todos os da família, que é um bocado grande. Não. Ele não é mais o presidente. Mas, com o povo que
continua a esperar, a acreditar nele, Jânio descobrirá uma forma de endireitar esta pouca vergonha que anda por aqui".
A quarta amiga consultada, esposa de um bancário, louca por política, que não perde comícios irradiados e mesas redondas de TV, uma das poucas eleitoras santistas de Jânio que foi até a praia, para ver sair o navio que o levava para longe da
pátria, num desterro exigido ou voluntário, falou, em primeiro lugar, do entusiasmo do filho pelo retorno de um homem que há de voltar a governar e endireitar esta terra. Em segundo lugar, comentou a fria opinião do marido, homem de
responsabilidade que teme as atitudes explosivas de um presidente a quem falta equilíbrio e ponderação no pensar e no agir. "E eu não sei. Quero continuar a ter fé. Mas tenho medo. Naquela ocasião ele devia ter falado abertamente aos brasileiros. O
povo que decidisse. Nunca ele deveria ter feito o que fez, fossem quais fossem as consequências. Agora, não sei o que pensar".
Imagem: reprodução do álbum de recortes de Lydia Federici, no acervo da Hemeroteca Municipal
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