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CULTURA/ESPORTE NA BAIXADA SANTISTA - LYDIA
Lydia Federici (4 - crônica 5)

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Clique na imagem para voltar ao índice desta seçãoEm mais de três décadas de atuação diária, Lydia Federici publicou milhares de crônicas no jornal santista A Tribuna. A Hemeroteca Pública Municipal de Santos criou um Espaço Lydia Federici, onde estão expostos desde sua máquina de escrever até os troféus desportivos, bem como os organizados álbuns de recortes reunindo todos os seus textos publicados. Esta crônica foi publicada em 30 de dezembro de 1961 em A Tribuna (ortografia atualizada nesta transcrição):
 
GENTE E COISAS DA CIDADE

"Ancilas"

Lydia Federici

Sei que o plural de "ancilla" é "ancillae". Mas, e daí? Todo mundo diz ancilas e está resolvido o caso. As ancilas do Embaré são moças e senhoras da paróquia que ajudam os necessitados. Como dezenas – que digo? – como dez dezenas de outros grupos que, em Santos, trabalham pelos pobres, aleijados, doentes, órfãos, presos e velhos.

O dístico "Patriam caritatem et libertatem docui" não é, pois, como pareceria, uma afirmação pedante a enfeitar o brasão de Santos. Esta cidade ensina "à Pátria a caridade e a liberdade" mesmo. De verdade.

Mas, voltando às ancilas. Esse punhado de moças se movimenta do 1º ao 365º dia do ano. De 4 em 4 anos, do 1º ao 366º. Atendem a uma média de 300 famílias, amparando-as de forma quase total com mantimentos, roupas, assistência médica, ensino profissional. Há uma época, entretanto, em que as ancilas se desdobram. É pelo Natal. Um mês antes, parentes, amigas, conhecidos das conhecidas, recebem um aviso sorridente. E súplice. Não têm outro jeito senão providenciar latas de mantimentos, pacotes de macarrão, panetones, notas miúdas e graúdas.

O dispensário da Rua Padre Visconti vai ficando mais sortido que armazém. Nas oficinas do 1º andar, máquinas vão costurando shorts, calças, camisas, saias, combinações. De todos os tamanhos.

Na festa de Natal, representantes de 300 famílias, sem atropelo, alegres e curiosos, espicham os olhos para as mesas carregadas do refeitório. Tudo já está organizado. Separado e bem dividido. Trabalho das assistentes sociais que mantêm o fichário sempre em ordem e em dia. Um bebê que nasce já é uma nova criatura a merecer o carinho de camisinhas e fraldas novas. E no Natal tudo é novo. Tudo é farto.

Querem ver até que ponto vai a meticulosidade das ancilas? Escolhem, individualmente, para as 6 velhinhas sem família, um corte de fazenda escura, com desenhos discretos. Que pessoa de idade não gosta dessas flores espantadas. Nem de modelos esquisitos.

Quando a distribuição acaba, 300 famílias necessitadas têm seu Natal de festa. Justo, humano, cristão. As ancilas, com olheiras pretas até a metade do rosto, sorriem então, como só sabem sorrir aqueles que dão.

Quantos Natais assim se fazem nesta terra de caridade?

Não diz uma inverdade o brasão de Santos. "Patriam caritatem et libertatem docui". É isso mesmo. De verdade. Felizmente.


Imagem: reprodução do álbum de recortes de Lydia Federici, no acervo da Hemeroteca Municipal

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