Capítulo I
Indústrias pioneiras no mundo das bananeiras
1.3 – A Usina Henry Borden (1926)
Em 1925, a cidade de São Paulo passava por problemas sérios de falta de
energia elétrica. Em outubro desse ano, a companhia encarregada do fornecimento de energia, a São Paulo Light and Power Company Limited, deu
início ao racionamento, ofertando energia somente três dias por semana [91].
A explicação para a falta de energia era a estiagem prolongada (que baixou
o nível das águas dos rios, afetando a capacidade geradora das usinas hidrelétricas existentes) e o aumento do consumo acima da oferta. Foi em razão
dessa crise energética, que se deu início à construção da maior hidrelétrica do país: a Usina de Cubatão (Noronha, 1994:17)
[92].
Usina Henry Borden na época de sua construção, em foto do acervo Eletropaulo
Foto cedida a Novo Milênio por Arlindo Ferreira
Desde 1911, a empresa canadense iniciou a procura por novas fontes de
energia. Em 1923, a Light and Power entregou as pesquisas ao engenheiro Asa Billings, que depois de alguns meses entregou o projeto da Serra
do Cubatão [93].
Para Radesca (1965), uma série de fatores naturais favoreceram a escolha
de Cubatão para a instalação da usina hidrelétrica. Primeiro, a elevada precipitação de toda a área do Planalto, drenada pelos Rios Grande e
Guarapiranga e, principalmente, pela ainda mais elevada precipitação da Serra do Mar, onde se localiza a cabeceira do Rio das Pedras
[94]. Segundo, as condições topográficas da região, que possibilitaram a construção dos
lagos artificiais (Reservatórios Guarapiranga e Billings).
No entanto, apenas esses dois fatores não seriam suficientes para a
escolha da Serra do Cubatão. Coube ao engenheiro Billings a idéia brilhante de unir a água do Planalto à escarpa da Serra do Mar e, com a ajuda de
algumas obras de engenharia, possibilitar a produção de energia elétrica em Cubatão: "Ao idealizar o aproveitamento de
Cubatão, o eng. Billings assemelhou-se a Colombo ao colocar o ovo em pé: depois de lembrada a solução, salta aos olhos sua grande simplicidade"
(Radesca, 1965:89) [95].
A construção da usina hidrelétrica de Cubatão representou uma obra inédita
na engenharia do país e de alto custo financeiro. Existia ainda o problema da malária como impedimento brutal à permanência dos trabalhadores na
Serra, cujo local era conhecido pelos engenheiros como Mar Morto, absolutamente inaproveitável para qualquer empreendimento. A Light,
entretanto, conseguiu convencer seus acionistas a investir no plano. A contratação do sanitarista Arthur Leiva, que havia tratado de endemias
durante a construção do canal do Panamá, permitiu o combate à malária (Eletropaulo, 1996:04) [96].
As obras de construção da usina se iniciaram em abril de
1925. Dezoito meses depois, em 10 de outubro de 1926, as primeiras duas turbinas (com capacidade de 44,347 kW) começaram a produzir energia
[97]. Ao longo dos anos, a Usina de Cubatão foi constantemente ampliada, com a
construção de novas adutoras [98].
Apesar das ampliações, a capacidade gerada na Usina de Cubatão se tornou inferior à
demanda já em 1946. Em meados de 1950, a cidade de São Paulo começava a enfrentar um novo racionamento de energia, afetando a população e a
indústria. O aumento da demanda de energia elétrica era fruto direto do crescimento do Estado de São Paulo, principalmente de sua área industrial.
Os estudos realizados revelaram que não era mais aconselhável ampliar novamente a
capacidade da Usina de Cubatão pela superfície, devido aos constantes deslizamentos que ameaçavam, inclusive, a segurança da usina. Chega-se, então,
à conclusão de que as condições geológicas do esporão da Serra do Mar era favorável à construção de uma usina subterrânea, sendo o seu custo de
construção menor do que pela superfície.
As obras se iniciaram em setembro de 1952, em duas frentes: a construção
da usina e o aumento das reservas de água da Represa Billings. Foram escavados na rocha, a partir do alto da Serra, em direção a Cubatão, um túnel
com blindagem em aço com 1.506 metros de comprimento e 3,25 metros de diâmetro interno, por onde passou a descer as águas do Reservatório do Rio das
Pedras. O túnel termina numa enorme caverna, onde estão seis grupos geradores e suas turbinas Pelton [99].
Em 1961, com a conclusão das obras da usina subterrânea, a Usina de Cubatão aumentou
sua capacidade instalada para 887,4 MW (467,40 MW na usina externa e 420,00 MW na usina subterrânea), sendo responsável por cerca de 14% da potência
energética instalada no país e 80 a 90% da produção total de energia do Estado de São Paulo. Era, simplesmente, o maior conjunto gerador em operação
no Brasil (Radesca, 1965:74).
Mesmo assim, as secas constantes no Planalto Paulista afetavam diretamente o
abastecimento de água na usina, sendo, por isso, obrigada a reduzir sua produção de energia elétrica e adotar períodos de racionamento. Somente em
1963, com a interligação Light-Furnas, esses racionamentos terminaram. Inaugurada como Usina de Cubatão, a partir de fevereiro de 1964, a
hidrelétrica passou a se chamar Henry Borden, em homenagem ao advogado canadense que foi o mais alto executivo da Light entre 1946 e 1965.
A exemplo das outras indústrias instaladas em Cubatão, a Light também
construiu uma vila operária para seus funcionários, bem ao lado da usina, na raiz da Serra. A construção da usina representou, ainda, o primeiro
acampamento de operários em Cubatão, onde os trabalhadores moravam durante a execução das obras, muitas vezes durante anos. Esse fato tornar-se-ia
rotina na história industrial da cidade [100].
A Usina Henry Borden também causou uma grande transformação no Rio
Cubatão. Se antes da usina era um rio de largura média e de águas calmas, com a hidrelétrica, o volume de água subiu tremendamente tornando-se um
rio de velocidade: sua vazão aumentou de 1 a 3 m³ para 3.000 m³ (Ibid., p.100). As adutoras, por sua vez, trouxeram uma nova fisionomia à Serra do
Mar: as oito tubulações que descem a escarpa podem ser vistas desde o litoral de Santos [101].
A usina hidrelétrica da Light espalhou o nome de
Cubatão, pela primeira vez em sua história, para todo o país. Além disso, possibilitava a visualização perfeita de toda a paisagem litorânea da
Baixada Santista [102]. Tornou-se, naqueles anos 20, motivo de orgulho para
o Estado e ponto de visita obrigatória de toda personalidade que passava por São Paulo [103].
Usina Henry Borden na época de sua construção, em foto do acervo Eletropaulo
Foto cedida a Novo Milênio por Arlindo Ferreira
Em outubro de 1992, a Secretaria Estadual do Meio Ambiente proibiu o
bombeamento das águas do Canal de Pinheiros para o Reservatório Billings, em função da poluição das águas dos Rios Pinheiros e Tietê, que estavam
prejudicando a balneabilidade das praias de Santos e o abastecimento de água potável no Rio Cubatão [104].
Desde então, por falta de água, a Usina Henry Borden está operando bem abaixo de sua
potência instalada: durante o dia são gerados apenas 45 MW, enquanto no horário de pico, entre 19h00 e 21h00, a Usina volta a produzir quase em sua
potência máxima. Com a estiagem dos anos de 2000 e 2001, a Usina foi obrigada a reduzir ainda mais a sua produção: 35 MW durante o dia e 200 MW no
horário de pico.
Entretanto, num caso de urgência, a usina tem capacidade de operar em
carga máxima por cerca de 36 horas. Além desse período, o reservatório do Rio das Pedras, e seu afluente, a Represa Billings, ficam com seus níveis
de água comprometidos. Segundo seus técnicos, porém, dificilmente poderá ocorrer um problema que demore tantas horas para ser resolvido
[105].
Mesmo com tais problemas, a empresa estatal que administra a Henry Borden,
a EMAE, vem buscando a modernização da usina, para torná-la confiável por mais cinqüenta anos [106].
Segundo Goldenstein (1965:20), "A instalação da primeira
usina da Light, em 1926, representou para a cidade [de Cubatão] outra fase de efervescência". No entanto, terminadas as
obras, restou apenas uma vila operária, para manutenção da usina, isolada do centro do povoado. Peralta (1979:98) também aponta que a primeira
indústria a provocar alterações profundas na região foi a Light and Power, mas terminada as obras, os operários foram despedidos,
permanecendo poucos trabalhadores para a manutenção.
Outro ponto importante para o povoado, principalmente depois de sua emancipação
política de 1949, era o fato de a Light não contribuir com pagamentos de impostos ao município. Embora a Usina de Cubatão produzisse a energia, sua
distribuição na Baixada Santista ficou a cargo da empresa Cidade de Santos Serviços de Eletricidade e Gás S/A.
As indústrias existentes em Cubatão (Costa Moniz, Química e Santista de Papel),
apesar de representarem grandes complexos para sua época, não tiveram nenhuma influência na instalação da usina da Light em Cubatão. O que
prevaleceu foi a grande quantidade de água na região e a escarpa da Serra do Mar, visando provir de energia a região da Grande São Paulo.
Apenas isso [107].
É a partir da presença da usina da Light que podemos começar a entender a localização do Pólo Industrial de Cubatão que iria surgir na década de 50.
Embora em funcionamento desde 1926, a Henry Borden não trouxe, pela sua presença, nenhum novo empreendimento industrial para Cubatão até a
implantação da refinaria de petróleo.
A Henry Borden foi o primeiro empreendimento transnacional em Cubatão. O polvo
canadense, como era conhecida a Light pelos nacionalistas brasileiros, seria apenas o início da concentração de capitais externos nas terras de
serra abaixo.
Uma característica marcante dessas primeiras quatro empresas indústrias (Costa Moniz,
Química, Santista de Papel e Henry Borden), e que mudou a fisionomia do povoado, foram as suas vilas operárias. Com elas, Cubatão passou a
ter núcleos de povoação espalhados pelo seu território, não se concentrando apenas na sua rua principal. Com exceção da vila operária da Química,
que ficava no centro de Cubatão, as outras três vilas eram afastadas, permanecendo isoladas do restante da cidade.
As empresas proprietárias dessas vilas forneciam gratuitamente casa, água, luz, escola
e assistência médica a seus moradores. Por isso, a maioria dos trabalhadores dessas empresas era motivada a viver isolada nessas vilas. Com o
desenvolvimento do capitalismo no Brasil, esse tipo de assistência aos trabalhadores foi transferido ao Estado, causando, na realidade, uma piora na
qualidade de vida dos trabalhadores.
Mesmo com as obras de construção da Henry Borden, Cubatão continuava a viver o chamado
tempo lento, onde as mudanças se processavam a um ritmo muito moroso. Nada era abrupto ou repentino, demonstrando uma descontinuidade; o
tempo demorava a passar. O tempo lento só foi realmente perdido com a construção da Via Anchieta e a instalação da refinaria de petróleo. A
partir de então, as mudanças foram se processando a uma velocidade cada vez maior. E a usina da Light seria o grande indutor do progresso industrial
dos anos seguintes.
Usina Henry Borden na época de sua construção, em foto do acervo Eletropaulo
Foto cedida a Novo Milênio por Arlindo Ferreira
NOTAS:
[91] A história dessa
companhia transnacional no Brasil é cheia de troca de nomes e mudanças acionárias. Em 1899, através do decreto 3.349, assinado pelo presidente da
República, Campos Salles, a empresa canadense São Paulo Tramway, Light and Power Company Limited é autorizada a funcionar no Brasil. Em 1912,
passa a chamar-se São Paulo Light and Power Company Limited. Em 1956, torna-se uma sociedade anônima: São Paulo Light S/A – Serviços de
Eletricidade. Em 1966, outra mudança de nome: Light – Serviços de Eletricidade S/A. Em 1981, se torna empresa estatal, com o nome de
Eletropaulo – Eletricidade de São Paulo S/A.
Finalmente, em 1998, após a privatização das empresas distribuidoras de energia, a
Usina Henry Borden, mantida sobre controle do governo do Estado, passou a ser administrada por uma nova empresa estatal, a EMAE - Empresa
Metropolitana de Águas e Energia S/A, subordinada à Secretaria de Energia e atuando em consonância com a Política Estadual de Recursos Hídricos do
Estado de São Paulo.
[92] Para Radesca
(1965:74), a construção da nova usina tinha como razão o enorme aumento do consumo de energia elétrica registrado no Planalto Paulista,
principalmente em função do crescimento de seu parque industrial. Segundo Suzigan (2000:385), "(...)
foram estabelecidas grandes usinas hidrelétricas no Brasil na virada do século e nas décadas de 1910 e 1920. Essas usinas, como é sabido, geralmente
representam investimentos muito grandes e relativamente indivisíveis, e toda a sua maquinaria era importada".
[93] "Em
1922, chega a São Paulo o engenheiro americano Asa White Kenney Billings, com o objetivo de implantar o projeto de uma grande usina de energia
elétrica. No rio das Pedras, um dos poucos que nascem serra acima e caminham para o mar, Billings e sua equipe viram a possibilidade de recolher as
suas águas e as de outros rios do planalto, represá-las e, através de canalização adequada, gerar energia em Cubatão, aproveitando um desnível de
cerca de 720 metros.
"O Projeto Serra aproveitou a topografia e os recursos hídricos do planalto paulista,
num complexo de represas, estações elevatórias, canais, túneis e tubulação adutora. O sistema capta as águas do planalto e as conduz até o pé da
Serra para acionar as turbinas da Usina Henry Borden, inaugurada em 1926, como Usina de Cubatão. Ampliada diversas vezes até 1961, sua construção
foi responsável por uma interferência radical – sem precedentes na História – na natureza das águas próximas à cidade de São Paulo.
"O sistema hidráulico para o aproveitamento hidrelétrico da Usina Henry Borden engloba
parte do médio Tietê, o canal do Pinheiros e os reservatórios Billings e do rio das Pedras. No Tietê estão instaladas as barragens Edgard de Souza
(1901) e de Pirapora (1956). No canal de Pinheiros localizam-se as usinas elevatórias de Pedreira (1939) e Traição (1940). A Estrutura de Retiro
(1942) foi construída para controlar o fluxo de água entre os dois rios.
"O Reservatório Guarapiranga (1906), construído com o objetivo de regularizar a vazão
do rio Tietê na alimentação da Usina de Parnaiba, vinte anos depois passou também a ser utilizado como fonte de água potável para a capital. A
partir de 1945, integrou-se ao sistema da Usina de Cubatão. A represa Billings (1927), formada pelo rio Grande, está interligada ao Reservatório do
Rio das Pedras. Abrange áreas dos municípios de São Paulo, Santo André, São Bernardo do Campo, Diadema, Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra.
"O Reservatório do Rio das Pedras (1926) inicialmente era alimentado somente pelas
águas de sua própria bacia depois, com a construção do canal do Pinheiros, passou também a receber as águas da bacia do Tietê para alimentar a usina
em Cubatão.
"Implantado com a função de gerar energia elétrica, com o tempo, o Projeto da Serra
apresentou uma evolução de múltipla utilização, passando pelo controle de cheias e pela produção de água potável. Na última década, o gerenciamento
dos recursos hídricos do sistema teve que atender, também, à questão da recuperação da qualidade da água do reservatório Billings.
"Alterando o fluxo das águas na região da Grande São Paulo, o projeto do engenheiro
Billings reordenou a relação da sociedade com a natureza nesse espaço. O Projeto da Serra constitui um conjunto de extraordinária importância
como patrimônio da técnica e da engenharia. É também inegável que a Usina Henry Borden tenha fornecido grande parte da energia elétrica necessária
ao vigoroso processo de industrialização acontecido no Estado de São Paulo entre nos anos de 20 a 60 e que, ainda hoje, possa fornecer parcela
considerável da eletricidade consumida na Grande São Paulo" (Eletropaulo, 1996:01)
[94] O alto da Serra de
Cubatão é uma das regiões de mais alta precipitação do Brasil, com média anuais entre 4.000 e 4.500 mm. Cubatão, por sua vez, tem média de 3.100 mm,
enquanto o Planalto tem média de 1.700 mm.
[95] Para Goldenstein
(1972:122) e Peralta (1979:99), a localização da usina em Cubatão é puramente ocasional, decorrente de fatores de ordem física: o relevo da Serra do
Mar e o clima chuvoso da região.
[96] O sanitarista
aconselhou a empresa a não manter os cerca de 4.000 trabalhadores, durante à noite, no sopé da serra. Estes trabalhadores eram paulistas,
fluminenses e mineiros, enquanto a direção das obras era feita por estrangeiros, principalmente canadenses. Para facilitar o transporte dos
equipamentos para a construção da usina, a São Paulo Railway construiu uma linha férrea ligando a Estação de Cubatão até os terrenos da futura
usina. Depois da construção seu movimento diminuiu bastante, sendo desativada tempos depois (Peralta, 1979:99/109). Segundo Goldenstein (1972:90), "A
Baixada Santista, de Cubatão até o mar, era temida pelas inundações, febres e epidemias".
[97] Um enviado
especial do jornal paulistano Diário da Noite escreveu sobre a obra, em 1926: "Quem viu
um faroeste pode fazer a idéia perfeita das duas cidades improvisadas em madeira e folha de zinco que a S.P. Light & Power criou para os
6.000 trabalhadores e 350 empregados de escritórios que seus serviços ali reclamavam" (Eletropaulo, 1996:04). A
inauguração oficial, em 12 de outubro de 1926, contou com a presença do presidente do Estado de São Paulo, Carlos de Campos.
[98] O sistema construído
é o seguinte: as águas da Represa Billings passam para o Reservatório do Rio das Pedras através de um canal de ligação de 1.800 metros de
comprimento. Do Rio das Pedras partem dois túneis que vão até as torres de compensação, situadas na beira da escarpa da Serra do Mar. É a
partir dessas torres que saem as oito adutoras de superfície que descem a Serra até a Usina de Cubatão, movimentando as turbinas geradoras ali
instaladas. As turbinas recebem a água numa velocidade de aproximadamente 400 km/h. Após passar pelas turbinas, as águas são lançadas no Canal de
Fuga, que, por sua vez, deságuam no Rio Cubatão, chegando ao oceano.
Cada adutora é ligada a um grupo gerador dotado de duas turbinas Pelton. Os grupos
geradores entraram em operação conforme a relação a seguir: outubro de 1926, Grupo 1 (44.347 kW); abril de 1927, Grupo 2 (44.347 kW); janeiro de
1936, Grupo 3 (54.525 kW); agosto de 1938, Grupo 5 (66.157 kW); dezembro de 1938, Grupo 7 (66.157 kW); abril de 1947, Grupo 4 (66.157 kW); abril de
1948, Grupo 6 (66.157); junho de 1950, Grupo 8 (66.157 kW) (Radesca, 1965:81). Durante a Segunda Guerra, a Usina da Light foi cercada com arame
farpado e guarnecida por um batalhão do Exército; o distrito de Cubatão passou a viver no blackout (Pereira, 1988:159).
[99] A caverna cravada na
rocha, no coração da Serra, onde ficam as máquinas, é de uma grandeza fabulosa: altura de 38,6 metros, comprimento de 120 metros e largura de
20,5 metros. Do mesmo modo que a usina de superfície, a usina subterrânea lança suas águas no Canal de Fuga que deságua no Rio Cubatão. O primeiro
grupo de geradores foi inaugurado em dezembro de 1955; em 1956, mais três grupos são postos em funcionamento; em 1960, entrou o quinto grupo, e em
1961, o sexto e último grupo gerador.
A capacidade de cada grupo gerador é de 65.000 kW (Radesca, 1965:99). A construção da
usina subterrânea foi entregue à firma Cia. Morrison Kenudsen do Brasil S/A, que contratou sete empreiteiras para a realização das obras. Os
operários contratados tinham uma origem diferente daqueles dos anos 20; agora eram sergipanos, paraibanos, pernambucanos e de outros estados
nordestinos (Peralta, 1979:105).
Quanto ao aspecto estratégico, foi a forma de preservar as instalações elétricas de um
ataque aéreo em caso de guerra, pois em 1932, durante a Revolução Constitucionalista, o governo de Getúlio Vargas bombardeou a seção externa com a
intenção de paralisar o sistema energético paulista (Eletropaulo, 1996:03).
O episódio do bombardeio é lembrado por Coutinho & Santos (1999:18): "A
revolução demorava por terminar, e então o Sr. Getúlio Vargas determinou que a Cia. Light desligasse totalmente a energia elétrica de São Paulo,
intimação esta que a Light não executou. Vendo que a primeira tentativa de colocar um ponto final ao conflito que recrudescia, Getúlio Vargas
ordenou então à Aeronáutica comandada pelo então Brigadeiro Eduardo Gomes, mandasse, segundo testemunhas da época, um hidroavião para bombardear a
Represa da Light.
"Mas, ao que parece, a bomba atirada serviu tão somente como aviso, pois a verdade é
que nada de grave aconteceu, pois o artefato caiu nas proximidades da estrada Cubatão-Fabril, em um matagal, provocando uma grande cratera. Por esta
razão, a direção da Usina da Light não se intimidou e mais uma vez desobedeceu, não interrompendo a energia elétrica de São Paulo.
"Então, o hidroavião retornou, e desta vez em vôo rasante, beirando a Serra do Mar, e
quando já se encontrava sobre a casa de força soltou a bomba, que caiu em cima de uma coluna, não trazendo todavia estragos de monta. A partir de
então, a direção da cúpula da Cia. Light foi mesmo obrigada a cortar a energia elétrica de São Paulo (...)".
[100] Em 1940, a
Henry Borden empregava em sua manutenção somente 86 operários (Peralta, 1979:104). Já em 1963, com todas suas ampliações concluídas, a usina operava
com 336 trabalhadores, resultado do alto grau de mecanização de seu processo. Nessa época, 89% dos trabalhadores da usina residiam na vila operária,
junto de suas famílias (num total de 1.056 pessoas, abrigados em 224 casas), "devido às grandes
vantagens e ótimas condições de vida oferecidas pela companhia em Cubatão" (Radesca, 1965:89).
A maioria da mão-de-obra da usina provinha do Estado de São Paulo, sendo um terço da
Baixada Santista. No entanto, existiam vários trabalhadores de Minas Gerais, Bahia, Sergipe, Rio de Janeiro e Pernambuco, e alguns estrangeiros,
principalmente de Portugal e Espanha.
Em 1979, a usina tinha 351 trabalhadores e 824 pessoas viviam em sua vila operária
(Peralta, 1979:106). Nos anos 90, a usina passou por um enxugamento de pessoal, o que vem reduzindo, ano a ano, o número de empregados na manutenção
do sistema. Em 1996, eram 246 trabalhadores em sua conservação (Eletropaulo, 1996:05). Já em dezembro de 2001, a Henry Borden funcionava com apenas
180 operários. Sua vila, com 149 casas, ainda abriga 112 famílias de funcionários.
[101] Pereira
(1988:314/315) recorda o Rio Cubatão de meados dos anos 40: "Light e Fabril com suas vilas
residenciais, localizavam-se no pé da Serra do Mar, onde floriam, em suas matas, as roxas flores dos jacatirões e as aleluias amarelas. Na baixada,
os brancos lírios do brejo, perfumavam o ar com seu doce aroma. O rio Cubatão descia serpenteando pelo vale, encorpando-se com os inúmeros afluentes
que nasciam nos grotões da serra. Depois passando pela Fabril atingia a Light, de onde recebia as águas canalizadas da represa no planalto, que,
descendo os oitocentos metros da serra, movimentavam as turbinas da usina elétrica com sua força hidráulica. Continuando em sua trajetória, cruzava
a pequena cidade de Cubatão, antes de se misturar, no estuário, com as águas do mar. Cardumes de robalos e tainhas subiam as límpidas águas do rio
para desovar em sua cabeceira".
[102] Em sua obra
futurista, Zanzalá, o poeta e romancista Afonso Schmidt recorda a Cubatão de meados do século XX: "No
tempo a que nos reportamos, a serra ainda se apresentava coberta por densas matas em cujo seio serpeavam riachos que, de espaço a espaço, se
atiravam pelas grotas, formando alvas cachoeiras; sobre elas, reclinavam-se árvores felpudas de barba-de-velho, barulhentas de aves e ninhos. Nos
abismos, de um azul esfumaçado, passavam, ao cair da tarde, grandes asas espalmadas, num vôo reto que ia de morro a morro.
"A civilização, no seu trajeto do litoral para o interior, não havia parado sobre a
serra. Esse suntuoso cenário apresentava algumas obras de engenharia, sinuosas estradas e muito poucas casas de residência. Ninguém morava naqueles
pendores quase desertos. Uma das obras mais interessantes era a central elétrica. A eletricidade era ainda produzida pela massa de águas canalizada,
comprimida e atirada sobre turbinas que acionavam dínamos geradores (...)
"Com esse intuito, represava as águas turvas do Tietê, formando grandes lagos no
planalto e, na planície litorânea, mais ou menos na altura de Cubatão, instalara poderosas usinas que, à noite, iluminavam a massa escura das
florestas com um risco luminoso, quase a prumo, feito de lâmpadas elétricas. Esse risco cortava a estrada de rodagem que fazia a ligação da
metrópole com o porto. Era por essa estrada tortuosa que, em automóveis e ônibus, como se usava então, viajavam centenas de pessoas, diariamente, de
uma cidade para outra" (Schmidt, 1949:29/30).
[103] Até hoje a usina
possui dois bondinhos que correm paralelo às adutoras, da raiz da Serra até o seu cume, e que os trabalhadores utilizam para fazer a manutenção das
tubulações, e que os visitantes também se servem para se maravilhar com a obra e a paisagem.
Em março de 1927, a usina recebeu a visita de Rudyard Kipling (Prêmio Nobel de
Literatura de 1907), que assim escreveu o relato de sua viagem no Morning Post, de Londres: "Fomos para a nova
usina de energia, onde se usam algumas centenas de litros de água represada acima. Fomos içados para o alto da montanha num bondinho suspenso ao
lado dos canos e toda vívida paisagem, caindo como o fundo de uma caixa, ficou abaixo até que pudemos avistar a quente Santos e os seus diminutos
navios seiscentos metros abaixo. Nosso bondinho nos levou montanha acima para a densa invisibilidade de nuvens mais espessas"
(Kipling citado por Eletropaulo, 1996:05).
[104] O bombeamento só é
permitido quando: a) a vazão do Rio Tietê, no ponto de sua confluência com o Canal Pinheiros, atinge 160 metros cúbicos por segundo; b) o nível de
água na confluência do Tietê com o Pinheiros apresenta sobrelevação superior a trinta centímetros; c) a cota na tomada de água na Usina Henry Borden
cai a níveis insuficientes para assegurar o fornecimento de energia elétrica em situações de emergência; d) ocorre formação de espumas no Rio Tietê
depois da Barragem Edgard de Souza, de forma a extravasar o espelho d’água; e) acontece proliferação de algas no rios e reservatórios da Região
Metropolitana e no Médio Tietê, em quantidade tal que comprometa a qualidade do abastecimento público de água (Eletropaulo, 1996:10).
[105] A usina possui uma
rede de ligação com os principais consumidores de energia da cidade de São Paulo (metrô, hospitais, indústrias etc.), de forma que, no caso de um
blecaute, possa fornecer energia diretamente a esses consumidores. Por ser uma usina hidrelétrica em queda livre, a Henry Borden consegue atingir
seus 887 MW de potência em apenas 15 minutos, um recorde no país, pois seu sistema pode ser operado manualmente, sem a necessidade de alterar a
programação.
[106] Antes da
construção da Rodovia dos Imigrantes, no início dos anos 70, um estudo da Hidroconsult elaborou um projeto de uma nova represa, dessa vez no sopé da
Serra do Cubatão. Fechando os vãos do futuro viaduto da Rodovia dos Imigrantes sobre o Rio Cubatão, poder-se-ia represar o maior rio da Baixada
Santista, fonte inesgotável de água proveniente da Serra. Este projeto, volta e meia, é lembrado por políticos do município, principalmente depois
do racionamento de energia do ano de 2001/2002.
[107] Pela análise
anterior, é fato que as indústrias pioneiras de Cubatão se instalaram na região em função do fator sítio. Estavam todas interessadas em elementos
físicos presentes em Cubatão, que ajudariam na sua produção. Os curtumes estavam interessados no tanino, assim como a Química. A Santista de
Papel, por sua vez, estava interessada na possibilidade de usar as águas da Serra tanto para produção de energia como para a fabricação do papel. |