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HISTÓRIAS E LENDAS DE CUBATÃO - CAMINHOS
Cubatão e os caminhos da Serra do Mar (5)

A difícil subida da montanha, a partir do porto de Piaçagüera
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Texto incluído na obra Antologia Cubatense, selecionada e organizada pela professora Wilma Therezinha Fernandes de Andrade e publicada em 1975 pela Prefeitura Municipal de Cubatão, nas páginas 59 a 67:
 
O Caminho do Mar: dos fins do séc. XVIII a meados do séc. XIX

PETRONE, Maria Thereza S.  A Lavoura Canavieira de São Paulo - Expansão e Declínio - 1765-1851. São Paulo, Difusão Européia do Livro, 1968, p. 194 e seguintes.

A PASSAGEM DO CANEU

"Depois de construída a calçada do Lorena, havia ainda outros problemas para o comércio. O percurso do Cubatão até Santos era feito por canoas, constituindo, portanto, trajeto penoso, principalmente para o açúcar. Melo Castro e Mendonça escreve a respeito: "Aqui nesta Fazenda" (a antiga fazenda dos jesuítas no Cubatão) "ou mesmo da outra parte se embarcam os efeitos, e seguem por água até a Vila de Santos, tendo que passar em más embarcações pelo largo do Caneu aonde são temíveis as Trovoadas por que tendo, em muitas partes, muito pouco fundo, altera-se de forma que muitas vezes vira as embarcações, outras se enchem de água, o que arruína os açúcares e os mais gêneros, e tem morrido bastante gente neste sítio, e mesmo na Enseada do Porto de Santos".

Além das condições físicas constituírem um entrave para o comércio de açúcar, Martins Lopes Lobo de Saldanha estancou a livre navegação do Cubatão para Santos, "pelo estabelecimento, sem lei e sem ordem, do mais absurdo contrato real, compelindo os lavradores e comerciantes a navegarem os seus gêneros e efeitos nos poucos barcos que se fecharem naquele porto". A conseqüência dessa navegação insuficiente era que "por espaço de oito dias, são retidos os comboieiros com as suas bestas mortas à fome, e prejuízo de mercadorias expostas ao tempo".

As queixas sobre o Cubatão e a viagem a Santos são inúmeras, de parte de comerciantes de açúcar e tropeiros. Em 1796-1797, os condutores do açúcar, e os comerciantes santistas que deviam recebê-lo, culpam o contratador do Cubatão pelo estrago do açúcar no trajeto entre Cubatão e Santos.

Certo comerciante escreve: "não deve pagar o prejuízo ele, comprador do açúcar, nem o supe que não pode resistir a chuva". "Logo suposto estes princípios de equide o Contratador está nos termos de responder por este prejuízo. Bem sei que poderá dizer: não se obrigou por expressa condição a ter embarcações cobertas ou canoas com toldo ou encerado"..."principalmente na condução do açúcar que ordinariamente se faz no tempo em que mais chove"..."De mais quando se criou este contrato do Cubatão havia pouco açúcar, mas hoje a cultura tem chegado a um aumento de fazer figura à Vila de Santos como um dos portos da América interessante para a Europa"...(o grifo é nosso)"todas as vezes que as embarcações de transporte do Cubatão para esta vila não tiverem cobertas com que resistam ao tempo inconstante cada vez haverá maiores prejuízos que crescerem os efeitos que esta Capitania abundantemente produz"... continua a queixar-se o comerciante. (N.E.: supe. = "suplicante", termo jurídico; equide. = abreviatura de eqüidade; efeitos = mercadorias, produtos comercializados).

O contratador, entretanto, afirma que não arrematou o contrato com tal condição e que "na Carreira daquela navegação nunca houvera semelhantes barcos; antes eu por mera devoção neste triênio mandei fazer cobertas de encerado"... Por esse documento, vê-se quão grande era o problema da travessia até Santos para o comércio do açúcar.

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O ATERRADO DE CUBATÃO

"Melo Castro e Mendonça, para resolver todos esses problemas, pensa em construir um caminho por terra do Cubatão até Santos. "Este caminho deve ter Pontes boas de madeira sobre pilares de pedra e cal em todos os rios e braços pequenos de mar que atravessa, menos no rio Cubatão aonde a de ter uma barca, como a de Sacavem. O serviço desta barca é sem comparação menor que o do transporte pelas canoas, é sem risco, vai-se sempre por terra e com toda a comodidade até a vila de Santos, e o Direito de Passagem é agora incontestável, pois é de uma para outra parte de um rio de água doce, e desta forma ficam os Povos bem servidos, e este tributo suave".

Melo Castro e Mendonça, para a construção desse trecho, recorreu ao direito real de passagem, estabelecido desde 1778, contra o qual só havia queixas e mais queixas dos comerciantes. Esse Governador ainda conseguiu mais rendas para essa construção, como, por exemplo, um donativo dos comerciantes da Capitania, especialmente dos de Santos, São Paulo e Itu, que se prontificaram a pagar 20 réis por arrôba transportada a Santos.

Tratava-se, certamente, dos comerciantes de açúcar. Na "Relação dos nomes dos negociantes que assentarão no Donativo que querem voluntariamente dar para a factura do novo Caminho desta para Cubatão" constavam oito comerciantes. Na lista dos "que duvidaram e as Razões" constavam seis. Um dizia que não comprava açúcar; outro, que os que encaixava não eram seus; outro, que "estava a safra por estar com as contas justas nada oferecia, só sim do seu, porém para o ano que estava pronto". Outros três diziam que não podiam oferecer de que não era seu. Pelas razões dadas pelos comerciantes que não queriam contribuir, pode-se concluir que os comerciantes de açúcar eram os interessados na construção da estrada de Cubatão a Santos.

O negociante que não comprava açúcar não tinha interesse na melhora do transporte. Os progressos do caminho do mar estavam intrinsecamente ligados ao transporte do açúcar. A construção do caminho do Cubatão até Santos, nada mais seria que adequar o antigo caminho do mar às necessidades novas decorrentes da sua transformação em caminho de tropas, tropas carregadas de açúcar. Melo Castro e Mendonça escreve, em 1802: "É verdade que a estrada projetada e que se acha feita nos lugares mais dificultosos, além de oferecer um meio de tornar legal o direito de passagem"..."oferece também o de se transportarem a cavalo até Santos os gêneros de Serra-acima, evitando-se por este modo a ruína que sofre o açúcar no transporte por água"...

Melo Castro e Mendonça também mandou calçar a praça do Cubatão. A iniciativa desse Governador em conseguir um caminho direto por terra a Santos estava fadada ao fracasso, pois seu sucessor não continuou, como se exprimiu Souza Chichorro, uma obra "por certo digna de imortalizar o governo de um general amante da prosperidade do comércio".

O açúcar continuou a viajar por água do Cubatão até Santos com grande prejuízo para a sua qualidade. Franca e Horta, segundo Spix e Martius, melhorou bastante a estrada para Santos, principalmente por aí escoava o açúcar, o qual era, como dizia esse Governador, o maior artigo de exportação.

Um viajante inglês, John Mawe, que esteve em São Paulo em 1808, nos dá uma descrição extremamente minuciosa do estado da estrada e das condições de viagem de Santos a São Paulo. Continuava-se a viajar por água para atingir Cubatão. "Para o comércio com as localidades vizinhas aproveitam o transporte fluvial, pois o rio é navegável por vinte milhas até Cubatão, onde estaciona um oficial, com uma guarda de soldados, encarregado de receber o imposto do Rei, destinado ao conserto de estradas e outras obras públicas..."(o grifo é nosso).

Mawe fez sua viagem já em plena era das tropas de animais, de que nos dá uma descrição muito interessante. Tendo viajado de canoa, de Santos até o Cubatão, aqui pernoitando, presenciou ao amanhecer: "uma cena extraordinária e movimentada; em frente à Casa de Guarda havia amplo terreno circundado pela alfândega e outros edifícios, e para aí conduziram mais de cem mulas afim de serem arreadas e carregadas; a docilidade e mansidão desses magníficos animais agradou-nos muito, e a destreza dos almocreves, principalmente dos negros, em arranjar a carga, era na verdade surpreendente".

Mawe ficou entusiasmado com a estrada para subir a serra. "A estrada é boa e bem pavimentada, mas estreita, devido às subidas íngremes, foi talhada em zig-zag, com voltas freqüentes e abruptas na ascensão. As tropas de mulas carregadas, que encontramos no caminho para Santos, dificultaram-nos a passagem, tornando-a desagradável, muitas vezes perigosa. Em alguns lugares a estrada atravessa vários pés de rocha, em outros sobe perpendicularmente, conduzindo com freqüência a uma das montanhas cônicas, ladeando precipícios, onde o viajante está sujeito a ser lançado numa floresta inacessível, trinta jardas abaixo. Depois de subirmos por hora e meia, dando numerosas voltas, chegamos a um pouso, em cujas proximidades, num lugar pouco abaixo da estrada, encontramos água"...

"Enquanto caminhávamos, observamos que as mulas eram tão ligeiras na ascensão quanto em terreno plano; excediam, em muito, os cavalos, em estradas íngremes e mais ainda nas más estradas"..."reiniciamos a subida. A estrada apresentava, acima de nós, num só golpe de vista, quatro ou cinco zig-zags, proporcionando-nos justo motivo de espanto, pela realização de uma obra tão cheia de dificuldades. Os milhões de coroas despendidos em derrubar as matas, perfurar as rochas por distâncias consideráveis, assim como pavimentá-la, de um lado, em toda a extensão, dão não pequena idéia do espírito empreendedor dos brasileiros. Poucas obras públicas, mesmo na Europa, lhes são superiores"...

"Em três horas alcançamos o cume, em vasto planalto"... "as chuvas torrenciais da estação danificaram-na em vários trechos; a maneira mais rápida de reparar os estragos é abater várias árvores, com cerca de sete polegadas de diâmetro, atravessá-las e ligá-las por meio de estacas em forma de gancho. As mulas que viajam por esses declives escarpados, embora mais resistentes do que os cavalos, caem freqüentemente vítimas da fadiga; encontramos algumas mortas à beira da estrada"...

Vê-se, por essa descrição, que a estrada entre São Paulo e o Cubatão fornecia condições razoáveis de trânsito para as tropas carregando açúcar, durante o governo de Franca e Horta.

Também Beyer, que viajou pouco mais tarde (1813) elogia o caminho da serra. Dois viajantes franceses, depois de descreverem o caminho, terminam: "Estes trabalhos devem indicar nos mesmos termos quanto o espírito dos habitantes de São Paulo é inclinado aos grandes empreendimentos".

A calçada do Lorena, como adequação do caminho do Mar ao movimento das tropas carregadas de açúcar, constitui, praticamente, o único grande empreendimento nessa estrada. O caminho por terra do Cubatão a Santos somente na década de 1820 tornar-se-á realidade. Até o aparecimento da estrada de rodagem, já na fase de transição entre a economia canavieira e a cafeeira, houve preocupações com a conservação e com os ranchos.

Em 1824, os negociantes de Santos voltam a insistir na construção do caminho por terra até Santos. Eles se propõem a pagar um vintém por arroba de qualquer mercadoria em trânsito pelo Porto do Cubatão Geral para a construção da estrada por terra até Santos. Os comerciantes dizem que, no trajeto por água, o vento noroeste vira as canoas, acarretando grandes prejuízos.(o grifo é nosso).

O próprio escrivão do Registro de Cubatão considerava precário o transporte do açúcar até Santos. Escrevia, a 20 de outubro de 1826, que existiam no Cubatão 19.727 arrobas de açúcar esperando transporte para Santos, "sendo a demora dos condutores a 14 dias por causa do mau tempo e grandes enchentes que obrigam os Saveiros (o grifo é nosso) não poderem navegar como tem acontecido por muitas vezes, que os mesmos fazem parados nos areais, e até mesmo no desembarque deste Porto têm chegado a estar 48 horas sem poder descarregar. Muito me aflige, quando vejo os Tropeiros arranchados pelo Pateo, e Campos deste Cubatão arrigores de grandes chuvas"..."e nas faltas de Barcas motivão tais demoras"...

O serviço de barcas era absolutamente insuficiente para dar vazão ao açúcar destinado a Santos. Em março, o escrivão já pedira mais barcas, pois o saveiro grande estava no conserto e os tropeiros tinham que esperar dez, onze e doze dias. Em abril, entretanto, achara os três saveiros suficientes até a safra nova.

Em 1826, durante o governo de Lucas Antonio Monteiro de Barros, a idéia de Melo Castro e Mendonça finalmente torna-se realidade. A estrada por terra do Cubatão até Santos foi entregue ao uso em fevereiro de 1827. Trata-se de um melhoramento inestimável, principalmente para o comércio do açúcar (o grifo é nosso). Coincide com uma exportação cada vez maior desse produto. Foi, finalmente, o remate que faltava à calçada do Lorena, que Melo Castro e Mendonça quis realizar, mas não teve tempo de fazê-lo. As tropas carregadas de açúcar podiam agora chegar até o porto de Santos por meio de aterrados e pontes.

No ano seguinte à inauguração, entretanto, já apareceram queixas sobre a conservação da ponte do Cubatão. Daí por diante, será essa conservação uma constante preocupação das autoridades.

Na década de 1820, já aparecem queixas contra a insuficiência do caminho do mar. Hércules Florence (1825) informa que a serra "só pode ser vencida em péssimo caminho calçado de grandes lages, na maior parte deslocadas, o que torna a subida sobremaneira fadigosa".

Com o comércio exportador cada vez mais ativo - o açúcar paulista entrara definitivamente no grande comércio internacional - a calçada do Lorena começou a tornar-se insuficiente para dar vazão aos produtos de "serra-acima", pois fôra concebida em época de produção insuficiente. As condições climáticas contribuíram para o desgaste da obra realizada em 1792. Além disso, os serviços de conservação sempre eram mal feitos.

As dificuldades para as mãos de obras de conservação eram inúmeras, inclusive a falta de mão-de-obra. Alega o presidente Almeida Torres, em 1829, que "não se tem aperfeiçoado, tanto quanto era para desejar, as estradas d'esta cidade ao Cubatão e d'ali à Vila de Santos pela dificuldade que se tem encontrado na aquisição de trabalhadores".

Esse problema, principalmente na estrada de Santos, torna-se cada vez mais grave. Com o desenvolvimento da economia paulista, todos os braços foram requisitados pela produção sempre crescente de açúcar. Nas estradas trabalhavam sobretudo jornaleiros [1], que eram os libertos, ou agregados, ou pequenos lavradores que, nas épocas de menos trabalho na agricultura, se engajavam no trabalho das estradas. Kidder, entretanto, viu, trabalhando no caminho para Santos, além dos alemães recém-chegados, mulatos e índios. Apesar do jornal alto, era difícil conseguir número suficiente de trabalhadores.

Em 1829 ordenou-se aos juízes de paz que mandassem, no fim de cada ano, a relação de vadios e jornaleiros para serem recrutados para os trabalhos nas estradas. Em 1835-1836, pensa-se em trazer colonos suíços e açorianos para os mesmos trabalhos, pois os senhores relutavam em alugar seus escravos para esse fim e os jornaleiros abandonavam a atividade na época da colheita. Em 1839, chegaram alemães para o trabalho principalmente na estrada para Santos. Essa tentativa, entretanto, falhou e as autoridades se queixam desses operários.

Com o correr dos anos, o problema tende a agravar-se. A lei de 29 de janeiro de 1846 obrigava todos os jornaleiros a "trabalhar nas estradas, pontes, calçadas e outras construções, feitas à custa dos cofres da Província, destinados a facilitar as vias de comunicação". Na falta de trabalhadores voluntários, serão coagidos a trabalhar.

Com o desenvolvimento da lavoura canavieira no planalto, percebeu-se, já na década de 1820, a insuficiência do transporte das mercadorias por tropas, e pensou-se criar condições para um meio de transporte menos primário. Em 1828, o Conselho da Presidência encarregou uma pessoa de "examinar se na serra do Cubatão haveria alguma quebrada, por onde se pudesse fazer uma nova estrada, com proporção de por ela transitarem carros para a condução dos gêneros de Comércio, visto que pela falta de boas Estradas se tem desprezado esse fácil e menos dispendioso meio de transporte, o que se torna tanto mais urgente, quanto vão sendo raras as bestas muares, e conseqüentemente excessivo o seu preço"...

A partir dessa época, sempre se fizeram pesquisas para encontrar algum lugar na serra do Mar próprio para a construção de uma estrada de rodagem. Só mais tarde, quase às vésperas do aparecimento da estrada de ferro, irá tornar-se realidade esse plano. A estrada para Santos continua a servir para tropas, e as autoridades preocupam-se em facilitar o trânsito.

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O presidente da Província, Gavião Peixoto, afirma, em 1838, que fora "testemunha ocular do bom estado em que se acha a estrada desta cidade à Vila de Santos, em toda a sua extensão, como talvez em nenhum tempo esteve". Viajantes, tais como Kidder e Denis, elogiam a estrada pela qual os produtos de serra-acima são escoados. Kidder fala numa "das maiores e mais caras estradas que já se construiu no Brasil"..."A conclusão dessa importante obra mereceu ser comemorada como acontecimento notável na história colonial portuguesa".

Ferdinand Denis define-a como "obra gigantesca que dá alta idéia do povo que ousou cometê-la". A calçada do Lorena, quase meio século depois de construída, ainda consegue elogios como caminho de tropas. As condições de trânsito tornaram-se mais fáceis: em dois dias podia-se ir de São Paulo a Santos" (o grifo é nosso).

A ESTRADA DA MAIORIDADE

"No fim da década de 1830, aumentaram os clamores para transformar a estrada numa via carroçável. A produção de planalto aumentara muito. Em 1839-1840, a exportação de açúcar, (..) foi de 570.779 arrobas. Urgia, pois, concretizar o antigo anseio dos comerciantes de açúcar e construir um caminho de carros. Pela leitura das Atas do Conselho da Presidência e dos Anais da Assembléia Legislativa Provincial de São Paulo, percebe-se uma constante preocupação a esse respeito durante a década de 1830. Em 1841, descobriu-se na serra do Mar um trilho pelo qual seria possível a construção de uma estrada carroçável. Foi denominada estrada da Maioridade(o grifo é nosso).

Sua construção, por ser bastante difícil, exigiu muito tempo. Em 1844, o presidente Manuel Felizardo de Souza e Mello afirma que "a serra da Maioridade, que dará considerável impulso à produção de nossa província, apenas conseguir-se a descida e subida de carros carregados, vai em progressivo andamento, obtendo-se cada dia novos melhoramentos de modo que já oferece trânsito desde a base até a extremidade superior, não só a cavaleiros e animais de carga, mas também a liteiras, informando-me o respectivo inspetor ter a pouco por ela subido uma traquitana" [2].

Apesar do entusiasmo provocado pela possibilidade de, em futuro não muito remoto, se transportarem mercadorias em carros até Santos, a obra ainda se prolongou por longo tempo. Em 1849, foram paralisados os trabalhos e parece que o trânsito tanto de animais como de carros era bastante difícil. No ano seguinte, entretanto, o presidente Vicente Pires de Mota elogia a estrada da Maioridade: "obra para nós gigantesca, a maior da Província, e da mais grande vantagem: para nosso comércio oferece trânsito fácil, e cômodo: por ela sobem e descem carros pesadamente carregados".

Essa última afirmação parece exagerada, pois em 1852, Nabuco de Araújo afirma que a estrada da Maioridade "não será jamais uma estrada normal e própria para a rodagem". Fletcher também fala que a "subida é demasiadamente forte para veículos pesadamente carregados". Continua declarando que engenheiros ingleses estavam fazendo pesquisas para uma estrada melhor.

Nos livros de Exportação da Barreira do Cubatão, existentes no Arquivo do Estado, a primeira referência a carros aparece em outubro de 1852. De outubro de 1852 a junho de 1853, passaram pela barreira 728 carros e 129.361 animais carregados. No ano financeiro de 1854-1855, o número de carros foi de 763 e o de animais carregados de 178.980".

CONCLUSÃO

"O caminho do mar, que antes fora estrada de pedestres e, depois, com o advento da economia canavieira no planalto, de tropas, só se transforma em via carroçável com a decadência da cultura da cana. A estrada do açúcar foi uma estrada de tropas. É com a estrada do café que aparecem os carros (o grifo é nosso).

O açúcar contou, pois, essencialmente, com um transporte em tropas, numa estrada para o porto exportador adaptada a tal fim. Foi o açúcar - mercadoria de difícil transporte e facilmente deteriorável - que sugeriu a estrada de rodagem. Foi também o açúcar que financiou as pesquisas para tal fim e sua execução. Mas o certo é que a estrada carroçável só se torna realidade na fase do café. Sonhada desde os tempos do Morgado de Mateus, a rodovia não chegou a desempenhar, entretanto, papel de relevância. Em 1867, começa a sofrer a conseqüência da estrada de ferro".

NOTAS

[1] Jornaleiros - operário a quem se paga jornal, isto é, que recebe paga de cada dia de trabalho (Pequeno Dicionário da Língua Portuguesa, de Aurélio Buarque de Hollanda).

[2] Traquitana - coche de quatro rodas para duas pessoas; carro mais ou menos desconjuntado (Pequeno Dicionário da Língua Portuguesa, de Aurélio Buarque de Hollanda).

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