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HISTÓRIAS E LENDAS DE CUBATÃO - Os sambaquis
Montes de conchas contam a pré-história (15)

Os sambaquis de Cubatão
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Matéria publicada no jornal A Tribuna, em 30 de junho de 1996 (página A-14):
 

Caveira de 5 mil anos antes de Cristo está sendo exposta em Cubatão, sob a coordenação de pesquisadores da Universidade de São Paulo

Foto: José N., publicada com a matéria

ARQUEOLOGIA

Sambaqui oculta homem de mais de sete mil anos

Ossadas foram achadas em escavações

Manuel Alves Fernandes

Da Sucursal

Muito antes dos faraós construírem as pirâmides do Egito ou de Abraão sair da Caldéia (N.E.: região histórica no Sudeste do Iraque, junto ao rio Eufrates, marcada pela cidade de Ur), já havia moradores no Jardim Casqueiro, em Cubatão.

Restos desses antepassados dos surfistas que cortam uma onda nas praias da região, ou de pescadores que se embrenham nos mangues do estuário, dividem espaço com os cosipanos que fazem aço na Usina José Bonifácio de Andrade e Silva. São encontrados nos sambaquis, que podem ser assemelhados, embora essa classificação seja abominada por pré-historiadores, a uma espécie de cemitérios pré-históricos.

Os primeiros moradores de Cubatão já comiam mariscos, peixes, raízes e frutos encontrados em abundância nesses mangues, há mais de 7 mil anos. Os primeiros cubatenses, cientificamente conhecidos como exemplares do Homem Paleo-Americano, foram encontrados em escavações feitas por pré-historiadores da Universidade de São Paulo, sepultados pelas ostras que lhes serviam e alimentação, em montes calcários que preservaram os esqueletos e também os toscos machados de pedra com que quebravam os mariscos.

Os cientistas dão a esses montes o nome de Sambaqui, por constituírem os restos dos homens que habitaram o litoral americano no período pré-histórico.

Cubatão é um campo vasto desse tipo de restos, que permaneceram tanto tempo por causa da proteção das conchas, que constituem um elemento calcário fortemente agregante.

Dizimados - Baixos e possivelmente atarracados, esses antepassados dos índios viviam no litoral brasileiro sempre em busca da comida abundante nos mangues. Há quem os compare, com bom humor, a certos turistas que ficavam temporariamente onde houvesse comida e abandonavam o local, depois que essa se esgotasse, em busca de outros sítios. Deixavam para trás os poucos utensílios e os esqueletos dos mortos, sem grande preocupação religiosa.

Faziam, segundo imaginam os pré-historiadores, pequenas armadilhas para apanhar a caça, por desconhecer instrumentos melhores. Por também ignorar como fazer arcos e flechas, e usar rudes machados de pedra, não resistiram a grupos de cultura superior, que viriam a formar as tribos indígenas que os dizimaram.

Esqueletos desses antepassados dos cubatenses foram descobertos em áreas hoje preservadas pela Cosipa, na Ilha dos Casqueirinhos, e no Sítio Cotia Pará, próximo à Vila Natal. Parte do que restou da exploração de cal, pelos portugueses (que aproveitavam esses sítios para extrair as ostras que contêm material calcário), nos séculos XVII e XVIII, foi recolhido pela Universidade de São Paulo (USP), que prossegue os estudos mediante convênio com a Cosipa e a Prefeitura de Cubatão.

Uma caveira datada de 5 mil anos antes de Cristo foi exposta nesta semana pela pré-historiadora Dorath Pinto Uchôa, em Cubatão. Ela exibiu, em uma exposição itinerante, restos dos sambaquis de Piaçagüera (5 mil anos antes de Cristo); Cosipa 1 (4 mil anos a.C.); Cosipa 3 (3.800 anos a.C.); Cosipa 4 (2.500 anos a.C.); Cosipa 2 (1.100 anos a.C.) e Cotia-Pará (sem datação ainda).

Dorath Pinto Uchôa faz pesquisa na fazenda Cotia-Pará

Foto: João Vieira, publicada com a matéria

Acervo pré-histórico dá projeção ao Município

Cubatão ganhou projeção no meio científico não apenas por causa dos problemas ambientais que enfrentou em decorrência de uma industrialização mal planejada.

Também é conhecido pelo acervo pré-histórico que resiste à indiferença e à predação humana. "Nesta região está um dos acervos mais ricos para o incentivo ao turismo cultural", observa o prefeito José Osvaldo Passarelli.

Levantamento elaborado por técnicos da Assessoria de Planejamento da Prefeitura aponta a existência de alguns dos sambaquis mais antigos da região costeira, nas proximidades da Cosipa.

Esses sambaquis registram a história da evolução do Homem Paleo-Americano que viveu entre dois mil e dez mil anos atrás.

Esses habitantes pré-históricos não conheciam a cerâmica, nem o arco e a flecha. Esses vários sítios arqueológicos de sambaqui são protegidos pela Lei Federal 3924 de julho de 1961, e foram mencionados por cronistas dos séculos XVII e XVIII, que atribuíam esses locais, erroneamente, a tribos de índios encontradas pelos colonizadores.

Os principais sambaquis de Cubatão são os de Piaçagüera, o da Ilha dos Casqueirinhos e o do Sítio Cotia-Pará.

Na Cosipa - O sambaqui de Piaçagüera, com uma espessura de três metros, encontra-se dentro da área da Cosipa e é o mais antigo encontrado no Brasil. Tem aproximadamente 5.000 anos e foi formado em um período relativamente curto de 40 anos.

O sambaqui da Ilha dos Casqueirinhos, também em área da Cosipa, contém três jazidas com idade perto de 2.155 anos e restos de alimentos que indicam que o homem desse sambaqui alimentava-se mais de peixes do que de conchas e também fabricava instrumentos de pedra.

O sambaqui do Sítio Cotia-Pará, junto à Vila Natal e atrás do Parque Ecológico do Cotia-Pará, ainda não foi explorado. Vem sendo objeto de um projeto de pesquisa de salvamento arqueológico, ecológico e histórico da antiga fazenda Cotia-Pará, sob a coordenação da professora doutora Dorath Pinto Uchôa, em convênio assinado entre a USP, através do Museu de Arqueologia e Etnologia e a Prefeitura de Cubatão, em 19 de maio de 1992.

O arquiteto Amaury Barros de Souza, da assessoria de Planejamento da Prefeitura de Cubatão, acha importante retomar os estudos de exploração desse sambaqui do Morro Cotia-Pará. Sugere que isso poderia ser feito por uma das indústrias de Cubatão, em apoio a um projeto cultural de imensa importância histórica para o País e, principalmente, para a preservação da área e incentivo ao turismo cultural. Ou por entidades, como o Boticário e o Unibanco, que têm demonstrado interesse nesse tipo de atividade.

O prefeito José Osvaldo Passarelli tem planos para integrar o sambaqui, devidamente estudado e protegido pela USP, sob a direção da professora Dorath Pinto Uchôa, ao Parque Ecológico do Sítio Cotia-Pará, onde já existe um mini-zoológico, quadras de esportes e uma escolinha de Manguezais, mantida pela Secretaria do Meio-Ambiente do Município.

Autores de renome nessa área, como Paulo Duarte e André Prous, afirmam que, após investigação científica, que é um processo lento, todo sambaqui pode ser aproveitado integralmente pela indústria e comércio (em virtude da formação calcária), inclusive para exploração turística e cultural, mas só após a conclusão de pesquisas científicas.

Professora coordena exposição

A professora e doutora Dorath Uchôa alia a uma simpatia irradiante o pouco comum (pelo menos para a maioria dos leigos) título de pré-historiadora da Universidade de São Paulo. Nas últimas duas semanas, ela mostrou no saguão do Paço de Cubatão painéis com fotografias e exemplares de restos do homem primitivo que habitou a região de Cubatão há mais de cinco mil anos.

Essa exposição será exibida, a partir desta semana, na Casa a Memória da Refinaria Presidente Bernardes, unidade da Petrobrás que sempre se preocupou com a preservação histórica do Município.

Conforme a doutora Dorath, esses painéis falam da história do homem de Cubatão que viveu organizado em pequenas famílias (100 a 150 pessoas, aproximadamente), próximo ao litoral, por volta do ano 5.000 antes de Cristo (há cerca de 7 mil anos), com uma atividade de subsistência voltada para o mar ou águas estuarinas (os mangues de Cubatão).

"Esse homem era nômade, desconhecia a escrita, a cerâmica e a agricultura. Alimentou-se sobretudo da pesca e da coleta de moluscos e completou a sua dieta com a caça, a apanha de frutos, coleta de raízes, tubérculos e outros", explica.

Casqueiros - Os moluscos, após serem comidos, eram amontoados pelo grupo em forma de colina e, dependendo do número de indivíduos ou do tempo de sua ocupação, o sítio variava de altura, podendo excepcionalmente chegar até 30 metros, com um raio de 300 metros.

Nesses amontoados são encontradas, segundo a professora, inúmeras provas documentais da vida cotidiana desses grupos, devidamente interpretados séculos depois pelos pré-historiadores. São artefatos (machados e batedores de pedra, pontas de arpão com ossos de animais, conchas e outros), assim como restos esqueletais dos indivíduos que formaram o sítio, pois ao morrer eram enterrados nos próprios locais.

Séculos mais tarde, essas conchas encontradas em abundância deram origem ao nome da região do bairro do Jardim Casqueiro.

"A despeito dos poucos sítios arqueológicos datados, em Cubatão a Baixada Santista abriga certamente muitos desses sítios, como ainda abriga até hoje a baixada Cananéia-Iguape. Na Baixada Santista a ocorrência foi tão freqüente que originou alguns topônimos indicativos da presença desses sítios, tais como Jardim Casqueiro, Rio do Sambaqui, III do Casqueirinho, Caieira e outros".

Portugueses - A destruição dos sambaquis se iniciou a partir da chegada dos portugueses ao Brasil e a implantação dos primeiros núcleos urbanos, com a fabricação de cal para construção. As conchas encontradas nesses sítios eram usadas como matéria-prima para a fabricação de cal. Isso se deu, segundo a professora, devido à falta absoluta de calcário próximo ao litoral. Esses elementos calcários ainda hoje preservam inúmeros prédios construídos com cal de sambaqui, tais como igrejas, fortes, conventos, pavimentações de ruas e outros.

"A produção da cal para construção foi contínua até por volta de 1900 e posteriormente até 1960, para a fabricação de corretivos de solos e rações para aves. A partir de 1960 por lei federal e estadual, os sítios arqueológicos passaram a ser protegidos, tornando-se propriedade da União sob Lei 3.924 de 26 de julho de 1961".

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